segunda-feira, 28 de abril de 2014

Cinco Minutos que valeram uma guerra




Em 2 de abril de 1982, a Argentina entrou em um transe coletivo, uma histeria na verdade. O ditador Leopoldo Galtieri, chefe da Junta das Forças Armadas que governava o país desde 1976 anunciava, para delírio de um povo em êxtase na Praça de Maio, que o país estava invadindo as ilhas Malvinas, cuja posse os argentinos reivindicavam da Grã-Bretanha desde o séc. XIX. Galtieri foi o segundo dos três presidentes da ditadura argentina, que durou entre 1976 e 1983. Foi a ditadura mais cruel do continente. Dados divergem sobre o número de mortos, mas as estatísticas falam entre 10.000 e 30.000 mortos. Para se ter uma ideia, a ditadura brasileira, em 21 anos, matou 300 pessoas.
                Em 1982 a Argentina passava por uma grave crise econômica e o governo militar era mais contestado do que nunca. Precisava-se de algo que trouxesse novamente o apoio popular. O arquipélago das Malvinas é a grande mágoa do povo argentino. Duas ilhotas que quase nada tem, nem gente, mas cuja presença inglesa dói na alma portenha. A invasão ocorreu de sopetão e a população do país embarcou com coração e alma na aventura. A popularidade de Galtieri subiu acima de 90% e até os grupos clandestinos de esquerda se alistaram na luta contra os “imperialistas ingleses”.
                Galtieri jamais imaginava que a Inglaterra respondesse. Os argentinos acreditavam em um suposto apoio americano à ocupação das ilhas. Dizia o acordo da OEA que todos os países membros apoiariam um integrante que se envolvesse num conflito e os americanos, até aquele momento, sempre olharam com bons olhos não apenas a ditadura argentina, mas todas as outras ditaduras de direita do continente sul-americano, com exceção dos quatro anos de governo Carter. Reagan, seu sucessor, obviamente não cumpriu o acordo da OEA e apoiou incondicionalmente o Reino Unido de Margareth Thatcher. Foi seguido por Pinochet, que permitiu inclusive que os britânicos usassem o território chileno como base área, e, de forma mais implícita, pelo Brasil, que liberou seu espaço aéreo e naval aos europeus.
                O ditador argentino terminou seu discurso em 02/04/1982 com a frase “Que venham os ingleses”. E eles foram. Com tudo. Margareth Thatcher passava por um período conturbado em seu governo e nada como um conflito com um país claramente mais fraco e agressor para garantir uns pontinhos de popularidade. Não houve guerra, mas sim massacre. Menos de três meses depois da invasão a Argentina estava humilhantemente derrotada. A autoestima de seu povo foi para o chão, junto com a moral dos soldados derrotados e da Junta Militar, que não sobreviveria mais um ano. Era um país em frangalhos.
                Quis o destino que quatro anos depois, em 22/06/1986, Argentina e Inglaterra se encontrassem em um jogo de Copa do Mundo. Futebol é algo irrelevante perto de uma guerra, mas não naquele dia, não para os argentinos. O nervosismo tomou conta de Buenos Aires nos dias e horas que antecederam aquela partida. Ninguém queria pensar como seria o dia posterior a uma possível nova derrota para os ingleses. Ninguém imaginava também o que estava para acontecer.
                O primeiro tempo do jogo foi tenso, com brigas nas arquibancadas, cantos provocativos da torcida inglesa e muita porrada no meio de campo. No segundo tempo, os cinco minutos de glória. Aos 6 minutos, um baixinho acima do peso que jogava pela Argentina tentou uma jogada que deu errado, a bola ricocheteou e sobrou no alto para uma dividida entre este gordinho e o goleiro inglês de quase dois metros. O baixinho, que jamais ganharia esta dividida, foi com a mão na bola, que entrou, e saiu comemorando sem olhar para o lado. Todo estádio viu a mão na bola, menos juiz e bandeirinha. O gordinho havia trapaceado contra os ingleses. Isto é errado, mas não naquele dia. Nada poderia ser mais gostoso para um argentino do que ver ingleses enfurecidos, sentindo-se enganados por um portenho. A humilhação da guerra já era menor. Cinco minutos depois, porém, o que já era gostoso tornou-se uma hecatombe, uma nova histeria coletiva. O mesmo baixinho que era odiado pelos imperialistas enganados, driblou sete ingleses enfurecidos, deixou dois inclusive no chão e fez o gol mais bonito da história do campeonato. É impossível para quem não é argentino entender o que aqueles cinco minutos representaram para a autoestima do país. Ver um portenho primeiro enganar os ingleses com sua malícia e depois humilhá-los com seu talento lavou a alma de um povo. Futebol é algo insignificante. Mas não aquele dia. A Argentina ganharia o jogo e o campeonato, mas são estes cinco minutos que criaram um mito. Diego Armando Maradona, o baixinho gordo que fez os vilões ingleses chorarem por um dia enquanto os argentinos celebravam. Aquele dia representou um novo início para o país. O luto havia acabado.
                Para quem gosta de história, o vídeo abaixo mostra imagem de 1982 de um programa da TV argentina durante a guerra, chamado “24 horas pelas Malvinas”. Era uma espécie de Teleton para arrecadar fundos para os soldados. Nele, Maradona aparece fazendo uma contribuição em dinheiro. A maior contribuição, no entanto, ele daria 4 anos depois. O povo argentino é eternamente grato.

