segunda-feira, 1 de setembro de 2014

A menina e o racismo



                Não acho que a menina seja racista. Ela cometeu um ato racista, isto é crime e ela deve ser punida por isso. Está na lei e é simples. O mais chocante para mim foi a entrevista de Wanderlei Luxemburgo sobre este assunto no dia seguinte, em que ele disse que estes xingamentos fazem parte do jogo. A meu ver, este é o grande ponto a ser discutido, o vale-tudo pela vitória.
                O futebol acabou se tornando uma grande vitrine da sociedade e de sua gana para vencer a qualquer custo. Da mesma forma que em uma empresa vale tudo para se chegar a cargos mais altos, passando por cima de qualquer regra ética, no futebol de hoje não importam os meios para se alcançar a vitória desejada. Quem assiste a jogos do Corinthians e vê a pressão que o time de Mano Menezes faz sobre a arbitragem em quase todos os lances sabe do que estou falando. Este tipo de “pressão” é normal. Chamar o adversário de macaco ou de viado não causa remorso, uma vez que só o que se quer é ver o adversário desestabilizado. A situação é tão normal que basta ver que ninguém que está perto da menina gremista a questiona quando ela faz isso. Ela muito provavelmente não se acha superior a Aranha por ser branca. Só queria que ele frangasse. Do mesmo jeito que as pessoas que gritavam “viado” cada vez que o Richarlysson pegava na bola. Sendo assim, o chocante do ato no RS não foi o ato em si, mas a banalidade com que ocorreu.
                A menina agora virou a vidraça e todos têm a pedra. Criticá-la significa se mostrar alguém não racista e ganhar curtidas no facebook. Ela virou uma espécie de Wilson Simonal do tema. Destruir a vida dela é fácil, ela é um nada que não conhecemos, que está distante, que cometeu um erro e que ninguém viverá o sofrimento dela. Ela que se foda.
                O racismo no Brasil é perigoso por ser implícito e porque só o questionamos quando ele é visível. Não o enxergamos quando não notamos, por exemplo, para alguém de classe média como eu, que quase não temos colegas de trabalho negros ou que pouquíssimas pessoas negras têm cargos de chefia. É perigoso porque não interfere na vida de muitas pessoas que não enxergam a desigualdade, usando como argumento o fato de que, apesar das dificuldades, uma ou outra pessoa se sobressai, esquecendo as outras milhares que não obtêm o mesmo sucesso. Se você é contra cota racial, provavelmente já falou isso alguma vez. Mas enfrentar o racismo de verdade não é tão fácil e legal quando postar algo falando que a gaúcha tem que se foder.
                Na nossa sociedade o que importa é sobressair. Apenas a história dos vencedores é lembrada. Para isto, qualquer coisa vale. A menina só quis vencer. Estava no lugar errado na hora errada. Ela deveria servir para ensinar que tentar vencer a qualquer custo não vale a pena.  A base da cidadania é o respeito e a educação, mas não enxergamos isto como sucesso. Ser bem-sucedido é vencer. Rouba, mas faz. A menina não é um símbolo do que há de pior. É apenas mais uma a cair na roleta russa dos triunfadores.

segunda-feira, 28 de julho de 2014

Sabe de quem é a culpa?



          Dois povos se odeiam. Eles vivem no mesmo território, dizem que são donos de tudo e vivem guerreando. Sabe de quem é a culpa? De quem os pôs lá. No caso específico do conflito Israel – Palestina, os grandes culpados não são nem israelenses nem palestinos. São os europeus.
                Não sei ao certo quando os judeus chegaram na Europa, estou longe de ser um especialista no assunto. Sei, porém, que desde muito tempo eles foram perseguidos no velho continente. O Holocausto foi o final de uma longa história de ódio e preconceito que culminou com um dos mais terríveis genocídios da história da humanidade. Judeus foram perseguidos na Inquisição, dos séc. XVI ao XIX, tendo suas famílias obrigadas a mudar de nomes e religião. A Europa sempre os tratou como sub-humanos, como seres a serem banidos da vida cotidiana. Foram anos de ódio silencioso, tempo que permitiu que boa parte da população europeia assistisse ao extermínio dos anos 1940 de braços cruzados.
                O sionismo surgiu no final do séc. XIX. Cansados dos séculos de perseguição, um grupo de intelectuais judeus chegou à conclusão de que era necessária a criação de um estado judeu e que apenas este estado poderia acabar com a eterna peregrinação do seu povo. Como eles já entendiam que na Europa nunca teriam paz, julgaram que seu estado deveria ser no que chamam de Terra Santa, de onde foram expulsos milênios antes e que naquela época era um domínio do império Otomano.
                Tudo mudaria com a 1ª Guerra Mundial. Dispostos a receber os recursos que os judeus possuíam (eles sempre prosperaram economicamente), os ingleses prometeram, em caso de vitória, a criação do estado de Israel. Para isso, exigiam que a comunidade judaica, claro, ajudasse-os no conflito contra a Alemanha e o Império Otomano. Assim os judeus, inclusive os alemães, caíram na armadilha e financiaram economicamente os ingleses no conflito. E eis que a Inglaterra não cumpriu sua promessa após a guerra, transformando a Palestina em parte de seu domínio imperial. Era a faísca necessária para transformar um ódio silencioso em fome de extermínio nos países derrotados. Isto ajudou a permitir que alguém com o discurso com o de Hitler chegasse ao poder e fizesse o que fez. Achar que o Holocausto foi fruto apenas de uma pessoa nada mais é do que uma forma de simplificar o que ocorreu e de livrar toda a sociedade de uma culpa coletiva. E não me refiro apenas à população alemã, mas a toda população da Europa ocupada. Refiro-me ao Leste Europeu, à França e ao Vaticano. Hitler não conseguiria fazer o que fez se não contasse com a conivência de uma população em transe, livrando-se daqueles por quem sentiam um ódio primitivo.
                Acabada a guerra, os judeus, quase exterminados, não tinham mais para onde ir dentro da Europa e, na posição de vítima, contaram com o apoio americano para a criação do estado judeu na Palestina. A comunidade judaica era capaz de pressionar economicamente o governo americano, que por sua vez forçou a Inglaterra a cumprir sua promessa de 3 décadas antes e a ceder o território para esta nova nação. Os judeus poderiam, finalmente, deixar a Europa que sempre os perseguiu. Naquela terra dada pela Inglaterra, porém, já tinha muita gente morando. Mas isto não era mais problema inglês. Jogou-se o problema nas mãos da recém-criada ONU, que dividiu a região da seguinte forma: 25% seria o estado judeu (Israel) e 75% seria o estado árabe (Jordânia). Os países árabes não aceitaram esta divisão e passaram desde então a usar o povo palestino como marionete em sua guerra religiosa. Conclamados por Egito, Jordânia e Iraque, os palestinos abandonaram a região, com a promessa de que em troca teriam todo o território após a aniquilação dos judeus da região. Estes, porém, já sabiam o que era uma tentativa de aniquilação. E desta vez sabiam que tinham que se armar até os dentes contra isso. E contavam com o apoio americano. E tinham um estado. Venceram esta e todas as outras guerras contra os países árabes, que até hoje usam a população palestina como escudo. É triste, mas somente duas coisas permitem a existência do estado judaico hoje: armas e EUA. Se a situação fosse inversa, com os países árabes tendo o armamento israelense e vice-versa, o Estado israelense já não existiria mais. E o palestino provavelmente também não. Egito, Síria e Jordânia se lixam para os palestinos.
                A origem de todos os problemas de hoje da região é a Europa. A perseguição de um lado, o imperialismo britânico do outro. Tanto judeus quanto palestinos são vítimas e refugiados. Israel no fundo é isto, um grande campo de refúgio para os dois povos. Uns foram expulsos da Europa, outros, membros de uma ex-colônia que não são aceitos por seus vizinhos (sim, os mesmos países árabes que criticam Israel NÃO aceitam a imigração Palestina). O caminho para a paz, momento clichê do texto, é a convivência. É o entendimento que nenhum dos dois tem outro lugar para ir. E a forma de se chegar a isto é a compreensão de que ambos são vítimas. E têm o mesmo algoz na origem. Cada vez que vejo uma passeata pedindo a paz em qualquer grande cidade europeia, só enxergo hipocrisia. Chegou a hora de a Europa analisar seus erros passados e como ela é a responsável por muitas tragédias mundiais. A escravidão de africanos na América, a divisão da África, a questão Israel-Palestina. Chega de passeatas e de sermões arrogantes vindos de Paris e Londres. Nada que os israelenses fazem contra os palestinos é tão ruim quanto o que os europeus já fizeram a eles, e o mesmo serve para os atos dos palestinos contra os judeus.
                As novas vítimas do “ódio silencioso” europeu são os ciganos. São repelidos em quase todos os países que chegam e não há nenhum tipo de comoção quando governos tomam medidas contra eles. Nos últimos tempos, por exemplo, Nicolas Sarkozy anunciou leis que permitem a expulsão de ciganos da França, mesmo no contexto de União Europeia, e David Cameron anunciou medidas para barrar a entrada destes mesmos ciganos no Reino Unido, uma vez que Bulgária e Romênia passaram a integrar a UE.  Quase não houve barulho. Se um dia isto chegar ao extremo que chegou a questão judaica, os britânicos podem ceder uma parte do seu vasto território aos ciganos. Mas não na Europa, claro. As ilhas Malvinas são uma boa sugestão. Se os vizinhos da ilha ficarem bravos e quiserem tomá-la, que os ciganos se armem e contem com o apoio americano. 

