quarta-feira, 23 de julho de 2014

Por que Haddad é o melhor prefeito que São Paulo já teve? E por que quase ninguém percebe isso?




           Sim, Fernando Haddad é o melhor prefeito que São Paulo já teve. Ao menos desde os anos 1980. Se você é incapaz de ler um texto com argumentos de quem tem essa opinião, pare agora. A rejeição a ele é para mim um grande mistério, em parte solucionado pelo ódio que parcela da população paulistana sente por qualquer coisa que venha do PT. O que não entendo, porém, é o abandono que o próprio partido fez do prefeito e como parte da militância não consegue enxergar nele as qualidades que até eu, que votei em José Serra há 2 anos, consigo ver.
              Comecemos falando pela única grande falha de Haddad em sua gestão até o momento: O aumento do IPTU. Ainda traumatizado pela confusão decorrida do aumento da passagem de ônibus, Haddad tentou transformar a questão do IPTU numa luta de classes, com o objetivo de atrair a militância com o velho discurso de rico contra pobre. Caiu do cavalo e não conseguiu impor um projeto contrário a qualquer lógica. Um grande erro, mas claramente compensado por muitos acertos.
               O principal deles, a meu ver, é que Haddad é possivelmente o primeiro prefeito desde Erundina a realmente colocar interesses coletivos acima de interesses individuais. Ao espalhar as faixas de ônibus por toda cidade, deixou bem claro que a sua prioridade era o transporte de massas e não o tão amado “Deus-carro”. Nem Erundina teve a coragem que Haddad teve de mexer tanto nesta ferida. Na mesma política de priorizar o transporte coletivo, criou o bilhete único mensal, projeto tão positivo que foi copiado pelo PSDB para Metrô e CPTM.
              Com o Plano Diretor, o prefeito tenta enfrentar o outro símbolo deste individualismo paulista, a especulação imobiliária. Em nome do lucro de poucos, inflou-se o custo dos imóveis a valores verdadeiramente irreais. Qualquer pessoa de classe média hoje deve entregar os melhores anos de sua vida para ter um cubículo minúsculo, sem nenhum questionamento sobre isto é certo ou errado, praticamente por inércia. O Plano de Haddad tenta tirar a liderança do processo de habitação da cidade das imobiliárias e devolvê-la ao coletivo. Não acho que vá dar certo, mas pelo menos vale a tentativa.
                Há muito tempo não tínhamos um prefeito cuja prioridade era ser prefeito e cujo trabalho estivesse acima de interesses pessoais. Para falar apenas sobre os prefeitos pós-redemocratização, tivemos Jânio, que era um maluco, Erundina, intransigente, Maluf, com obras faraônicas, voltadas para o individual e superfaturadas, Pitta, que enterrou SP, Marta, com sua arrogância insuportável, Serra, que queria ser prefeito para depois ser governador para depois ser presidente para depois ser rei... e finalmente Kassab e seu autoritarismo.
                Haddad adotou também o primeiro plano humano de melhorar a situação na cracolândia. Visitou a região, tentou entender o que se passa na vida daquelas pessoas, e tenta ajudá-los a se reerguer. Deu-lhes casa, um emprego, cidadania. Poucos lugares divulgaram que 70% das pessoas que fazem parte do projeto pararam de consumir crack, por mais que esta luta seja diária.
                A questão do crack, aliás, mostra uma das causas da má avaliação da gestão Haddad: a falta de divulgação. Na era da Publicidade, em que um jingle é mais importante do que uma ação, as pessoas estão mais preparadas para gostarem daquilo que dizem que é legal, e não do que vivem. Não vi até hoje uma peça, um anúncio, nada, mostrando os benefícios do Bilhete Único Mensal, por exemplo. Parte desta falta de divulgação mostra como o PT abandonou o prefeito à sua própria sorte após os protestos de 2013. O partido não quis se ligar à pessoa cujo ato foi o motivador das manifestações que se espalharam ao país. Como já dito em post anterior, nada é mais simbólico do que o fato de que Geraldo Alckmin era quem estava ao lado do prefeito no anúncio da revogação do aumento, e não algum integrante do PT. Pensou-se agora que o partido iria lutar para “limpar” a imagem de Haddad para a eleição estadual, mas aparentemente se abandonou esta ideia. O PT, inclusive, já começa a investir na candidatura picareta de Skaf como forma de derrotar o PSDB.
                O segundo motivo da rejeição à Haddad é o individualismo típico paulistano. E não apenas da propagandeada “elite branca”, mas de quase todos nós. Dos que sonham em comprar carro na primeira oportunidade, dos que não se incomodam com o fato de que boa parte da população não pode comprar seu próprio imóvel, dos que odeiam as faixas de ônibus vazias enquanto enfrentam o trânsito. A maioria da população da cidade, de qualquer faixa social e de qualquer ideologia, é individualista. O fato de que 6 dos 8 prefeitos eleitos democraticamente desde 1985 defendiam o individual (só tiro Erundina e Haddad desta lista) mostra que este é o interesse que prevalece na maioria da população. Haddad não representa a maioria, sua eleição foi um acidente momentâneo, como foi a de Erundina. Não à toa a gestão dela abriu espaço para a vitória de Paulo Maluf quatro anos depois, com a ex-prefeita caindo no ostracismo. Lembremos sempre que o vitorioso em 2012 deveria ter sido Celso Russomano e seu discurso em prol do consumidor. Ganham-se pontos defendo a propriedade privada, nunca se ouve uma palavra sobre a defesa da propriedade pública. A maioria aqui ainda só quer três coisas: ter um carro, pegar menos trânsito e morar num condomínio fechado, apenas isso. Sem contar, claro, com o fato de que 1/3 da população da cidade não aprovaria uma gestão do PT nem se o prefeito fosse Jesus Cristo. E o mesmo vale para o 1/3 da população que não aprovaria uma gestão do PSDB nem se ela fosse liderada pela Virgem Maria.
                Haddad representa ideias novas numa sociedade em que até a chamada “esquerda” é retrógrada. Suas ações podem melhorar muito a vida na cidade. Está destinado ao fracasso. Depois de Erundina tivemos Maluf e Pitta. Sabe-se lá o que teremos depois dele.