NOBRES INTENÇÕES DE UM MILIONÁRIO... APAIXONADO, BURRO E TEIMOSO.


 
Sou corintiano, mas gosto de futebol e venho acompanhando a vida política palmeirense. Se você é daqueles palmeirenses que no final me mandarão cuidar do meu time, pare por aqui e digite o site do Avanti no seu navegador.

Vejo Paulo Nobre como um dos caras mais bem intencionados do futebol. Ele ama o Palmeiras, ele faz o que eu sempre digo que faria se ganhasse na loteria, ele coloca dinheiro do próprio bolso no clube.

Paulo Nobre assumiu o clube em ano de série B e pior, após a presidência de Arnaldo Tirone. Fez o que tinha que ser feito, montou um time barato e eficiente, contratou especialistas ao invés de distribuir cargos aos conselheiros que gostam de brincar de ser dirigente. Ao fazer do Palmeiras campeão da série B não fez mais do que a obrigação. Herdou muitas cagadas como o estádio, Valdívia e Wesley. Fez algumas cagadas como Barcos e Kardec.

Paulo Nobre instaurou a política da produtividade. Uma idéia muito boa para times pequenos ou com um elenco de renegados. Os jogadores que Paulo Nobre contratou vieram com esse tal contrato de produtividade e o Palmeiras montou um time de renegados bem competitivo.

Assisti boa parte da imprensa idolatrar o novo manager após a primeira fase do Paulistão, mas na minha cabeça sabia que esse castelinho iria desmoronar logo que fosse empossado o primeiro rei. Alan Kardec chegou a condição de selecionável e pronto, the bomb has been planted.

No elenco palmeirense existem altos salários para jogadores questionáveis ou não. Prass, Valdívia, Wesley e até Gilson Kleina inflam a folha de pagamentos. Prass é um bom goleiro, é útil, mas já tem 35 anos. Wesley chegou por 21 milhões de reais, deve sair de graça sem grandes conquistas. Gilson Kleina viu seu cargo ser colocado à disposição de inúmeros gringos para o ano do centenário, o que se tornou um tiro no pé para a diretoria que teve que ficar com o treinador por 300 paus. O Valdívia não merece muitos comentários, todos sabem que foi um mau negócio e que o Palmeiras o trocaria por uma Kombi, apenas para se livrar do seu salário.

Depois da saída do craque Barcos a diretoria do Palmeiras tentou acertar novamente e conseguiu. Alan Kardec chegou junto com espirituosos trocadilhos – como este – mas surpreendeu muita gente. Um bom jogador renegado pela Europa, perfil “Nobrelesco” de contratações. Paulo Nobre também rompeu com as organizadas, atitude louvável e digna de admiração, mas todos sabem que uma hora se paga o preço da ousadia.

