Um fenômeno tipicamente brasileiro é
o voto de pessoas instruídas na extrema-direita. O Brasil é um dos únicos
lugares do mundo em que a probabilidade de uma pessoa votar em candidatos
fascistas aumenta de acordo com o seu grau de escolaridade. Digo um dos únicos
porque a mesma coisa aconteceu na última eleição presidencial chilena. Talvez
isto seja um fenômeno latino-americano, mas temos que esperar.
Mais do que um instrumento de
inclusão, a educação sempre foi vista no Brasil como um meio de diferenciação.
Aquele que se instrui se acha melhor do que o que não teve instrução, e a
sociedade faz tudo para confirmar este sentimento. Prisão especial para quem tem ensino superior, liberação do serviço militar, entre outras coisas. Mais do que tudo, uma parte
significativa das pessoas que busca o ensino superior procura esta
diferenciação.
A formidável inclusão de pessoas em
cursos superiores nos governos Lula e Dilma não foi completada por formação
política. Uma boa parte das pessoas que alcançou cursos superiores neste período,
principalmente aqueles que entraram em universidades privadas, não enxerga esta
conquista como fruto de uma luta política, mas sim como fruto de uma conquista
pessoal. Algo do tipo “eu me matei de trabalhar, paguei o curso, o mérito é todo
meu”. Para estas pessoas, o diploma só faz algum sentido se vier seguido por
aumento salarial e emprego melhor. Como em MUITAS situações isto não veio, o
novo diplomado se sentiu frustrado, encontrando no fascismo a válvula de escape
para esta frustração.
Há também, claro, a rejeição daqueles
que já frequentavam universidades e que perderam sua exclusividade. Pessoas que odeiam as cotas sociais. Nada
frustra mais pessoas acostumadas com a exclusividade do que perdê-la. Vejamos o exemplo dos aeroportos, o rancor que a nossa elite teve em ter que dividir o avião com pessoas que ela acha que deveriam pegar ônibus. São
pessoas que estão amando este novo mundo em que um moleque de bicicleta faz as
suas compras no mercado por 10 reais, por exemplo. Pessoas que acham que vale a pena votar num maníaco psicopata porque ele vai privatizar a Eletrobrás. Pessoas ruins que de certa forma usam a educação para chamar a sua crueldade de racionalidade.
Poucas coisas sofrem mais com
discurso vazio do que a educação. Às vezes mesmo pessoas claramente bem intencionadas, como
Tábata Amaral, se perdem ao achar que o simples investimento em educação basta, ou que acreditam que a função da educação seja a formação de lideranças. Uma visão individualista.
Mais do que investir em educação, é preciso mudar o conceito de educação. Por anos, inclusive durante os governos
petistas, a educação brasileira seguiu a lógica de que sua função era
simplesmente formar mão-de-obra qualificada para o mercado. As últimas décadas foram marcadas
pela desvalorização das ciências humanas. Não à toa o programa Ciências sem Fronteiras
não contemplou ciências humanas. O Brasil não se interessou em enviar filósofos
ou sociólogos para estudarem fora, apenas engenheiros. Educação sem formação
política e sem formação para a cidadania não forma uma sociedade melhor. Pelo contrário. O Brasil que gerou Bolsonaro é a prova disso. Dilma Rousseff era inclusive contrária à inclusão de filosofia e sociologia na
grade curricular das escolas. Foi impedida de realizar estas retiradas pelo PT,
cabendo a Temer realizar a tarefa.
Ainda não ficou totalmente claro qual o caminho
que o novo governo petista seguirá na área educacional, se o PT entende os erros que cometeu nesta área. Erros estes, para deixar claro, que são menores do que os enormes acertos. Por enquanto, a área
está sob comando do PT-CE, governo mais bem-sucedido na área educacional nas
últimas décadas e onde a experiência fascista dos últimos cinco anos não
vingou. Uma esperança.
A experiência de destruição do tecido
social vivida com a Lava-Jato e com Bolsonaro deveria nos levar a uma forte
reflexão e reconstrução de toda a sociedade. Um processo semelhante à desnazificação
alemã. E este processo pela educação. Mas não pela educação que tínhamos e que
de certa forma estimulou o fascismo. Um novo tipo de educação, que forme
cidadãos e que pense na sociedade como um todo.