O período entre
1994-2014 foi possivelmente o momento mais próspero da nossa história. Crescemos,
estabilizamos a economia, combatemos a fome, incluímos milhões nas
universidades, tudo num ambiente democrático. Isto não quer dizer que o período
tenha sido perfeito. Obviamente houve problemas, mas nada que se compare ao que
vivemos agora. Uma das muitas lições que podemos tirar do Horror que vivemos é
que precisamos ser menos puristas. Precisamos entender que discordar de um
governo em um ou outro assunto não é suficiente para desconsiderarmos tudo que
é feito. Quase todos os governos terão acertos e erros. Digo quase todos porque
o atual é a prova de que, se não há governo que só acerte, é possível um
governo que só erre.
Aquele que julgo
o momento mais próspero de nossa história foi fruto da ação de dois partidos:
PT e PSDB. Os dois, mesmo com suas discordâncias, conduziram o processo com
continuidade. O PT manteve a estabilidade conquistada pelo PSDB, o PSDB
participou nos governos estaduais dos programas sociais do PT. As
discordâncias, especialmente sobre a participação do estado na economia,
ficaram em segundo plano até 2014, quando o PSDB cometeu suicídio. Ao não
aceitar a quarta derrota eleitoral consecutiva e embarcar num processo completamente
ilegal de impeachment, o PSDB não percebeu que estava destruindo o sistema que
ele mesmo ajudou a construir. Se o PT se manteve mais vivo do que nunca, o PSDB
perdeu boa parte dos seus eleitores para o bando de maluco que conduziu o
processo de deposição de Dilma. Surgiu um “novo” PSDB, comandado pela figura um
tanto quanto bizarra de João Doria, que conseguiu uma grande vitória no ano do
impeachment, mas o retumbante fiasco do partido em 2018 mostrou que o partido
foi engolido pelo Horror.
O PSDB que participou
da construção do nosso período mais próspero não existe mais. Em seu lugar
surgiu uma coisa que mais parece uma start up desorganizada de jovens metidos a
empreendedores torrando o dinheiro do papai. A disputa prévia entre João Doria
e Eduardo Leite, dois que apoiaram o Horror em 2018, mostra isto. Uma coisa que
precisa ficar clara é que tudo é melhor do que o Horror, até mesmo os apoiados
arrependidos do Horror. As ações de João Doria na pandemia mostram isto.
Enquanto Doria lutou por vacinas, o Horror corria atrás de uma ema com uma
caixa de remédio e ria imitando pessoas sem ar. A existência do Horror criou um
novo tipo de inaceitável. O que antes parecia inaceitável hoje não é mais.
Alckmin
representa o que restou de um antigo PSDB, tão importante na construção do país
até 2014. Entender isto não significa deixar de criticar os erros que ele
cometeu na gestão paulista, muitos menos negar o papel do PSDB no processo que,
a partir de 2015, culminou na chegada do Horror ao poder. Isto significa
entender que tudo mudou. Não há mais espaço para o puritanismo pré-2015. Não há
mais espaço para a exigência da perfeição. O que existe é um Horror que está
destruindo tudo que foi a duras penas construído. Em três anos de Horror, assistimos
a volta do país ao mapa da fome, a volta da inflação, a completa destruição da
imagem do país no exterior. Vimos o Bolsa-Família, projeto pensado pelo PSDB e
expandido pelo PT, o mais bem-sucedido programa de transferência da nossa
história, ser substituído por um programa provisório com data para acabar, a
eleição de 2022.
Se a eleição de
2018 foi a eleição da destruição, onde o Horror e seus apoiadores convenceram a
maioria da população de que a solução era “acabar com tudo isto daí”, a eleição
de 2022 tem que ser a eleição da construção. E nada melhor do que uma chapa
representando os dois polos de construção de nossa história recente para
enfrentar o Horror. Hora de dar as mãos. Que a chapa Lula-Alckmin dê certo.
Precisaremos agregar o máximo possível no processo de reconstrução. Isto não
signifique esquecer o que foi vivido. No dia que o Horror sair do poder, é
preciso tem mente de que ele não acabou e que a nossa vida será marcada pela
luta contra ele. A História será fundamental para que ensinemos a nossos filhos
como o Horror seduz e o que Ele é capaz de fazer para chegar e se manter no
poder. E como mesmo pessoas que amamos são capazes das piores coisas possíveis.
E que como na luta contra o Horror não há espaço para puritanismos. O mundo
pré-2014 permitia que PT e (o que sobrou) do PSDB se tratassem como
adversários. Este mundo não existe mais. O debate agora não é mais Estado x
iniciativa privada. É civilização x barbárie.