Kardec virou o jogador mais querido pela torcida; estava resolvendo. São Paulo, Corinthians, Grêmio, todos interessados no jogador e, como na economia, existe a lei da oferta e da procura. Acertar contratos de produtividade com jogadores em que ninguém mais acredita é uma coisa, mas propor contratos de produtividade para as novas estrelas é algo muito difícil. Depois de semanas de negociação, tudo caminhava para um final feliz palmeirense; Paulo Nobre conseguiria o seu contrato de produtividade e o camisa 14 conseguiria o seu aumento de salário fixo para 220 mil. Em um lapso estrelismo, autoritarismo, graça ou burrice, o nosso milionário piloto de rally decidiu que pagaria 200 mil reais e nada mais; segundo o pai do jogador a diferença foi de 5 mil (pagaria 215 mil), fato que vou ignorar para que não fique ridículo. Alan Kardec é trabalhador, como todos nós, e tinha uma proposta são-paulina de 350 mil reias mensais (e fixos) nas mãos; nessa história não existe mercenário, existe o burro. Kardec cumpriu o seu contrato, se valorizou e deve ser pago pelo o que está jogando. Se o Valdívia ganha 400, o Kardec pode que pedir 500, se quiser. Jogador gosta de salário fixo, pois trabalha com o corpo e se estourar o joelho, quer estar garantido. Paulo Nobre e Brunoro querem tratar jogador que nem funcionário público: 30% de salário base + 70 de gratificações. Hoje quem está feliz é o Kardec; ganha 350 mil, receberá luvas e caso trinque uma vértebra e não possa jogar por 4 anos, ganhará 350 mil reais mensais. Quanto ao São Paulo ainda não sabemos, mas os que perderam foram Nobre, Brunoro, Gilson Kleina e, principalmente, a torcida que canta e vibra.

Por uma birra de 20 mil reais Paulo Nobre conseguiu trazer contra si, além de oposição e organizadas, o torcedor comum; esse torcedor que fez de Alan Kardec o recordista na venda de camisas nas lojas palmeirenses, o torcedor que clama por um centenário melhor que o dos rivais, o torcedor que viu o seu time ser eliminado pelo Ituano, justo nesse ano tão importante. Organizadas estão com as pedras na mão e dispostas a recuperar o espaço nas arquibancadas que perderam com o Avanti.

Já foi lançada uma campanha para o pagamento do Avanti por produtividade, como gosta o Paulo. Se o Palmeiras ganha, recebe. Se não ganha, não recebe. É mais uma vez a política destruindo todo o romantismo do futebol, pois até os ditos mais fanáticos estão usando uma situação em benefício próprio; o problema é que foi Nobre quem deu a munição.

O Palmeiras acaba de contratar Henrique, da Portuguesa, para o lugar de Kardec. É como perder uma geladeira e comprar isopor com gelo. Mas essa é a nova política palmeirense: Compre barato, valorize o jogador e deixe-o ir, sempre na esperança de acertar outra vez. Acertaram com Barcos e Kardec, a bola da vez é o Henrique, que promete fazer jus à “linha atacante de raça”, mas somente isso. O Palmeiras de outrora que era ponte e vitrine para a Europa não existe mais, agora se tornou vitrine para outros grandes clubes brasileiros, infelizmente.

Burrice, aliada ao poder e a teimosia faz com que o ídolo do time pule o muro para o rival; tudo isso por conta de 20 – ou 5 –  mil reais, muito menos do que um final de semana de rally na Grécia.




sexta-feira, 25 de abril de 2014

Opinando sobre tudo !


              

                   Ontem cheguei em casa e consegui assistir um pouco do programa do Datena. É divertidíssimo. Há muito tempo eu não o assistia e não lembrava como era bom. Ele faz na TV mais ou menos o que fazemos aqui neste blog, opina sobre todos os assuntos sem nenhum embasamento como se soubesse o que está falando. A diferença é que ele ganha uma fortuna para fazer isso. É sensacional. Lembrei-me de duas coberturas do Datena que realmente me marcaram. Uma de quando caiu um avião da TAM, em que ele deu uma verdadeira “aula” sobre aeronaves, e outra quando morreu o jogador Serginho do São Caetano de infarto no meio de um jogo, em que Datena provou ser um verdadeiro especialista em cardiologia.
             Inspirado pelo grande meste, resolvi fazer um verdadeiro experimento datenesco. Tentarei comentar e opinar, com a menor quantidade de caracteres possível, as notícias mais lidas de um conglomerado qualquer, entendendo ou não do assunto. Como esta opinião tem que ser a mais rasa possível, a regra que criei, baseada em nada, é que só posso ler apenas a manchete, não clicarei em nenhuma notícia, e mesmo assim tenho que opinar a respeito. O conglomerado que escolhi divide suas notícias mais lidas em 3 tópicos. Começaremos  pelo assunto mais importante, celebridades e famosos, passando em seguida para esporte e, finalmente, chegando no assunto mais irrelevante, política e atualidades... Vamos lá !