quarta-feira, 23 de julho de 2014

Por que Haddad é o melhor prefeito que São Paulo já teve? E por que quase ninguém percebe isso?




           Sim, Fernando Haddad é o melhor prefeito que São Paulo já teve. Ao menos desde os anos 1980. Se você é incapaz de ler um texto com argumentos de quem tem essa opinião, pare agora. A rejeição a ele é para mim um grande mistério, em parte solucionado pelo ódio que parcela da população paulistana sente por qualquer coisa que venha do PT. O que não entendo, porém, é o abandono que o próprio partido fez do prefeito e como parte da militância não consegue enxergar nele as qualidades que até eu, que votei em José Serra há 2 anos, consigo ver.
              Comecemos falando pela única grande falha de Haddad em sua gestão até o momento: O aumento do IPTU. Ainda traumatizado pela confusão decorrida do aumento da passagem de ônibus, Haddad tentou transformar a questão do IPTU numa luta de classes, com o objetivo de atrair a militância com o velho discurso de rico contra pobre. Caiu do cavalo e não conseguiu impor um projeto contrário a qualquer lógica. Um grande erro, mas claramente compensado por muitos acertos.
               O principal deles, a meu ver, é que Haddad é possivelmente o primeiro prefeito desde Erundina a realmente colocar interesses coletivos acima de interesses individuais. Ao espalhar as faixas de ônibus por toda cidade, deixou bem claro que a sua prioridade era o transporte de massas e não o tão amado “Deus-carro”. Nem Erundina teve a coragem que Haddad teve de mexer tanto nesta ferida. Na mesma política de priorizar o transporte coletivo, criou o bilhete único mensal, projeto tão positivo que foi copiado pelo PSDB para Metrô e CPTM.
              Com o Plano Diretor, o prefeito tenta enfrentar o outro símbolo deste individualismo paulista, a especulação imobiliária. Em nome do lucro de poucos, inflou-se o custo dos imóveis a valores verdadeiramente irreais. Qualquer pessoa de classe média hoje deve entregar os melhores anos de sua vida para ter um cubículo minúsculo, sem nenhum questionamento sobre isto é certo ou errado, praticamente por inércia. O Plano de Haddad tenta tirar a liderança do processo de habitação da cidade das imobiliárias e devolvê-la ao coletivo. Não acho que vá dar certo, mas pelo menos vale a tentativa.
                Há muito tempo não tínhamos um prefeito cuja prioridade era ser prefeito e cujo trabalho estivesse acima de interesses pessoais. Para falar apenas sobre os prefeitos pós-redemocratização, tivemos Jânio, que era um maluco, Erundina, intransigente, Maluf, com obras faraônicas, voltadas para o individual e superfaturadas, Pitta, que enterrou SP, Marta, com sua arrogância insuportável, Serra, que queria ser prefeito para depois ser governador para depois ser presidente para depois ser rei... e finalmente Kassab e seu autoritarismo.
                Haddad adotou também o primeiro plano humano de melhorar a situação na cracolândia. Visitou a região, tentou entender o que se passa na vida daquelas pessoas, e tenta ajudá-los a se reerguer. Deu-lhes casa, um emprego, cidadania. Poucos lugares divulgaram que 70% das pessoas que fazem parte do projeto pararam de consumir crack, por mais que esta luta seja diária.
                A questão do crack, aliás, mostra uma das causas da má avaliação da gestão Haddad: a falta de divulgação. Na era da Publicidade, em que um jingle é mais importante do que uma ação, as pessoas estão mais preparadas para gostarem daquilo que dizem que é legal, e não do que vivem. Não vi até hoje uma peça, um anúncio, nada, mostrando os benefícios do Bilhete Único Mensal, por exemplo. Parte desta falta de divulgação mostra como o PT abandonou o prefeito à sua própria sorte após os protestos de 2013. O partido não quis se ligar à pessoa cujo ato foi o motivador das manifestações que se espalharam ao país. Como já dito em post anterior, nada é mais simbólico do que o fato de que Geraldo Alckmin era quem estava ao lado do prefeito no anúncio da revogação do aumento, e não algum integrante do PT. Pensou-se agora que o partido iria lutar para “limpar” a imagem de Haddad para a eleição estadual, mas aparentemente se abandonou esta ideia. O PT, inclusive, já começa a investir na candidatura picareta de Skaf como forma de derrotar o PSDB.
                O segundo motivo da rejeição à Haddad é o individualismo típico paulistano. E não apenas da propagandeada “elite branca”, mas de quase todos nós. Dos que sonham em comprar carro na primeira oportunidade, dos que não se incomodam com o fato de que boa parte da população não pode comprar seu próprio imóvel, dos que odeiam as faixas de ônibus vazias enquanto enfrentam o trânsito. A maioria da população da cidade, de qualquer faixa social e de qualquer ideologia, é individualista. O fato de que 6 dos 8 prefeitos eleitos democraticamente desde 1985 defendiam o individual (só tiro Erundina e Haddad desta lista) mostra que este é o interesse que prevalece na maioria da população. Haddad não representa a maioria, sua eleição foi um acidente momentâneo, como foi a de Erundina. Não à toa a gestão dela abriu espaço para a vitória de Paulo Maluf quatro anos depois, com a ex-prefeita caindo no ostracismo. Lembremos sempre que o vitorioso em 2012 deveria ter sido Celso Russomano e seu discurso em prol do consumidor. Ganham-se pontos defendo a propriedade privada, nunca se ouve uma palavra sobre a defesa da propriedade pública. A maioria aqui ainda só quer três coisas: ter um carro, pegar menos trânsito e morar num condomínio fechado, apenas isso. Sem contar, claro, com o fato de que 1/3 da população da cidade não aprovaria uma gestão do PT nem se o prefeito fosse Jesus Cristo. E o mesmo vale para o 1/3 da população que não aprovaria uma gestão do PSDB nem se ela fosse liderada pela Virgem Maria.
                Haddad representa ideias novas numa sociedade em que até a chamada “esquerda” é retrógrada. Suas ações podem melhorar muito a vida na cidade. Está destinado ao fracasso. Depois de Erundina tivemos Maluf e Pitta. Sabe-se lá o que teremos depois dele.

