quarta-feira, 7 de dezembro de 2016

Doria, Virada Cultural e o gestor brasileiro


A bombástica entrevista do prefeito eleito de SP João Doria em que ele disse que a cidade está um lixo e teve a absurda proposta de fechar a Virada Cultural no Autódromo de Interlagos é uma boa amostra do que será a gestão da cidade nos próximos quatro anos. Slogans fáceis e exagerados, típicos de um publicitário, e destruição do conceito de ocupação dos espaços públicos que, sejamos sinceros, teve pequenos avanços a partir da gestão Serra-Kassab e se tornou o grande legado da gestão Haddad.
A cidade era governada por um cientista político que se cercou de urbanistas. Passará a ser governada por um milionário excêntrico cercado de publicitários. Ao invés de ideias e debates, teremos slogans. Um típico gestor brasileiro. Daqueles que acha que sabe de tudo e toma decisões sem consultar ninguém. O Secretário de Cultura da gestão Doria disse que não sabia desta decisão do prefeito. Ou seja, nem com ele Doria conversou sobre o assunto.
Doria não conhece a cidade. E o pior, não sabe disso. E o pior, como o típico gestor brasileiro, é cercado de bajuladores que não permitem que ele saiba disso. A Virada Cultural foi idealizada na gestão de José Serra como um projeto de revitalização e reocupação do centro da cidade. A população de todo canto da metrópole poderia, por um dia, ocupar aquela região e assistir eventos culturais de todo tipo. A Virada cresceu na gestão Haddad, que incentivou muito este tipo de ocupação, que o digam o Carnaval e a abertura da Paulista para pedestres aos domingos. Doria, bem possivelmente, nunca foi à Virada. Tudo que ele sabe sobre o assunto, muito provavelmente, vem de matérias de jornais nos dias seguintes aos eventos, sempre falando sobe o número de furtos e assaltos ocorridos durante o evento. Na cabeça dele, isto é suficiente para cercá-lo no Autódromo de Interlagos, onde em nome de uma suposta segurança o conceito do evento será destruído. E, claro, com o evento num local fechado fica mais fácil lucrar com publicidade. A Virada poderá ser patrocinada pela cervejaria A, pela marca de celulares B, pelo energético C e pelo refrigerante D. Quem sabe uma revista de celebridades não pode fechar um camarote e trazer celebridades. No mundo de Doria, a publicidade se sobrepõe a ocupação da cidade. A questão da segurança é resolvida com cercas.
Baseada na Nuit Blanche de Paris e na Fête de La Musique de Berlim, a Virada Cultural se transformou na gestão Haddad no terceiro evento que mais atrai turistas na cidade. Perde apenas da Parada Gay e da Fórmula 1. As pessoas vêm exatamente para ter a oportunidade de viver a cidade de uma forma que só é possível naquela noite. Doria a enxerga como uma grande micareta. Ainda durante a campanha, em seu início, Doria esbravejou contra a abertura da Paulista para pedestres, mudando de ideia após visitar o evento. Segundo suas palavras, gostou da “vibe”. Poderia ter aprendido a lição deste evento, enxergado o pouco conhecimento que possui da cidade e o quanto tem a aprender. Preferiu manter a arrogância. Há algumas semanas, disse que vai “melhorar” os domingos na Paulista, trazendo os conceitos de “pockets-shows” que viu em Nova York. Se voltasse à Paulista, veria que já há shows acontecendo por lá. Típico do gestor brasileiro. Não sabe e não quer aprender. Só estaria disposto a isto se achasse algum MBA de Gestão Pública em Miami.

Uma semana antes de Doria chamar a cidade de lixo e propor a destruição da Virada Cultural, a gestão de Fernando Haddad foi premiada em Nova York, cidade idealizada por Doria, por Michael Bloomberg, ex-prefeito idealizado pelo tucano. Doria adora dizer que Bloomberg é seu grande exemplo. Vê-lo premiando Haddad pode ter mexido com o ego do prefeito eleito. Típico do gestor brasileiro. O ego acima de tudo. Haddad tem sido extremamente decente com Doria na transição e deixará uma cidade com finanças ajustadas mesmo na crise econômica que vivemos. Doria poderia ser um pouco mais grato. Mas isto não é típico do gestor brasileiro. Não rende slogans. Vamos nos preparar. Teremos quatro longos anos pela frente. A notícia de hoje é que o orçamento da cidade prevê a triplicação dos gastos com publicidade para o ano que vem. Acelera, São Paulo !