Sim, Fernando Haddad é o melhor
prefeito que São Paulo já teve. Ao menos desde os anos 1980. Se você é incapaz
de ler um texto com argumentos de quem tem essa opinião, pare agora. A rejeição
a ele é para mim um grande mistério, em parte solucionado pelo ódio que parcela
da população paulistana sente por qualquer coisa que venha do PT. O que não
entendo, porém, é o abandono que o próprio partido fez do prefeito e como parte
da militância não consegue enxergar nele as qualidades que até eu, que votei em
José Serra há 2 anos, consigo ver.
Comecemos
falando pela única grande falha de Haddad em sua gestão até o momento: O
aumento do IPTU. Ainda traumatizado pela confusão decorrida do aumento da
passagem de ônibus, Haddad tentou transformar a questão do IPTU numa luta de
classes, com o objetivo de atrair a militância com o velho discurso de rico
contra pobre. Caiu do cavalo e não conseguiu impor um projeto contrário a
qualquer lógica. Um grande erro, mas claramente compensado por muitos acertos.
O
principal deles, a meu ver, é que Haddad é possivelmente o primeiro prefeito
desde Erundina a realmente colocar interesses coletivos acima de interesses
individuais. Ao espalhar as faixas de ônibus por toda cidade, deixou bem claro
que a sua prioridade era o transporte de massas e não o tão amado “Deus-carro”.
Nem Erundina teve a coragem que Haddad teve de mexer tanto nesta ferida. Na
mesma política de priorizar o transporte coletivo, criou o bilhete único
mensal, projeto tão positivo que foi copiado pelo PSDB para Metrô e CPTM.
Com
o Plano Diretor, o prefeito tenta enfrentar o outro símbolo deste
individualismo paulista, a especulação imobiliária. Em nome do lucro de poucos,
inflou-se o custo dos imóveis a valores verdadeiramente irreais. Qualquer
pessoa de classe média hoje deve entregar os melhores anos de sua vida para ter
um cubículo minúsculo, sem nenhum questionamento sobre isto é certo ou errado,
praticamente por inércia. O Plano de Haddad tenta tirar a liderança do processo
de habitação da cidade das imobiliárias e devolvê-la ao coletivo. Não acho que
vá dar certo, mas pelo menos vale a tentativa.
Há
muito tempo não tínhamos um prefeito cuja prioridade era ser prefeito e cujo
trabalho estivesse acima de interesses pessoais. Para falar apenas sobre os
prefeitos pós-redemocratização, tivemos Jânio, que era um maluco, Erundina,
intransigente, Maluf, com obras faraônicas, voltadas para o individual e
superfaturadas, Pitta, que enterrou SP, Marta, com sua arrogância insuportável,
Serra, que queria ser prefeito para depois ser governador para depois ser presidente
para depois ser rei... e finalmente Kassab e seu autoritarismo.
Haddad
adotou também o primeiro plano humano de melhorar a situação na cracolândia.
Visitou a região, tentou entender o que se passa na vida daquelas pessoas, e
tenta ajudá-los a se reerguer. Deu-lhes casa, um emprego, cidadania. Poucos
lugares divulgaram que 70% das pessoas que fazem parte do projeto pararam de
consumir crack, por mais que esta luta seja diária.
A
questão do crack, aliás, mostra uma das causas da má avaliação da gestão
Haddad: a falta de divulgação. Na era da Publicidade, em que um jingle é mais
importante do que uma ação, as pessoas estão mais preparadas para gostarem
daquilo que dizem que é legal, e não do que vivem. Não vi até hoje uma peça, um
anúncio, nada, mostrando os benefícios do Bilhete Único Mensal, por exemplo.
Parte desta falta de divulgação mostra como o PT abandonou o prefeito à sua
própria sorte após os protestos de 2013. O partido não quis se ligar à pessoa
cujo ato foi o motivador das manifestações que se espalharam ao país. Como já
dito em post anterior, nada é mais simbólico do que o fato de que Geraldo
Alckmin era quem estava ao lado do prefeito no anúncio da revogação do aumento,
e não algum integrante do PT. Pensou-se agora que o partido iria lutar para “limpar”
a imagem de Haddad para a eleição estadual, mas aparentemente se abandonou esta
ideia. O PT, inclusive, já começa a investir na candidatura picareta de Skaf
como forma de derrotar o PSDB.