segunda-feira, 21 de julho de 2014

Prognósticos eleitorais



                Passada a grande festa do ano, o país se vira para a prioridade do semestre, as eleições de 2014. Baseado em meu escasso conhecimento sobre o assunto, repleto de erros e de análise subjetivas, falarei sobre as chances de cada um dos principais candidatos.
               Para Presidente da República, aposto numa vitória de Dilma Rousseff contra Eduardo Campos no segundo turno. Acredito numa segunda etapa pelo simples fato de que acho impossível Dilma ter mais votos este ano do que em 2010. Além disso, ela deve perder em Minas para Aécio e em Pernambuco para Campos, dois estados que ela levou há 4 anos.
                Dilma deve apostar na ideia de que tudo está muito bem, que o país era uma porcaria até 2002 e que agora é muito foda. Aécio deve apostar que tudo está indo muito mal, que o país era muito foda até 2002 e que agora é uma bosta. Campos vai com o discurso de continuar o que é bom e acabar com o que é ruim. Por isso acredito que ele vá ultrapassar Aécio e chegará ao segundo turno. Muita gente está de saco cheio desta bipolaridade PT-PSDB, abrindo muito espaço para seu crescimento. Ele deve apostar também no discurso de que tem mais chances de derrotar o PT num segundo turno do que Aécio. Numa disputa entre Dilma e Aécio, os votos de Campos devem se dividir entre os dois postulantes. Já na disputa entre Dilma e Campos, praticamente todos os votos de Aécio devem ir para Campos. Se o PT for inteligente, virará sua máquina contra Campos e não contra Aécio.
                Será uma eleição em que as redes sociais terão grande importância, mais do que nunca. Teremos, portanto, bastante baixaria, bastante notícia falsa e muita diversão. Posts dirão que Dilma vai transformar o Brasil em Cuba, que Aécio vai privatizar todas as companhias estatais do país e Campos, bom, este por enquanto fica em seu canto. Mas acho que a diferença será feita pelo enorme tempo a mais que Dilma terá no horário eleitoral e na capacidade gigantesca que o PT possui em usar a máquina estatal para divulgar seus projetos.
              Para governador de SP, talvez tenhamos o grande fato novo desta eleição: Paulo Skaf. Sem dúvida ele representa uma espécie de renascimento da antiga direita paulistana, anteriormente representada por Adhemar de Barros, Jânio Quadros e Paulo Maluf. Deste que este último entrou em desgraça, o eleitorado conservador paulistano se voltou para o PSDB, mas não por ideologia, mas sim por falta de opção. Como eles eram os únicos que poderiam derrotar o PT, o inimigo do inimigo virou automaticamente amigo. O PSDB, porém, nunca representou de verdade os anseios e vontades deste eleitorado, interessado sim em grandes obras e em interesses individuais. Com seu discurso vazio sobre “empreendedorismo”, um termo moderno e mais bonito para individualismo, e a aposta numa meritocracia que faz com que a maioria que não consegue algo se sinta culpada por isso, Skaf representa o maior perigo nesta eleição (Lembrando que este texto é subjetivo, ok?). Cegos de ódio pelo PSDB, o eleitorado petista é bem capaz de apoiá-lo num possível segundo turno contra Alckmin, sem enxergar o risco que isto representa.
               O PT sofre com uma escolha errada, a de Alexandre Padilha. Ele é claramente despreparado para o cargo. O PT até tentou inventar o programa Mais Médicos para que o ex-ministro da Saúde tivesse algo a apresentar, mas este programa dificilmente gerará um voto adicional por aqui. O partido sofrerá também com a rejeição à gestão Haddad na capital de SP. Ao praticamente abandonar o prefeito à própria sorte (nada é mais simbólico do que a presença de Alckmin e não de nenhuma autoridade petista no momento em que o prefeito anunciou a revogação do aumento de R$ 0,20 da tarifa de ônibus após os protestos do ano passado), o PT selou seu próprio destino na eleição estadual. A falta de esforço em divulgar os bons projetos do prefeito também é inexplicável. Pouco se fala sobre o bilhete único mensal, o revolucionário Plano Diretor e a humanidade que Haddad trouxe ao combate ao crack. Padilha deve crescer, mas há riscos sim de que o PT fique fora do segundo turno.
A quase vitória de Russomano na eleição municipal de 2012 mostra que uma parcela do eleitorado, especialmente a que está mais à direita, cansou-se de PT e PSDB e busca qualquer coisa diferente. Se Russomano não tivesse feito a cagada de inventar aquela proposta esdrúxula de transporte, hoje poderíamos ter o defensor dos consumidores na cadeira de prefeito. Parte do apoio de Padilha, como o PP de Paulo Maluf, já foi para Skaf, o que comprova que o PT em certa medida já conta com esta derrota.
            Alckmin conta com a boa vontade de boa parte do eleitorado, que no fundo só quer ver o PT se foder. Esquecem até que não tem água e que o investimento em transporte público é uma piada. O risco, porém, é que num segundo turno contra um candidato mais engomadinho como Skaf, com o PT já eliminado, este mesmo eleitorado passe a enxergar as falhas tucanas, preferindo um tocador de obras.
             Isto dito, os três candidatos em SP são ruins, mas acho que Alckmin será eleito. Sim, o cara deixou acabar a água no estado e vai ganhar. O pior é que, apesar disso, este não é o pior cenário. O grande vencedor, porém, independente de quem tiver mais votos, será Skaf, que ganhará força e prestígio para uma eleição futura. Este sim é o pior cenário.
             Para o Senado em SP, Eduardo Suplicy tentará seu quarto mandato e deverá ser derrotado por José Serra. A cúpula petista já não tolera mais o senador há muito tempo e não se esforçará muito para impedir sua derrota e seu fim político. Caberá a militância petista o esforço para elegê-lo. É uma pena, Suplicy é um senador muito atuante, respeitado pelos colegas e, ao contrário de Serra (e também da sua ex-esposa Marta) não enxerga o Senado apenas como um trampolim para outros cargos.
               No Rio, teremos a eleição mais divertida do país. Pesquisas hoje mostram um cenário catastrófico de segundo turno entre o ex-governador Anthony Garotinho e o bispo da Universal Marcelo Crivella. Correm por fora o atual governador Luiz Pezão e o senador petista Limdbergh Farias. Este último possui maior potencial de crescimento e creio que vá para o segundo turno contra Garotinho. Nesta segunda etapa, qualquer um que disputar contra Garotinho ou Crivella será o vencedor, por isso aposto numa vitória do PT por lá. Mas seria divertidíssimo este segundo turno Garotinho x Crivella !
             Para os outros estados, pro total falta de conhecimento e informação, aposto em vitórias da situação em todos, tirando no RS, que sempre vota na oposição. Apostas feitas, que venham os debates vazios e os horários políticos de marqueteiros picaretas.

segunda-feira, 14 de julho de 2014

SÍNDROME DE ESTOCOLMO


Hoje, dia seguinte a final da Copa do Mundo no Brasil, me deparo com matérias no Olé sobre a, segundo eles, surpreendente torcida brasileira para a Alemanha na final. Podem verificar diretamente: JORNAL OLÉ.

Segundo nossos hermanos estamos passando pela síndrome de Estocolmo. E estamos mesmo! Como na síndrome, nos apaixonamos por nossos algozes, perdoamos nossos carrascos e nos pintamos de vermelho, preto e amarelo.