Celebridades:
   1 - Estilista Roberto Cavalli curte praia em Miami com a namorada em ótima forma; veja fotos – Ele é um velho rico e ela uma jovem bonita. O amor é lindo!
   2 - Sexo por trabalho? Veja as famosas que disseram ter sido vítimas do 'teste do sofá' – Aposto que nenhuma das entrevistadas assumiu que fez o teste, apenas conhecem alguém que tenha feito.
   3 -  Luciano emagrece 20 quilos, oito meses após ser internado com problemas de saúde – Gostei do filme dele e do irmão. Embora tenha ficado claro pelo filme que o Luciano não teve importância nenhuma na dupla.
   4 -  Após várias cirurgias, 'Barbie humana' chama atenção pela cintura finíssima – Sabia que se investe 10 vezes mais em novas cirurgias plásticas do que na cura do câncer? Isto mostra o quão bizarro somos como sociedade.
   5 -  'Em Família': Giselle leva susto e é assaltada durante passeio pelo Rio de Janeiro – As novelas do Manoel Carlos são chatíssimas.

Esportes:
   1 - Felipão confirma oito convocados para Copa do Mundo; veja os nomes dos garantidos – Surpresa seria se ele anunciasse que o Adriano Imperador vai a copa.
   2 -Após derrota na Colômbia, Paulo Autuori deixa comando do Atlético-MG – Finalmente! Quem sabe ainda dá tempo de salvar.
   3 - Horas após saída de Autuori, Galo age rápido e acerta contratação de Levir Culpi – é, não vai dar pra salvar.
   4 - Aposentada, Joanna Maranhão deve R$ 400 mil e engatinha como técnica – Tá devendo bastante hein?
   5- Zé Roberto revela acerto de contas e sela a paz com Bernardinho: 'Passou' – Vôlei é o esporte mais chato do universo

Política e Atualidades:
    1 - Regina Casé se despede de dançarino do 'Esquenta' morto no Rio de Janeiro  - Mais um caso de tragédia policial. -  Isto mostra o quanto ainda somos um país autoritário.
   2 - O sangue de uma supercentenária dá pistas de por que morremos – Sério que alguém leu essa? Morremos porque temos que morrer, somos passageiros e insignificantes para o mundo, não deveríamos levar nossa existência tão a sério.
    3 –  Policial é operado após algemar e matar namorada de 21 anos em rua do PR – Deixem-no morrer. É impressão minha ou está crescendo em número estes casos de tragédias passionais?
   4 - Rancho no Maranhão é primeiro espaço 'gay friendly' do Brasil – Legal! A sociedade evolui. Se você é homofóbico, saiba que um dia você terá vergonha disso.
   5 - Protesto após enterro de dançarino fecha vias e comércio de Copacabana. Sou a favor de todos os protestos. Ainda mais quando são justos.

É legal isso! Incentivo todos a opinarem. Conhecimento e embasamento são detalhes insignificantes. Estes são os assuntos que mais interessam aos internautas brasileiros. Famosos, futebol e violência. Nada sobre política, nada sobre o mundo. A notícia "perfeita" seria, portanto, "Neymar e Bruna Marquezine são assaltados na Barra da Tijuca".
E ainda achamos que o nosso maior problema são os políticos...

quarta-feira, 23 de abril de 2014

DITADURA NAZISTA DA MINORIA BURRA


 
O Tribunal Superior Eleitoral criou neste ano de eleições a campanha #vempraurna que, entre outros públicos, é endereçada às mulheres no nosso país.
Como de costume, primeiro me explico e depois desço a lenha. São louváveis os esforços para aumentar a participação feminina na política com o objetivo de corrigir erros históricos e machistas. As mulheres entraram na política somente em 1932 e além das ditaduras – como todos os brasileiros – tiveram que enfrentar aquele certo ar machista que não as deixava conquistar cargos importantes, quanto mais a maioria no Congresso Nacional.

