terça-feira, 11 de abril de 2023

Angústia

 


Este blog funciona para mim como uma espécie de terapia. Clarice Lispector (e juro que foi ela mesmo quem disse) certa vez disse que palavras devem ser ditas ou escritas, senão elas te devoram. Os últimos anos foram muito angustiantes para mim e este blog me ajudou muito. A nova etapa da angústia e distopia brasileira parece ser a onda de ataques a escolas. Não há nada que indique que isto não vá virar uma epidemia, principalmente porque o país escolheu tratar este problema da pior forma possível, que é considerar estes ataques resultado de pura e simples maldade individual. Ela está lá, sem dúvida. Mas há algo mais acontecendo.

Torcida organizada. Igreja evangélica. Bolsonarismo. Todos estão em busca de uma noção de pertencimento. Um grupo do qual você faça parte e sinta que há algo acontecendo. Pode ser torcer para um time. Pode ser rezar para um suposto senhor que mora no céu e vê tudo que você faz. Pode ser se vestir de verde-e-amarelo e sair pelas ruas berrando todo tipo de barbaridade. A verdade é que um grupo de jovens encontrou nesta loucura nas escolas um grupo de pertencimento. Eles estão em redes sociais sendo incentivados a praticar estes atos absurdos e enxergam na realização dos mesmos uma chance de fazer algo que dê algum sentido a uma vida insignificante. Encontram na mais pura maldade uma voz. Palavras devem ser ditas ou escritas, senão elas te devoram. Ninguém quer ouvi-los. Ninguém quer lê-los. Eles estão sendo devorados. E resolveram levar outros juntos.

O Brasil se tornou uma cópia tosca dos EUA. A impressão que tenho é que tudo de mais tosco que existe lá está vindo para cá. Mais do que isto, somos incapazes de olhar os exemplos de lá e entender como agir por aqui. Todo mundo sabia que estes lunáticos bolsonaristas invadiriam o Congresso em algum momento. Nada foi feito. Agora é a hora de importar o que há de pior por lá, estes massacres em escolas. Duas lições de lá: Pena de morte não adianta. O Texas, estado com maior número de massacres nesta década, tem pena de morte. Não apenas isto, a maior parte das pessoas que praticam estes ataques se suicidam ou tentam se suicidar após fazê-los. Eles enxergam a morte como uma libertação. Os massacres são um último grito, algo para tornar a própria morte algo grandioso. Algo do tipo “morri, mas trouxe outros juntos”. Não li muitos detalhes sobre os ataques recentes em escolas brasileiras. Para um pai de um filho de um ano é uma tortura ver isto acontecendo. Mas acho bem provável que o suicídio estivesse nos planos dos que praticaram os ataques, talvez eles tenham sido capturados antes. Ameaçar de matar pessoas que tocaram o foda-se a tal ponto para a vida não é um bom plano. A segunda lição: armar a população (professores neste caso) não vai dar certo. Numa sociedade doente como a nossa, deixar uma pessoa armada numa sala de aula é pedir para mais merdas acontecerem.

Trocentas são as causas deste tipo de tragédia. É como a queda de um avião. Óbvio que há o componente maldade. Mas há também o componente exclusão. O componente silêncio. O componente competição, que cria uma sociedade de perdedores. Há principalmente o componente ódio, tão estimulado pelo grupo político que nos governou entre 2018 e 2022. E teremos que achar um jeito de lidar com isto. Normalizamos a barbárie diariamente. Com este tipo de barbárie ainda não estamos normalizados. Espero que não copiemos também isto dos EUA, mas acredito que copiaremos. A pandemia tirou a minha capacidade de achar que podemos resolver as coisas coletivamente. É cada um por si. Até a hora em que a tragédia bater na porta de casa. Seja tomando o tiro. Seja puxando o gatilho.