7 comentários:

  1. João, acha que o cenário para o prefeito deu uma mudada agora?

    ResponderExcluir
    Respostas
    1. Acho que não muito. É muito difícil hoje imaginar o Haddad sendo reeleito. Com a situação de ódio ao PT que existe em parcela significativa da população de SP, é muito improvável ele obter mais de 50% dos votos. Acho também que a esquerda vai se dividir nessa eleição, com as candidaturas dele, da Erundina e da Marta (embora esta esteja fazendo zilhões de picaretagens de 1 ano para cá, acaba tirando muitos votos do Haddad), isto diminui muito a chance de um dos três ir para o segundo turno contra Russomano ou Dória.
      Acho ao mesmo tempo, porém, que há mais pessoas entendendo a gestão Haddad hoje do que quando escrevi este texto em 2014 e do que quando escrevi um texto sobre o mesmo assunto em 2015.

      Excluir
    2. Sou otimista. Ainda acho que as pessoas lembram no Russomano como aquela "celebridade", a que luta pelos direitos dos consumidores. Que sabemos ser fantasiosa. O que ele traria de bom em termos de gestão pública sendo que pode se tornar ficha suja em breve? Acredito que a candidatura dele vai se esvaecer, assim como ocorreu no passado.
      Então teremos três possíveis candidatos para o segundo turno que foram ex-prefeitos(as) de São Paulo. Esses candidatos têm algo em comum, terem trabalhado por SP sendo parte do mesmo partido. Acredito que de uma certa forma isso ajudará Haddad. Mas quem irá ganhar? PMDB e PT tem muito mais munição (dinheiro) que o PSOL e jogarão com todas as moedas. Acho que ainda não está aparecendo nas pesquisas mas Marta terá uma rejeição por ter a imagem de Petista (para a elite) e de traidora (para os movimentos sociais). Vai ser uma disputa interessante. Façam suas apostas.

      Excluir