Não vou ficar descrevendo a propaganda. Assista abaixo, reflita, tire conclusões e veja as minhas.
PROPAGANDA - TSE

Essa propaganda é absurdamente antidemocrática. O Congresso Nacional ajudou a corrigir erros históricos quando obrigou que os partidos políticos preenchessem suas chapas com no mínimo de 30% e no máximo de 70% de candidatos de cada sexo (Lei 9504/97). Essa lei, apesar de não citar especificamente a mulher, foi criada para que os partidos fossem obrigados a ter ao menos 30% delas em seus quadros.

Segundo a propaganda, as mulheres são maioria da população e têm maior escolaridade. Se a participação feminina no Congresso é de apenas 9% onde está o problema, segundo o TSE? Claro, mulheres não estão votando nas mulheres!!! #vempraurna... “Até quando vamos deixar que eles falem por nós?”.

Apenas 9% de mulheres no Congresso não reflete machismo, reflete a democracia. Como pode existir machismo em um país que reserva cotas para as mulheres, tem o número de candidatas suficientes para preencher todos os cargos políticos, um país em que as mulheres são maioria e têm mais escolaridade? Estamos vivendo, então, o domínio da minoria burra?
Hoje não existe espaço para machismo na política. O voto é obrigatório, secreto e todas as mulheres votam. Nenhuma mulher brasileira tem necessidade ou obrigatoriedade de votar em homem. Naquele pequeno espaço, de frente com a urna, todos são iguais e fazem a sua escolha sem que ninguém possa ou precise saber.

Por que guerra dos sexos se somos todos brasileiros com as mesmas necessidades? O Brasil é um país relativamente novo, em constante evolução e a política é como economia de mercado: com o tempo as coisas se ajeitam sozinhas. Claro que a participação feminina crescerá, mas pela democracia e não pela guerra dos sexos ou qualquer interesse político subjetivo. Eu acredito, em boa parte, no TSE e justamente por isso não quero nem pensar que essa campanha tem finalidade indireta de apoiar uma candidata à presidência. Afinal, se as mulheres quiserem, Dilminha é reeleita no primeiro turno.
Corrigir erros históricos é diferente de levantar uma bandeira para que “brotem” mais mulheres no Congresso. A correção necessária já foi feita, agora deixem que homens e mulheres façam suas escolhas e assistam em paz a maravilha que é o processo democrático.

