Nove meses após tomar posse, João
Doria Jr. Se prepara para deixar a prefeitura de SP enquanto seus números de
popularidade começam a cair. Em 31/03/18, Doria provavelmente fará aquilo que
aparentemente já queria desde o primeiro dia de sua gestão: sair do cargo de
prefeito para se candidatar a algo maior. Como um carreirista do setor privado.
Caso consiga completar o chapéu em seu padrinho político Geraldo Alckmin, será
candidato a presidente, para alegria dos rentistas do mercado financeiro e da
extrema-direita representada pelo MBL. Caso não, sairá candidato a governador.
A cidade já de São Paulo só tem a agradecer a saída precoce do prefeito, cuja
gestão relâmpago foi um desastre quase que completo.
A eleição de Doria em 2016 foi um
dos grandes símbolos dos efeitos que a histeria antipetista teve sobre a
sociedade paulistana. Num momento de rejeição completa a qualquer coisa
apresentada pelo PT, seja boa ou ruim, Doria se lançou como candidato a prefeitura
sem se dar ao trabalho de ter sequer um projeto de governo minimamente
consistente. Suas promessas eram basicamente o projeto Corujão da Saúde, a
privatização de tudo que fosse possível, que na campanha incluía inclusive uma
esdrúxula ideia de privatizar faixas de ônibus e ciclovias, e criticar o PT
sempre que foi possível. Não havia desde a campanha nenhuma proposta para
mobilidade urbana, moradia, educação, saneamento etc. Para uma sociedade cega
de ódio pelo PT, porém, a criação do personagem “João trabalhador” e os
xingamentos repetidos a Lula foram suficientes para garantir uma vitória
esmagadora.
O investimento maciço em
marketing e o uso obsessivo das redes sociais foram duas das características
mais marcantes da quase ultrapassada gestão. Isto ficou claro já no início da
administração, com o lançamento da operação Cidade Linda. Fantasiando-se de
gari, a tática do prefeito para se destacar já era clara. Doria começa seus
vídeos falando qual o plano mirabolante da vez, apresentando números falsos
para justificar um sucesso inexistente, agradecendo a algum amigo empresário
por ter doado algo “sem querer nada em troca” e terminava chamando Lula de
safado ou vagabundo, para delírio da extrema-direita. Imitando seu colega
americano de Aprendiz, Donald Trump, buscou o choque com a imprensa toda vez
que esta apresentava contestações a seus números falsos, primeiro expondo ele
mesmo jornalistas que faziam tal ousadia, depois usando seu braço-direito do
MBL para realizar o trabalho sujo, investigando a vida pessoal destes
profissionais e acusando-os quase sempre
de serem de “extrema-esquerda”. Não há como negar que neste ponto Doria provou
que realmente trouxe métodos do setor privado para o setor público, onde
críticas a gestores não costumam ser bem aceitas.
Os números do Programa Cidade
Linda mostram que a cidade está mais suja e mais mal cuidada hoje do que em
2016. As filas para exames voltaram praticamente ao mesmo patamar de um ano
após o fim do Corujão da Saúde. O número de mortos no trânsito subiu após o
absurdo aumento de velocidade nas Marginais. O trânsito piorou. Empresários que
doam para a prefeitura “sem esperar nada em troca” têm sido repetidamente
beneficiados por contratos sem licitações. Acusações de que vendas de
patrimônios públicos já tem vencedores decididos antes de acontecer se repetem.
O principal evento cultural da cidade, a Virada Cultural, foi destruído. O
premiado Plano Diretor apresentado pela gestão anterior vem aos poucos sendo
substituído por um plano desenvolvido pelos amigos do setor imobiliário do
prefeito, visando estimular a especulação imobiliária. Ciclovias foram
desativadas.vA distribuição de merendas nas escolas foi diminuída. A tática de
Doria para lidar com o resultado ruim é quase sempre a mesma. Contestação dos
fatos, apresentação de uma versão alternativa e confronto com a pessoa que
apresenta os números reais. Quase nunca há autocrítica. Dentre as versões
alternativas apresentadas pelo prefeito, destaca-se a meu ver aquela em que ele
disse que a diminuição na distribuição de merendas era uma tentativa de
diminuir a obesidade infantil e aquela em que ele diz que o aumento do número
de mortes na Marginal não é fruto do aumento de velocidade, e sim da
recuperação econômica.
A frase mais icônica desta gestão
foi, a meu ver, aquela em que ele disse que não ligava para a opinião de “istas”,
citando petistas, ciclistas, ativistas e jornalistas. Podia ter citado também
especialistas, que quase sempre discordam dos planos mirabolantes do gestor.
Basta ver como exemplo a opinião contrária quase unânime de quem entende de
urbanismo sobre as mudanças no Plano Diretor ou de quem entende de arte urbana
sobre a retirada dos grafites na Avenida 23 de maio.
Incentivado por setores do
mercado, animado com seu discurso pró-privatizações, e pela ala jovem da
extrema-direita do MBL, Doria passou boa parte do seu mandato viajando, seja
tentando vender o patrimônio público para empresas estrangeiras, seja passeando
pelo país para tornar-se conhecido fora de SP. Neste momento está em Belém para
um evento religioso. Diz que pode governar a cidade estando longe, uma vez que
pode dar ordens a seus secretários usando o celular. Essa é a visão que o
gestor que se apresentou como moderno tem de gestão, ele dando ordens de longe.
A principal consequência disso até o momento é a implosão do PSDB, cada vez
mais rachado pela figura pitoresca do prefeito. Alberto Goldman,
vice-presidente do partido, foi chamado de fracassado pelo prefeito ao dizer
que sua gestão não começou.
São Paulo só tem a agradecer o
prefeito pelo fato dele querer sair logo da prefeitura. Bruno Covas, que
assumirá em seu lugar, dificilmente conseguirá ser pior. A cidade, ao menos,
voltará a ter um prefeito. A ideia de Doria ser presidente assusta, claro. Imagine
o que seria alguém com a proximidade que ele tem com o MBL chegando ao poder. O
que seria o Ministério da Educação nessa hipotética gestão, por exemplo. São
Paulo tentará levar ao restante do país o grande símbolo de sua histeria. Mas
não vamos sofrer por antecipação. Daqui um pouco menos de seis meses Doria
abandona o cargo que claramente nunca quis. Até janeiro de 2018 não terá cargo
público. Numa era de retrocessos, qualquer pequeno alívio já deve ser
comemorado.
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