Não
acho que a menina seja racista. Ela cometeu um ato racista, isto é crime e ela
deve ser punida por isso. Está na lei e é simples. O mais chocante para mim foi
a entrevista de Wanderlei Luxemburgo sobre este assunto no dia seguinte, em que
ele disse que estes xingamentos fazem parte do jogo. A meu ver, este é o grande
ponto a ser discutido, o vale-tudo pela vitória.
O
futebol acabou se tornando uma grande vitrine da sociedade e de sua gana para
vencer a qualquer custo. Da mesma forma que em uma empresa vale tudo para se
chegar a cargos mais altos, passando por cima de qualquer regra ética, no
futebol de hoje não importam os meios para se alcançar a vitória desejada. Quem
assiste a jogos do Corinthians e vê a pressão que o time de Mano Menezes faz
sobre a arbitragem em quase todos os lances sabe do que estou falando. Este
tipo de “pressão” é normal. Chamar o adversário de macaco ou de viado não causa
remorso, uma vez que só o que se quer é ver o adversário desestabilizado. A
situação é tão normal que basta ver que ninguém que está perto da menina
gremista a questiona quando ela faz isso. Ela muito provavelmente não se acha
superior a Aranha por ser branca. Só queria que ele frangasse. Do mesmo jeito
que as pessoas que gritavam “viado” cada vez que o Richarlysson pegava na bola.
Sendo assim, o chocante do ato no RS não foi o ato em si, mas a banalidade com
que ocorreu.
A
menina agora virou a vidraça e todos têm a pedra. Criticá-la significa se
mostrar alguém não racista e ganhar curtidas no facebook. Ela virou uma espécie
de Wilson Simonal do tema. Destruir a vida dela é fácil, ela é um nada que não
conhecemos, que está distante, que cometeu um erro e que ninguém viverá o
sofrimento dela. Ela que se foda.
O
racismo no Brasil é perigoso por ser implícito e porque só o questionamos
quando ele é visível. Não o enxergamos quando não notamos, por exemplo, para alguém
de classe média como eu, que quase não temos colegas de trabalho negros ou que
pouquíssimas pessoas negras têm cargos de chefia. É perigoso porque não
interfere na vida de muitas pessoas que não enxergam a desigualdade, usando
como argumento o fato de que, apesar das dificuldades, uma ou outra pessoa se
sobressai, esquecendo as outras milhares que não obtêm o mesmo sucesso. Se você
é contra cota racial, provavelmente já falou isso alguma vez. Mas enfrentar o
racismo de verdade não é tão fácil e legal quando postar algo falando que a
gaúcha tem que se foder.
Na
nossa sociedade o que importa é sobressair. Apenas a história dos vencedores é
lembrada. Para isto, qualquer coisa vale. A menina só quis vencer. Estava no
lugar errado na hora errada. Ela deveria servir para ensinar que tentar vencer
a qualquer custo não vale a pena. A base
da cidadania é o respeito e a educação, mas não enxergamos isto como sucesso.
Ser bem-sucedido é vencer. Rouba, mas faz. A menina não é um símbolo do que há
de pior. É apenas mais uma a cair na roleta russa dos triunfadores.
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