Luzes da Ribalta


           
             Luzes da Ribalta (1952) é o último filme de Charlie Chaplin. Trata-se de uma história autobiográfica sobre um palhaço decadente, que não encontra mais seu lugar no mundo, engolido por uma nova geração interessada em outro tipo de arte e humor. Impossível, para mim, lembrar deste filme sem compará-lo às situações vividas por Chico Anysio e Renato Aragão. O que está em discussão não é a qualidade artística dos três, mas a forma como suas artes sucumbiram ao tempo. O primeiro morreu no ostracismo, o segundo segue este caminho. A forma como os três perderam popularidade com a idade e com as transformações do gosto do público ligam as 3 histórias. Chaplin foi vítima do cinema falado; Aragão e Anysio, vítimas da internet e da TV a cabo.
                A sociedade mudou. O humor na televisão brasileira mudou. É inevitável lutar contra isso. Renato e Chico foram criados para um tipo de humor de um país diferente, em que as pessoas viviam em sua maior parte no interior, isoladas e com pouco acesso à informação. Quase todos os humoristas daquela época começaram num tipo de ambiente que hoje é quase inexistente, o circo. Hoje, num país em que a maioria das pessoas é de classe média e vive em cidades, com acesso a informações vindas do mundo inteiro, o começo vem nos stand ups, não à toa um nome em inglês. A chamada opinião pública, outrora formada em maior parte por pessoas simples de cidades interioranas que buscavam um humor em certa medida inocente, hoje é composta por uma classe média que vive em grandes cidades, pessoas competitivas e hierarquizadas que procuram um humor que registre sua forma de enxergar o mundo. A Praça é Nossa não tem a menor graça para quem assiste Pânico. Sem juízo de valor, isto é fato.
                Uma coisa une estas duas gerações do humor brasileiro: a existência de um “escada”. Há alguém que se dá bem e alguém que se dá mal nas esquetes, quase sempre. Alguém humilhando e enganando, outro humilhado e enganado. Renato Aragão, por exemplo, tinha Dedé Santana para preparar suas piadas. A diferença é que, na geração dos realities shows, este escada hoje é quase sempre uma pessoa real e não um personagem. Alguém que se sujeite, conscientemente ou não, a ser humilhado em praça pública para deleite do “admirável público”. Poucas coisas divertem mais essa geração competitiva do que alguém sofrendo bullying, isto faz com que se sintam pessoas melhores do que aquele alvo de chacota.  Sentem-se menos feios ao ver um feio de verdade sendo zoado, sentem-se menos pobre ao ver um pobre sendo zoado. Ser melhor do que alguém, este é o lema não só do humor, mas de tudo.  O novo humor apenas reflete isso. Mais uma vez, sem juízo de valor.
                Uma coisa separa as duas gerações: o limite. A antiga é composta por pessoas vindas de um país pobre, ou seja, a vida lhes impôs limite, como a fome e a pobreza. Quem passou por limitações sabe que tudo tem limites. A nova geração, filha de pais que forneceram tudo, não conhece esta palavra e, por isso, acha que seu humor é uma arte que não deve sofrer com nenhum tipo de regra, seja de si mesmo, seja da sociedade.
                Renato Aragão e Chico Anysio passaram boa parte da vida sendo tratados como gênios. Nada deve ser mais triste para pessoas como eles, que se acostumaram com este tratamento, perceberem que no fundo eram apenas um produto, consumido e descartado quando não mais interessante. É muito ruim contar uma piada que ninguém mais ri.
                Eduardo Sterblitch é um dos grandes nomes do humor atual. Trabalha no Pânico e possui um quadro chamado Poderoso Castiga, em que recebe subcelebridades e começa a humilhá-las. Estas vão ao quadro para serem achincalhadas de forma voluntária. Na sociedade do espetáculo, vale tudo para esticar em alguns segundos os 15 minutos de fama. Em entrevista a Jô Soares, foi chamado pelo apresentador de gênio. Jô entende muito mais de humor do que eu. Cada geração tem o gênio que merece e que a representa. 

quarta-feira, 16 de abril de 2014

Os estaduais não são chatos. Os torcedores são.