A rivalidade entre Brasil e Argentina (rivalidade futebolística, em todo o texto, por favor) nunca foi totalmente explicada, desvendada e compreendida. Alguns dizem que existe mais “raiva” do lado brasileiro, o que concordo. Outros dizem que existe mais inveja do lado argentino, o que também concordo. Se estamos passando pela síndrome de Estocolmo, nossos vizinhos sofrem desde sempre com a síndrome de Burnout, pois têm essa necessidade de autoafirmação, estão a todo tempo dizendo que Maradona é melhor que Pelé ou que nos ganharam o único confronto em Copas que tivemos. É claro que o futebol brasileiro é maior que o futebol argentino, mas não muito. As diferenças são bem menores que os 3 mundiais que nos separam, mas somos melhores.
Os brasileiros, que por sinal são menos desportivos que os argentinos, apenas abrem a mão, com todos os seus 5 dedos, para responder esse grito portenho de que “Maradona es más grande que Pelé!”. O que não nego é que há admiração de ambos os lados; existe a admiração brasileira pela raça, organização e até a torcida argentina, mas existe a admiração argentina pelo futebol bonito, ousado e alegre dos brasileiros. Talvez tenha sido o maior trunfo de Diego: juntar Argentina e Brasil em um único jogador, ser eficiente para o resultado e para o espetáculo ao mesmo tempo. Podemos comprovar essa eficiência charmosa em um certo gol contra a Inglaterra em 1986.

Exposta a minha opinião sobre a rivalidade, apontarei os motivos para que TODO brasileiro fã de futebol que se preste, tenha torcido pela Alemanha. Claro que era a Argentina, e a torcida pela Alemanha não poderia ser diferente, simplesmente porque era a Argentina. Mas eu enxergo dessa vez mais uma torcida pró Alemanha do que anti Argentina, principalmente se deixarmos de lado os torcedores “copistas”, que não assistem um jogo e na época da Copa se acham os maiores entendedores.

- A Alemanha/ Adidas conquistou a maior torcida do Brasil, a do Flamengo, fazendo uma segunda camisa rubro negra.

- A delegação alemã foi extremamente simpática durante todos os dias, desde o início. A Argentina, pelo contrário, foi uma das delegações mais fechadas de todo o torneio; jogadores inacessíveis que se limitavam a dar entrevistas obrigatórias da FIFA.

- O time da Alemanha vestiu cocares e dançou com índios. Não existe nada mais simpático que dançar com índios.

- Os alemães doaram 10 mil euros para os índios comprarem uma ambulância. Meu Deus!

- Durante os próximos 3 anos a Alemanha financiará a escola da Vila de Santo André, em Santa Cruz de Cabrália.

- Eles construíram um campo de futebol para os moradores de Cabrália.

- O vídeo de Schweinsteiger e Neuer cantando o hino do Bahia foi algo magnífico.

- A amizade impensável entre Schweinsteiger, Neuer e o professor de axé Mauro Tibúrcio foi emocionante e uma prova da união dos povos.

- Schweinsteiger e Podolski assistiram Brasil e Chile junto com os funcionários do hotel e enrolados em uma bandeira brasileira.

VÍDEO DA COMEMORAÇÃO

- Antes mesmo dos 7x1 ou da final, Lukas Podolski era fenômeno nas redes sociais. É impossível não torcer por um alemão que publica em português e se utilizando de hashtags como #rioéfrenético, #respeiteaSeleção, #jogabonito, #BrasiléTradição, #BrasilTeAmo, #TudoNosso, #TamoJunto, #ÉTois...

- Tivemos o fenômeno “Podolski Brasileiro” no Twitter, depois que ele declarou que gosta de novela. Milhares de twittes que começavam com: “Podolski tá tão brasileiro que...”.

- Tivemos meme do Podolski com faixa de presidente.

- Aprendemos a escrever o nome dos alemães sem consultar o Google.
- A Alemanha fez 7 gols no Brasil e quase pediu desculpas na saída de campo. Muitos deles estavam mais envergonhados que o Felipão, por exemplo.

- A Alemanha fez 5 gols em 30 minutos. Nos 60 minutos restantes eles não deram um toque mais enfeitado na bola, pelo contrário, fizeram mais 2 gols.

- A Alemanha nos ensinou a ganhar. Espero que nunca mais o Brasil faça “firulas” somente enquanto ganha, mas que jogue sempre do mesmo jeito.

- Podolski publicou texto exaltando o Brasil e pedindo respeito, enquanto a capa do Olé...

- Enquanto tudo isso se passou, a Argentina estava fechada, intocável.

Por fim, os alemães jogariam contra os argentinos, justamente os que se gabam até hoje de terem ganhado dos brasileiros uma partida de quartas de final em uma Copa que nem venceram, como se ainda lembrássemos desse fato, ainda mais depois dos 2 mundiais que ganharíamos depois de 1990. Se somos obrigados a escutar essa musiquinha até hoje, mesmo com tudo o que se passou, porque torcer pela Argentina e ouvir para sempre que ganharam uma Copa no nosso quintal?

Como vocês dizem estamos com síndrome de Estocolmo, ou seja, se fosse a Alemanha x Holanda agiríamos do mesmo jeito.

"Brasil decime qué se siente, tener en casa a tu papá...
Te juro que aunque pasen los años, nunca nos vamos a olvidar...
Que el Diego los gambeteó, que Cani los vacunó... están llorando desde Italia hasta hoy...
A Messi vas a ver, la Copa va a traer...Maradona es más grande que Pelé."

“Brasil, me diga o que sente, ter em sua casa seu papai...
Te juro que mesmo que passem os anos, nunca vamos nos esquecer...
Que Diego os driblou, que Caniggia os espetou...estão chorando desde a Itália até hoje...
A Messi vocês vão ver, a Copa ele vai nos trazer...Maradona é melhor que Pelé."


Hermanos, realmente, não tínhamos nenhum motivo para torcer por vocês. E agora, decime qué se siente, son siete Copas sin ganar.

Viva a rivalidade.