O
segundo motivo da rejeição à Haddad é o individualismo típico paulistano. E não
apenas da propagandeada “elite branca”, mas de quase todos nós. Dos que sonham
em comprar carro na primeira oportunidade, dos que não se incomodam com o fato
de que boa parte da população não pode comprar seu próprio imóvel, dos que
odeiam as faixas de ônibus vazias enquanto enfrentam o trânsito. A maioria da
população da cidade, de qualquer faixa social e de qualquer ideologia, é
individualista. O fato de que 6 dos 8 prefeitos eleitos democraticamente desde
1985 defendiam o individual (só tiro Erundina e Haddad desta lista) mostra que
este é o interesse que prevalece na maioria da população. Haddad não representa
a maioria, sua eleição foi um acidente momentâneo, como foi a de Erundina. Não
à toa a gestão dela abriu espaço para a vitória de Paulo Maluf quatro anos
depois, com a ex-prefeita caindo no ostracismo. Lembremos sempre que o
vitorioso em 2012 deveria ter sido Celso Russomano e seu discurso em prol do
consumidor. Ganham-se pontos defendo a propriedade privada, nunca se ouve uma
palavra sobre a defesa da propriedade pública. A maioria aqui ainda só quer três
coisas: ter um carro, pegar menos trânsito e morar num condomínio fechado, apenas
isso. Sem contar, claro, com o fato de que 1/3 da população da cidade não
aprovaria uma gestão do PT nem se o prefeito fosse Jesus Cristo. E o mesmo vale
para o 1/3 da população que não aprovaria uma gestão do PSDB nem se ela fosse
liderada pela Virgem Maria.
Haddad
representa ideias novas numa sociedade em que até a chamada “esquerda” é
retrógrada. Suas ações podem melhorar muito a vida na cidade. Está destinado ao fracasso. Depois de Erundina tivemos Maluf e Pitta. Sabe-se lá o que teremos depois dele.
Muito bom, adorei o blog!
ResponderExcluirobrigado Gabriela.
ResponderExcluirCara, que texto incrível.
ResponderExcluirJoão, acha que o cenário para o prefeito deu uma mudada agora?
ResponderExcluirAcho que não muito. É muito difícil hoje imaginar o Haddad sendo reeleito. Com a situação de ódio ao PT que existe em parcela significativa da população de SP, é muito improvável ele obter mais de 50% dos votos. Acho também que a esquerda vai se dividir nessa eleição, com as candidaturas dele, da Erundina e da Marta (embora esta esteja fazendo zilhões de picaretagens de 1 ano para cá, acaba tirando muitos votos do Haddad), isto diminui muito a chance de um dos três ir para o segundo turno contra Russomano ou Dória.
ExcluirAcho ao mesmo tempo, porém, que há mais pessoas entendendo a gestão Haddad hoje do que quando escrevi este texto em 2014 e do que quando escrevi um texto sobre o mesmo assunto em 2015.
Sou otimista. Ainda acho que as pessoas lembram no Russomano como aquela "celebridade", a que luta pelos direitos dos consumidores. Que sabemos ser fantasiosa. O que ele traria de bom em termos de gestão pública sendo que pode se tornar ficha suja em breve? Acredito que a candidatura dele vai se esvaecer, assim como ocorreu no passado.
ExcluirEntão teremos três possíveis candidatos para o segundo turno que foram ex-prefeitos(as) de São Paulo. Esses candidatos têm algo em comum, terem trabalhado por SP sendo parte do mesmo partido. Acredito que de uma certa forma isso ajudará Haddad. Mas quem irá ganhar? PMDB e PT tem muito mais munição (dinheiro) que o PSOL e jogarão com todas as moedas. Acho que ainda não está aparecendo nas pesquisas mas Marta terá uma rejeição por ter a imagem de Petista (para a elite) e de traidora (para os movimentos sociais). Vai ser uma disputa interessante. Façam suas apostas.
Excepcional esse texto
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