                Em 17/06/1992, o São Paulo enfrentou o Newell’s Old Boys na final da Libertadores no estádio do Morumbi. O público foi de 105.185 pessoas e o jogo foi transmitido pela TV Gazeta. Seis meses depois, o mesmo SP enfrentaria o Palmeiras na final do hoje chamado “Paulistinha”. O público foi de 110.887 e o jogo foi transmitido por Globo e Bandeirantes. De lá para cá, aconteceu uma coisa que acabou com o interesse pelos estaduais e que tornou o futebol brasileiro esta coisa chata que é hoje: A TV a cabo.
                Tornamo-nos pessoas que se julgam “globais”. Temos mais acesso a coisas que acontecem em Londres ou Nova York do que a coisas que acontecem no interior do Brasil. Passamos a enxergar nossa realidade como sendo a destes locais e não de coisas que acontecem muito mais próximas a nós.  Isto para mim é muito claro no humor. Essa nova geração de stand up tem como referência Seinfeld, e não Chico Anysio.
Falando de futebol, temos uma geração hoje que já passou parte da adolescência assistindo campeonatos estrangeiros na TV e que nunca foi a um estádio. São pessoas que se identificam mais com Manchester United e Barcelona do que com times do interior do Estado. Mais do que isso, passamos a ter jornalistas, os grandes formadores de opinião, que começaram a frequentar jogos na Europa com mais frequência, tendo mais vivência no Santiago Bernabéu do que no Moisés Lucarelli. Público e formadores de opinião, portanto, vivem hojen essa realidade,  criada pela televisão a cabo. Ela moldou um público e hoje atende ao seu interesse.
Por influência familiar ainda temos um time, mas não nos interessa mais que eles sejam apenas locais. Queremos que eles ganhem o mundo e façam parte, nem que apenas na nossa cabeça, daquela nova realidade europeia a que nos acostumamos e falsamente vivemos. Ganhar do Palmeiras não basta mais ao torcedor do Corinthians, o sonho realizado foi vê-lo ganhar do Chelsea.
Aos poucos o futebol brasileiro está se “adaptando” a esta nova realidade imposta por um público europeu. O mata-mata foi pro saco, dando lugar a um chatíssimo campeonato por pontos corridos, em que o melhor sempre ganha. A próxima vítima é o campeonato estadual. Fodam-se os times do interior, eles não nos interessam mais. É perda de tempo e dinheiro viajar para as cidades próximas do estado, quando deveríamos nos esforçar para buscar uma aproximação com os clubes europeus. Quem nunca ouviu que Flamengo e Corinthians, com boa gestão, poderiam ser o Real Madrid e o Barcelona? Pois eu ainda prefiro que eles sejam Flamengo e Corinthians.
Gosto muito de programas de debates esportivos da TV a cabo, principalmente aqueles com jornalistas mais velhos. Gosto muito de ver gente que se julga séria falando de um assunto como futebol como se fosse a coisa mais importante do mundo. O meu “favorito” é um que passa de manhã que mistura futebol com o que há de mais chato na MPB. Gosto mais ainda quando o termo especialista é usado e quando eles ficam horas esperando um jogador dar uma entrevista dizendo que agradece a Deus e aos companheiros. Divirto-me também quando eles falam que tudo tem que mudar, que temos que acabar com os estaduais, que eles não têm mais interesse algum do grande público, e que temos que acabar com o mata-mata, ele não é justo. No mesmo programa, eles lembram saudosistas como o futebol era legal até os anos 80. Ninguém questiona o paradoxo de ser contra estaduais e sentir saudade da época em que estes eram os campeonatos mais importantes do país e em que todos os campeonatos eram decididos por em sistema de mata-mata.
Tive uma conversa sobre este assunto com uma pessoa que disse que o mundo mudou e que temos que nos adaptar a esta nova realidade. Se for isso mesmo, que pena... O mundo está mais chato. A minha mensagem àqueles que ficam em casa aos domingos para assistir campeonato inglês seria: Desligue a TV e vá ao estádio! E viva o Ituano !