quarta-feira, 14 de maio de 2014

O Fantástico Mundo de Nizan Guanaes




         Nizan Guanaes, dizem os entendidos, é um dos mais importantes publicitários do Brasil. Deve ser mesmo, não entendo do assunto para contrariar. Ele possui uma coluna quinzenal na Folha de São Paulo. E ela, ao menos para quem gosta de coisas trashs, como eu, é divertidíssima. Guanaes é possivelmente o pior colunista de jornal do Brasil. Absolutamente todos os textos que ele escreve são ruins e rasos. Faz bem para a autoestima de qualquer pessoa que goste de escrever ler os seus textos. Até eu me acho um escritor ao lê-lo. Esta semana, como um artista com sua obra mais importante, ele escreveu o seu pior texto. Uma verdadeira obra-prima às avessas. Ele tenta explicar o porquê as manifestações não devem ocorrer durante a Copa do Mundo. Se você ainda não teve a oportunidade de ler, o link está abaixo:
            A “magia” do texto começa, a meu ver, com o tom adotado por Guanaes. Ele nos conta exatamente como devemos agir, em nenhum momento nos convidando à reflexão. Tudo no texto é imperdível. Desde o título, exaltando o Brasil, passando pela introdução, em que as manifestações do ano passado são elogiadas, chegando à sua tese, em que ele diz que devemos ser alegres, pacíficos e passivos por um mês.
O Brasil é um país de origem escravista, com governos autoritários em boa parte de sua história. A sociedade, claro, sofre com resquícios disso, principalmente no que se refere à hierarquia. Chefes mandam, funcionários obedecem cegamente. A elite fala, o resto ouve. Guanaes, um homem de sucesso, respeitado e bajulado por todos, está acostumado a ensinar e mandar, a reles mortais como nós cabe o papel de ouvir, aprender, obedecer e bater palma. Não à toa tantas pessoas em busca de sucesso pagam fortunas por palestras motivacionais de pessoas de sucesso como ele. Do mesmo jeito que ele aceitou o papel de influenciador, os outros aceitam o papel de influenciados. Como um joguinho.
           Guanaes é publicitário e, como todo publicitário que se preze, tenta transformar tudo num produto para vendê-lo. Isto mostra que ele tem realmente vocação para a profissão. Para quem teve preguiça e não leu o texto, ele basicamente diz a nós, leitores revoltadinhos, que não façamos protestos durante a Copa do Mundo. Assim, mostraremos ao mundo um país feliz e agradável. Depois da Copa, com o mundo não mais nos olhando, o bicho pode pegar. Transformar o Brasil num produto, porém, não é algo tão fácil para nós quanto é para ele. Não sei nada da sua vida, mas muito provavelmente ele é do tipo que, por ano, passa 4 meses na Costa do Sauípe, 4 meses na Barra da Tijuca e os outros 4 meses em Miami. Para nós, o Brasil não é um produto, é a nossa casa. Nela vivemos, não estamos interessadas em vendê-la. Não podemos simplesmente esquecer nossas mazelas para que os outros achem que vivemos numa fantasia muito diferente da nossa realidade. Não temos saúde, transporte e educação, e temos que agir como tais para que o mundo veja. Se o mundo não gostar, foda-se.
          A agência de Guanaes lançou uma campanha publicitária como o nome #imaginanacopa. Publicitários antenados que são, só podiam começar a campanha com este hashtag. A base da campanha, cujo objetivo era vender alguma cerveja que não lembro o nome, era dizer que nossa bagunça era legal, que iríamos nos divertir muito durante o caos, a pegação iria rolar solta, muitas meninas viriam pedir um gole de nossa cerveja com olhares provocantes e o mundo ia achar tudo legal. Não deu certo. Vivemos esta bagunça e sabemos que ela é uma merda. Não venha nos dizer que trânsito é legal, porque não é. Pelo que leio, a publicidade está desesperada porque ganhará menos dinheiro nessa Copa do que esperavam. Estão putos. Sabemos como é, a maioria de nós convive a tempos com o fato de ganhar menos dinheiro do que achava que ganharia. A eles, tudo que tenho a dizer é, bem-vindo ao nosso mundo!
           Falando sobre os legados da Copa, ouso discordar do gênio. Para mim, há dois:
          1 )Ela serviu para mostrar a incapacidade de nossa classe política em realizar algo pensando no bem coletivo. Não apenas do PT, mas de todos. A Copa é responsabilidade de todos. Não se esqueçam da patética cena de Alckmin e Kassab comemorando a escolha de são Paulo como abertura do Mundial. Nem que Eduardo Campos decidiu construir um quarto estádio em Recife quando as três equipes da cidade o possuíam. Eles são incapazes de planejar qualquer coisa.
2) Somos um povo idiota e nada estimula mais nossa idiotice do que a paixão clubística. De todas as roubalheiras da Copa, as únicas defendidas por parcela da população são aquelas que beneficiaram algum clube. A Gaviões do Fiel impediu uma manifestação no Itaquerão, pois isto prejudicava o Corinthians. A torcida do Inter não aceita questionamentos ao dinheiro público investido na reforma do Beira-Rio sendo que o Grêmio estava construindo um estádio padrão-fifa no mesmo período. No país em que o interesse individual está sempre acima do interesse coletivo, o amor pelo clube está acima do amor pelo país. O meu prognóstico é que, a partir de agora, clubes de futebol serão usados com mais frequência por políticos corruptos. O patrocínio da Caixa para muitas equipes é um pequeno demonstrativo do que veremos nos próximos anos.
A população brasileira já perdeu com a Copa. Não só financeiramente, mas em entusiasmo. Nunca vi uma Copa com começo tão broxante quanto essa. Quanto a Nizan, peço que ele continue escrevendo sua coluna. E que se junte na nós quando sentir que está ganhando menos do que imaginava. E que se prepare para ano que vem. Em 2015, começaremos a pagar a conta. Ficará mais caro ir para Miami.

segunda-feira, 28 de abril de 2014

Cinco Minutos que valeram uma guerra




Em 2 de abril de 1982, a Argentina entrou em um transe coletivo, uma histeria na verdade. O ditador Leopoldo Galtieri, chefe da Junta das Forças Armadas que governava o país desde 1976 anunciava, para delírio de um povo em êxtase na Praça de Maio, que o país estava invadindo as ilhas Malvinas, cuja posse os argentinos reivindicavam da Grã-Bretanha desde o séc. XIX. Galtieri foi o segundo dos três presidentes da ditadura argentina, que durou entre 1976 e 1983. Foi a ditadura mais cruel do continente. Dados divergem sobre o número de mortos, mas as estatísticas falam entre 10.000 e 30.000 mortos. Para se ter uma ideia, a ditadura brasileira, em 21 anos, matou 300 pessoas.
                Em 1982 a Argentina passava por uma grave crise econômica e o governo militar era mais contestado do que nunca. Precisava-se de algo que trouxesse novamente o apoio popular. O arquipélago das Malvinas é a grande mágoa do povo argentino. Duas ilhotas que quase nada tem, nem gente, mas cuja presença inglesa dói na alma portenha. A invasão ocorreu de sopetão e a população do país embarcou com coração e alma na aventura. A popularidade de Galtieri subiu acima de 90% e até os grupos clandestinos de esquerda se alistaram na luta contra os “imperialistas ingleses”.
                Galtieri jamais imaginava que a Inglaterra respondesse. Os argentinos acreditavam em um suposto apoio americano à ocupação das ilhas. Dizia o acordo da OEA que todos os países membros apoiariam um integrante que se envolvesse num conflito e os americanos, até aquele momento, sempre olharam com bons olhos não apenas a ditadura argentina, mas todas as outras ditaduras de direita do continente sul-americano, com exceção dos quatro anos de governo Carter. Reagan, seu sucessor, obviamente não cumpriu o acordo da OEA e apoiou incondicionalmente o Reino Unido de Margareth Thatcher. Foi seguido por Pinochet, que permitiu inclusive que os britânicos usassem o território chileno como base área, e, de forma mais implícita, pelo Brasil, que liberou seu espaço aéreo e naval aos europeus.
                O ditador argentino terminou seu discurso em 02/04/1982 com a frase “Que venham os ingleses”. E eles foram. Com tudo. Margareth Thatcher passava por um período conturbado em seu governo e nada como um conflito com um país claramente mais fraco e agressor para garantir uns pontinhos de popularidade. Não houve guerra, mas sim massacre. Menos de três meses depois da invasão a Argentina estava humilhantemente derrotada. A autoestima de seu povo foi para o chão, junto com a moral dos soldados derrotados e da Junta Militar, que não sobreviveria mais um ano. Era um país em frangalhos.
                Quis o destino que quatro anos depois, em 22/06/1986, Argentina e Inglaterra se encontrassem em um jogo de Copa do Mundo. Futebol é algo irrelevante perto de uma guerra, mas não naquele dia, não para os argentinos. O nervosismo tomou conta de Buenos Aires nos dias e horas que antecederam aquela partida. Ninguém queria pensar como seria o dia posterior a uma possível nova derrota para os ingleses. Ninguém imaginava também o que estava para acontecer.
                O primeiro tempo do jogo foi tenso, com brigas nas arquibancadas, cantos provocativos da torcida inglesa e muita porrada no meio de campo. No segundo tempo, os cinco minutos de glória. Aos 6 minutos, um baixinho acima do peso que jogava pela Argentina tentou uma jogada que deu errado, a bola ricocheteou e sobrou no alto para uma dividida entre este gordinho e o goleiro inglês de quase dois metros. O baixinho, que jamais ganharia esta dividida, foi com a mão na bola, que entrou, e saiu comemorando sem olhar para o lado. Todo estádio viu a mão na bola, menos juiz e bandeirinha. O gordinho havia trapaceado contra os ingleses. Isto é errado, mas não naquele dia. Nada poderia ser mais gostoso para um argentino do que ver ingleses enfurecidos, sentindo-se enganados por um portenho. A humilhação da guerra já era menor. Cinco minutos depois, porém, o que já era gostoso tornou-se uma hecatombe, uma nova histeria coletiva. O mesmo baixinho que era odiado pelos imperialistas enganados, driblou sete ingleses enfurecidos, deixou dois inclusive no chão e fez o gol mais bonito da história do campeonato. É impossível para quem não é argentino entender o que aqueles cinco minutos representaram para a autoestima do país. Ver um portenho primeiro enganar os ingleses com sua malícia e depois humilhá-los com seu talento lavou a alma de um povo. Futebol é algo insignificante. Mas não aquele dia. A Argentina ganharia o jogo e o campeonato, mas são estes cinco minutos que criaram um mito. Diego Armando Maradona, o baixinho gordo que fez os vilões ingleses chorarem por um dia enquanto os argentinos celebravam. Aquele dia representou um novo início para o país. O luto havia acabado.
                Para quem gosta de história, o vídeo abaixo mostra imagem de 1982 de um programa da TV argentina durante a guerra, chamado “24 horas pelas Malvinas”. Era uma espécie de Teleton para arrecadar fundos para os soldados. Nele, Maradona aparece fazendo uma contribuição em dinheiro. A maior contribuição, no entanto, ele daria 4 anos depois. O povo argentino é eternamente grato.

NOBRES INTENÇÕES DE UM MILIONÁRIO... APAIXONADO, BURRO E TEIMOSO.


 
Sou corintiano, mas gosto de futebol e venho acompanhando a vida política palmeirense. Se você é daqueles palmeirenses que no final me mandarão cuidar do meu time, pare por aqui e digite o site do Avanti no seu navegador.

Vejo Paulo Nobre como um dos caras mais bem intencionados do futebol. Ele ama o Palmeiras, ele faz o que eu sempre digo que faria se ganhasse na loteria, ele coloca dinheiro do próprio bolso no clube.

Paulo Nobre assumiu o clube em ano de série B e pior, após a presidência de Arnaldo Tirone. Fez o que tinha que ser feito, montou um time barato e eficiente, contratou especialistas ao invés de distribuir cargos aos conselheiros que gostam de brincar de ser dirigente. Ao fazer do Palmeiras campeão da série B não fez mais do que a obrigação. Herdou muitas cagadas como o estádio, Valdívia e Wesley. Fez algumas cagadas como Barcos e Kardec.

Paulo Nobre instaurou a política da produtividade. Uma idéia muito boa para times pequenos ou com um elenco de renegados. Os jogadores que Paulo Nobre contratou vieram com esse tal contrato de produtividade e o Palmeiras montou um time de renegados bem competitivo.

Assisti boa parte da imprensa idolatrar o novo manager após a primeira fase do Paulistão, mas na minha cabeça sabia que esse castelinho iria desmoronar logo que fosse empossado o primeiro rei. Alan Kardec chegou a condição de selecionável e pronto, the bomb has been planted.

No elenco palmeirense existem altos salários para jogadores questionáveis ou não. Prass, Valdívia, Wesley e até Gilson Kleina inflam a folha de pagamentos. Prass é um bom goleiro, é útil, mas já tem 35 anos. Wesley chegou por 21 milhões de reais, deve sair de graça sem grandes conquistas. Gilson Kleina viu seu cargo ser colocado à disposição de inúmeros gringos para o ano do centenário, o que se tornou um tiro no pé para a diretoria que teve que ficar com o treinador por 300 paus. O Valdívia não merece muitos comentários, todos sabem que foi um mau negócio e que o Palmeiras o trocaria por uma Kombi, apenas para se livrar do seu salário.

Depois da saída do craque Barcos a diretoria do Palmeiras tentou acertar novamente e conseguiu. Alan Kardec chegou junto com espirituosos trocadilhos – como este – mas surpreendeu muita gente. Um bom jogador renegado pela Europa, perfil “Nobrelesco” de contratações. Paulo Nobre também rompeu com as organizadas, atitude louvável e digna de admiração, mas todos sabem que uma hora se paga o preço da ousadia.

Kardec virou o jogador mais querido pela torcida; estava resolvendo. São Paulo, Corinthians, Grêmio, todos interessados no jogador e, como na economia, existe a lei da oferta e da procura. Acertar contratos de produtividade com jogadores em que ninguém mais acredita é uma coisa, mas propor contratos de produtividade para as novas estrelas é algo muito difícil. Depois de semanas de negociação, tudo caminhava para um final feliz palmeirense; Paulo Nobre conseguiria o seu contrato de produtividade e o camisa 14 conseguiria o seu aumento de salário fixo para 220 mil. Em um lapso estrelismo, autoritarismo, graça ou burrice, o nosso milionário piloto de rally decidiu que pagaria 200 mil reais e nada mais; segundo o pai do jogador a diferença foi de 5 mil (pagaria 215 mil), fato que vou ignorar para que não fique ridículo. Alan Kardec é trabalhador, como todos nós, e tinha uma proposta são-paulina de 350 mil reias mensais (e fixos) nas mãos; nessa história não existe mercenário, existe o burro. Kardec cumpriu o seu contrato, se valorizou e deve ser pago pelo o que está jogando. Se o Valdívia ganha 400, o Kardec pode que pedir 500, se quiser. Jogador gosta de salário fixo, pois trabalha com o corpo e se estourar o joelho, quer estar garantido. Paulo Nobre e Brunoro querem tratar jogador que nem funcionário público: 30% de salário base + 70 de gratificações. Hoje quem está feliz é o Kardec; ganha 350 mil, receberá luvas e caso trinque uma vértebra e não possa jogar por 4 anos, ganhará 350 mil reais mensais. Quanto ao São Paulo ainda não sabemos, mas os que perderam foram Nobre, Brunoro, Gilson Kleina e, principalmente, a torcida que canta e vibra.

Por uma birra de 20 mil reais Paulo Nobre conseguiu trazer contra si, além de oposição e organizadas, o torcedor comum; esse torcedor que fez de Alan Kardec o recordista na venda de camisas nas lojas palmeirenses, o torcedor que clama por um centenário melhor que o dos rivais, o torcedor que viu o seu time ser eliminado pelo Ituano, justo nesse ano tão importante. Organizadas estão com as pedras na mão e dispostas a recuperar o espaço nas arquibancadas que perderam com o Avanti.

Já foi lançada uma campanha para o pagamento do Avanti por produtividade, como gosta o Paulo. Se o Palmeiras ganha, recebe. Se não ganha, não recebe. É mais uma vez a política destruindo todo o romantismo do futebol, pois até os ditos mais fanáticos estão usando uma situação em benefício próprio; o problema é que foi Nobre quem deu a munição.

O Palmeiras acaba de contratar Henrique, da Portuguesa, para o lugar de Kardec. É como perder uma geladeira e comprar isopor com gelo. Mas essa é a nova política palmeirense: Compre barato, valorize o jogador e deixe-o ir, sempre na esperança de acertar outra vez. Acertaram com Barcos e Kardec, a bola da vez é o Henrique, que promete fazer jus à “linha atacante de raça”, mas somente isso. O Palmeiras de outrora que era ponte e vitrine para a Europa não existe mais, agora se tornou vitrine para outros grandes clubes brasileiros, infelizmente.

Burrice, aliada ao poder e a teimosia faz com que o ídolo do time pule o muro para o rival; tudo isso por conta de 20 – ou 5 –  mil reais, muito menos do que um final de semana de rally na Grécia.




sexta-feira, 25 de abril de 2014

Opinando sobre tudo !