segunda-feira, 7 de abril de 2014

Roberto Justus e o funk ostentação



                Roberto Justus é um homem de sucesso. A foto acima mostra o porquê. Contemple-o no ápice de sua riqueza. Filho de um engenheiro que fugiu da pobreza na Europa, chegou à terceira idade com uma mulher gostosa, uns 30 anos mais nova, um relógio no pulso, mesmo estando ao lado de uma piscina, uma roupa de marca. Junte a isso a bebida que pisca e um pouquinho de inveja e teríamos o rei dos camarotes. MC Guimê é um homem de sucesso. Filho de um ajudante de eletricista, enriqueceu graças ao seu trabalho na música e é possivelmente o nome mais famoso do mais controverso e importante movimento musical do Brasil no momento, o funk ostentação. Quer entender a nossa sociedade, olhe para Justus e para Guimê. Ambos representam a mesma coisa.
                Roberto Justus é publicitário. Talvez o mais importante do país. Ele e seus colegas têm como missão vender produtos. Sua tática mais comum é ligar o consumo de produtos a sucesso, mercadorias a sonhos e realizações. Compre a pasta de dente A e uma mulher linda vai beijar sua boca. Compre o carro B e uma mulher linda vai beijar sua boca. Compre a cerveja C e uma mulher linda vai beijar sua boca. Deu certo. A publicidade nos convenceu que não somos pessoas, somos consumidores. Pessoas pensam, consumidores compram. Pessoas refletem, consumidores seguem instintos. A publicidade é a mãe do funk ostentação. Numa sociedade composta quase que exclusivamente por consumidores, nada mais sensato que o consumo dos melhores produtos signifique sucesso.
                Roberto Justus tem um programa de televisão. Neste, algumas pessoas se sujeitam a situações embaraçosas e humilhantes por causa de um emprego. Mais ou menos como nós no nosso dia-a-dia. Um é contratado, os outros são demitidos sumariamente. A identificação do público, formado quase que exclusivamente por pessoas que assim como os aprendizes são achincalhadas por um chefe quase que diariamente não é com os seus iguais, mas sim com Justus. Todos querem ser Justus. Os concorrentes do programa deixam bem claro que o sonho é ser Justus. A publicidade faz com que busquemos identificação com o sucesso e nos recusemos a aceitar o fracasso. O sucesso é a riqueza, o poder, mas acima de tudo, o consumo.
                Roberto Justus é respeitado e foi escolhida a segunda personalidade mais influente para os jovens brasileiros em 2012, atrás apenas de Eike Batista. Deve estar em primeiro agora, uma vez que Eike deixou de ser sinônimo de sucesso. MC Guimê não é tão respeitado ainda. É mais difícil vender alguém de origem humilde e tatuado como ele, mas nada que um bom trabalho de publicidade e uma ida ao programa do Luciano Huck não resolva. Enxergar Justus e Guimê como duas coisas é sinal de falta de reflexão. Mas consumidor não reflete, consumidor compra. O que os diferencia é a aparência. O desenvolvimento da publicidade nos converteu em “consumidores-produtos”. O Facebook e a exposição da felicidade que o diga. O produto Justus ainda é mais valioso do que o produto Guimê. Como eu disse, nada que a publicidade não resolva.
                Roberto Justus e MC Guimê representam exatamente a mesma coisa. Enriqueceram ligando felicidade a consumo. Os publicitários acreditam que têm a profissão mais importante do mundo. Estão certos. Na sociedade dos consumidores, ninguém é mais importante do que o cara que nos convence a comprar. Tenho amigos publicitários que sempre perguntam, ao defender a importância de sua profissão, “como seria o mundo sem a publicidade?”. Minha resposta é “um mundo melhor”.

terça-feira, 1 de abril de 2014

Observações sobre o regime de 1º de abril de 1964







1 ) O golpe foi em 1º de abril, dia da mentira, e não em 31 de março;
2 ) Quase todo órgão da grande mídia apoiou o movimento. Todos deveriam sair com um edital hoje pedindo desculpas, ao invés de simplesmente contar como sofreram com a censura;
3 ) Chamar o golpe de simplesmente militar é esquecer a enorme quantidade de civis que participaram da conspiração. Não vejo quase ninguém citando que JK ou Ulysses Guimarães foram adeptos da ação militar;
4 ) João Goulart não era um ditador comunista, era um líder democraticamente eleito. O golpe de 64 não impediu que o Brasil se tornasse uma ditadura comunista, impediu sim que o Brasil se mantivesse como uma democracia;
5 ) A corrupção durante a ditadura foi tão grande ou até maior do que a que vemos hoje. Basta dizer que Paulo Maluf foi indicado para Prefeito e Governador de SP neste período e que José Sarney era o líder da Arena ( Partido dos Militares ) no fim do mandato;
6 ) A ditadura foi extremamente ineficaz do ponto de vista técnico. Manteve-se a opção pelas grandes rodovias ao invés de investir-se em ferrovias. A pior obra viária da história do país, a Transamazônica, foi feita no período e quase todos os grandes estádios da maior parte do país foram construídos durante o regime ( e sem uma Copa do Mundo para justificar );
7 ) Agressões cometidas pelo Estado brasileiro, em qualquer período, devem ser indenizadas pelo Estado brasileiro;
8 ) Criticar a ditadura brasileira e elogiar outras ditaduras é no tanto paradoxal. Nenhuma ideologia justifica tiranias;
9 ) A Lei da Anistia não significa que não devamos procurar descobrir o que realmente aconteceu. Questões como as razões da morte de João Goulart são fundamentais para a história do país;
10 ) Ter sido contra a ditadura não torna alguém necessariamente uma boa pessoa;
11 ) A ditadura acabou há 30 anos. Hora de seguir em frente.

Fonte da figura que ilustra o texto: www.pirikart.com.br - Autor: Adriano Kitani