              

                   Ontem cheguei em casa e consegui assistir um pouco do programa do Datena. É divertidíssimo. Há muito tempo eu não o assistia e não lembrava como era bom. Ele faz na TV mais ou menos o que fazemos aqui neste blog, opina sobre todos os assuntos sem nenhum embasamento como se soubesse o que está falando. A diferença é que ele ganha uma fortuna para fazer isso. É sensacional. Lembrei-me de duas coberturas do Datena que realmente me marcaram. Uma de quando caiu um avião da TAM, em que ele deu uma verdadeira “aula” sobre aeronaves, e outra quando morreu o jogador Serginho do São Caetano de infarto no meio de um jogo, em que Datena provou ser um verdadeiro especialista em cardiologia.
             Inspirado pelo grande meste, resolvi fazer um verdadeiro experimento datenesco. Tentarei comentar e opinar, com a menor quantidade de caracteres possível, as notícias mais lidas de um conglomerado qualquer, entendendo ou não do assunto. Como esta opinião tem que ser a mais rasa possível, a regra que criei, baseada em nada, é que só posso ler apenas a manchete, não clicarei em nenhuma notícia, e mesmo assim tenho que opinar a respeito. O conglomerado que escolhi divide suas notícias mais lidas em 3 tópicos. Começaremos  pelo assunto mais importante, celebridades e famosos, passando em seguida para esporte e, finalmente, chegando no assunto mais irrelevante, política e atualidades... Vamos lá !

Celebridades:
   1 - Estilista Roberto Cavalli curte praia em Miami com a namorada em ótima forma; veja fotos – Ele é um velho rico e ela uma jovem bonita. O amor é lindo!
   2 - Sexo por trabalho? Veja as famosas que disseram ter sido vítimas do 'teste do sofá' – Aposto que nenhuma das entrevistadas assumiu que fez o teste, apenas conhecem alguém que tenha feito.
   3 -  Luciano emagrece 20 quilos, oito meses após ser internado com problemas de saúde – Gostei do filme dele e do irmão. Embora tenha ficado claro pelo filme que o Luciano não teve importância nenhuma na dupla.
   4 -  Após várias cirurgias, 'Barbie humana' chama atenção pela cintura finíssima – Sabia que se investe 10 vezes mais em novas cirurgias plásticas do que na cura do câncer? Isto mostra o quão bizarro somos como sociedade.
   5 -  'Em Família': Giselle leva susto e é assaltada durante passeio pelo Rio de Janeiro – As novelas do Manoel Carlos são chatíssimas.

Esportes:
   1 - Felipão confirma oito convocados para Copa do Mundo; veja os nomes dos garantidos – Surpresa seria se ele anunciasse que o Adriano Imperador vai a copa.
   2 -Após derrota na Colômbia, Paulo Autuori deixa comando do Atlético-MG – Finalmente! Quem sabe ainda dá tempo de salvar.
   3 - Horas após saída de Autuori, Galo age rápido e acerta contratação de Levir Culpi – é, não vai dar pra salvar.
   4 - Aposentada, Joanna Maranhão deve R$ 400 mil e engatinha como técnica – Tá devendo bastante hein?
   5- Zé Roberto revela acerto de contas e sela a paz com Bernardinho: 'Passou' – Vôlei é o esporte mais chato do universo

Política e Atualidades:
    1 - Regina Casé se despede de dançarino do 'Esquenta' morto no Rio de Janeiro  - Mais um caso de tragédia policial. -  Isto mostra o quanto ainda somos um país autoritário.
   2 - O sangue de uma supercentenária dá pistas de por que morremos – Sério que alguém leu essa? Morremos porque temos que morrer, somos passageiros e insignificantes para o mundo, não deveríamos levar nossa existência tão a sério.
    3 –  Policial é operado após algemar e matar namorada de 21 anos em rua do PR – Deixem-no morrer. É impressão minha ou está crescendo em número estes casos de tragédias passionais?
   4 - Rancho no Maranhão é primeiro espaço 'gay friendly' do Brasil – Legal! A sociedade evolui. Se você é homofóbico, saiba que um dia você terá vergonha disso.
   5 - Protesto após enterro de dançarino fecha vias e comércio de Copacabana. Sou a favor de todos os protestos. Ainda mais quando são justos.

É legal isso! Incentivo todos a opinarem. Conhecimento e embasamento são detalhes insignificantes. Estes são os assuntos que mais interessam aos internautas brasileiros. Famosos, futebol e violência. Nada sobre política, nada sobre o mundo. A notícia "perfeita" seria, portanto, "Neymar e Bruna Marquezine são assaltados na Barra da Tijuca".
E ainda achamos que o nosso maior problema são os políticos...

quarta-feira, 23 de abril de 2014

DITADURA NAZISTA DA MINORIA BURRA


 
O Tribunal Superior Eleitoral criou neste ano de eleições a campanha #vempraurna que, entre outros públicos, é endereçada às mulheres no nosso país.
Como de costume, primeiro me explico e depois desço a lenha. São louváveis os esforços para aumentar a participação feminina na política com o objetivo de corrigir erros históricos e machistas. As mulheres entraram na política somente em 1932 e além das ditaduras – como todos os brasileiros – tiveram que enfrentar aquele certo ar machista que não as deixava conquistar cargos importantes, quanto mais a maioria no Congresso Nacional.

Não vou ficar descrevendo a propaganda. Assista abaixo, reflita, tire conclusões e veja as minhas.
PROPAGANDA - TSE

Essa propaganda é absurdamente antidemocrática. O Congresso Nacional ajudou a corrigir erros históricos quando obrigou que os partidos políticos preenchessem suas chapas com no mínimo de 30% e no máximo de 70% de candidatos de cada sexo (Lei 9504/97). Essa lei, apesar de não citar especificamente a mulher, foi criada para que os partidos fossem obrigados a ter ao menos 30% delas em seus quadros.

Segundo a propaganda, as mulheres são maioria da população e têm maior escolaridade. Se a participação feminina no Congresso é de apenas 9% onde está o problema, segundo o TSE? Claro, mulheres não estão votando nas mulheres!!! #vempraurna... “Até quando vamos deixar que eles falem por nós?”.

Apenas 9% de mulheres no Congresso não reflete machismo, reflete a democracia. Como pode existir machismo em um país que reserva cotas para as mulheres, tem o número de candidatas suficientes para preencher todos os cargos políticos, um país em que as mulheres são maioria e têm mais escolaridade? Estamos vivendo, então, o domínio da minoria burra?
Hoje não existe espaço para machismo na política. O voto é obrigatório, secreto e todas as mulheres votam. Nenhuma mulher brasileira tem necessidade ou obrigatoriedade de votar em homem. Naquele pequeno espaço, de frente com a urna, todos são iguais e fazem a sua escolha sem que ninguém possa ou precise saber.

Por que guerra dos sexos se somos todos brasileiros com as mesmas necessidades? O Brasil é um país relativamente novo, em constante evolução e a política é como economia de mercado: com o tempo as coisas se ajeitam sozinhas. Claro que a participação feminina crescerá, mas pela democracia e não pela guerra dos sexos ou qualquer interesse político subjetivo. Eu acredito, em boa parte, no TSE e justamente por isso não quero nem pensar que essa campanha tem finalidade indireta de apoiar uma candidata à presidência. Afinal, se as mulheres quiserem, Dilminha é reeleita no primeiro turno.
Corrigir erros históricos é diferente de levantar uma bandeira para que “brotem” mais mulheres no Congresso. A correção necessária já foi feita, agora deixem que homens e mulheres façam suas escolhas e assistam em paz a maravilha que é o processo democrático.

Luzes da Ribalta


           
             Luzes da Ribalta (1952) é o último filme de Charlie Chaplin. Trata-se de uma história autobiográfica sobre um palhaço decadente, que não encontra mais seu lugar no mundo, engolido por uma nova geração interessada em outro tipo de arte e humor. Impossível, para mim, lembrar deste filme sem compará-lo às situações vividas por Chico Anysio e Renato Aragão. O que está em discussão não é a qualidade artística dos três, mas a forma como suas artes sucumbiram ao tempo. O primeiro morreu no ostracismo, o segundo segue este caminho. A forma como os três perderam popularidade com a idade e com as transformações do gosto do público ligam as 3 histórias. Chaplin foi vítima do cinema falado; Aragão e Anysio, vítimas da internet e da TV a cabo.
                A sociedade mudou. O humor na televisão brasileira mudou. É inevitável lutar contra isso. Renato e Chico foram criados para um tipo de humor de um país diferente, em que as pessoas viviam em sua maior parte no interior, isoladas e com pouco acesso à informação. Quase todos os humoristas daquela época começaram num tipo de ambiente que hoje é quase inexistente, o circo. Hoje, num país em que a maioria das pessoas é de classe média e vive em cidades, com acesso a informações vindas do mundo inteiro, o começo vem nos stand ups, não à toa um nome em inglês. A chamada opinião pública, outrora formada em maior parte por pessoas simples de cidades interioranas que buscavam um humor em certa medida inocente, hoje é composta por uma classe média que vive em grandes cidades, pessoas competitivas e hierarquizadas que procuram um humor que registre sua forma de enxergar o mundo. A Praça é Nossa não tem a menor graça para quem assiste Pânico. Sem juízo de valor, isto é fato.
                Uma coisa une estas duas gerações do humor brasileiro: a existência de um “escada”. Há alguém que se dá bem e alguém que se dá mal nas esquetes, quase sempre. Alguém humilhando e enganando, outro humilhado e enganado. Renato Aragão, por exemplo, tinha Dedé Santana para preparar suas piadas. A diferença é que, na geração dos realities shows, este escada hoje é quase sempre uma pessoa real e não um personagem. Alguém que se sujeite, conscientemente ou não, a ser humilhado em praça pública para deleite do “admirável público”. Poucas coisas divertem mais essa geração competitiva do que alguém sofrendo bullying, isto faz com que se sintam pessoas melhores do que aquele alvo de chacota.  Sentem-se menos feios ao ver um feio de verdade sendo zoado, sentem-se menos pobre ao ver um pobre sendo zoado. Ser melhor do que alguém, este é o lema não só do humor, mas de tudo.  O novo humor apenas reflete isso. Mais uma vez, sem juízo de valor.
                Uma coisa separa as duas gerações: o limite. A antiga é composta por pessoas vindas de um país pobre, ou seja, a vida lhes impôs limite, como a fome e a pobreza. Quem passou por limitações sabe que tudo tem limites. A nova geração, filha de pais que forneceram tudo, não conhece esta palavra e, por isso, acha que seu humor é uma arte que não deve sofrer com nenhum tipo de regra, seja de si mesmo, seja da sociedade.
                Renato Aragão e Chico Anysio passaram boa parte da vida sendo tratados como gênios. Nada deve ser mais triste para pessoas como eles, que se acostumaram com este tratamento, perceberem que no fundo eram apenas um produto, consumido e descartado quando não mais interessante. É muito ruim contar uma piada que ninguém mais ri.
                Eduardo Sterblitch é um dos grandes nomes do humor atual. Trabalha no Pânico e possui um quadro chamado Poderoso Castiga, em que recebe subcelebridades e começa a humilhá-las. Estas vão ao quadro para serem achincalhadas de forma voluntária. Na sociedade do espetáculo, vale tudo para esticar em alguns segundos os 15 minutos de fama. Em entrevista a Jô Soares, foi chamado pelo apresentador de gênio. Jô entende muito mais de humor do que eu. Cada geração tem o gênio que merece e que a representa. 

quarta-feira, 16 de abril de 2014

Os estaduais não são chatos. Os torcedores são.



                Em 17/06/1992, o São Paulo enfrentou o Newell’s Old Boys na final da Libertadores no estádio do Morumbi. O público foi de 105.185 pessoas e o jogo foi transmitido pela TV Gazeta. Seis meses depois, o mesmo SP enfrentaria o Palmeiras na final do hoje chamado “Paulistinha”. O público foi de 110.887 e o jogo foi transmitido por Globo e Bandeirantes. De lá para cá, aconteceu uma coisa que acabou com o interesse pelos estaduais e que tornou o futebol brasileiro esta coisa chata que é hoje: A TV a cabo.
                Tornamo-nos pessoas que se julgam “globais”. Temos mais acesso a coisas que acontecem em Londres ou Nova York do que a coisas que acontecem no interior do Brasil. Passamos a enxergar nossa realidade como sendo a destes locais e não de coisas que acontecem muito mais próximas a nós.  Isto para mim é muito claro no humor. Essa nova geração de stand up tem como referência Seinfeld, e não Chico Anysio.
Falando de futebol, temos uma geração hoje que já passou parte da adolescência assistindo campeonatos estrangeiros na TV e que nunca foi a um estádio. São pessoas que se identificam mais com Manchester United e Barcelona do que com times do interior do Estado. Mais do que isso, passamos a ter jornalistas, os grandes formadores de opinião, que começaram a frequentar jogos na Europa com mais frequência, tendo mais vivência no Santiago Bernabéu do que no Moisés Lucarelli. Público e formadores de opinião, portanto, vivem hojen essa realidade,  criada pela televisão a cabo. Ela moldou um público e hoje atende ao seu interesse.
Por influência familiar ainda temos um time, mas não nos interessa mais que eles sejam apenas locais. Queremos que eles ganhem o mundo e façam parte, nem que apenas na nossa cabeça, daquela nova realidade europeia a que nos acostumamos e falsamente vivemos. Ganhar do Palmeiras não basta mais ao torcedor do Corinthians, o sonho realizado foi vê-lo ganhar do Chelsea.
Aos poucos o futebol brasileiro está se “adaptando” a esta nova realidade imposta por um público europeu. O mata-mata foi pro saco, dando lugar a um chatíssimo campeonato por pontos corridos, em que o melhor sempre ganha. A próxima vítima é o campeonato estadual. Fodam-se os times do interior, eles não nos interessam mais. É perda de tempo e dinheiro viajar para as cidades próximas do estado, quando deveríamos nos esforçar para buscar uma aproximação com os clubes europeus. Quem nunca ouviu que Flamengo e Corinthians, com boa gestão, poderiam ser o Real Madrid e o Barcelona? Pois eu ainda prefiro que eles sejam Flamengo e Corinthians.
Gosto muito de programas de debates esportivos da TV a cabo, principalmente aqueles com jornalistas mais velhos. Gosto muito de ver gente que se julga séria falando de um assunto como futebol como se fosse a coisa mais importante do mundo. O meu “favorito” é um que passa de manhã que mistura futebol com o que há de mais chato na MPB. Gosto mais ainda quando o termo especialista é usado e quando eles ficam horas esperando um jogador dar uma entrevista dizendo que agradece a Deus e aos companheiros. Divirto-me também quando eles falam que tudo tem que mudar, que temos que acabar com os estaduais, que eles não têm mais interesse algum do grande público, e que temos que acabar com o mata-mata, ele não é justo. No mesmo programa, eles lembram saudosistas como o futebol era legal até os anos 80. Ninguém questiona o paradoxo de ser contra estaduais e sentir saudade da época em que estes eram os campeonatos mais importantes do país e em que todos os campeonatos eram decididos por em sistema de mata-mata.
Tive uma conversa sobre este assunto com uma pessoa que disse que o mundo mudou e que temos que nos adaptar a esta nova realidade. Se for isso mesmo, que pena... O mundo está mais chato. A minha mensagem àqueles que ficam em casa aos domingos para assistir campeonato inglês seria: Desligue a TV e vá ao estádio! E viva o Ituano !