Tinha 17 anos quando assisti a
uma partida de Roger Federer pela primeira vez. Ainda estava na onda de Gustavo
Kuerten quando o jovem e desconhecido suíço enfrentou o heptacampeão Pete
Sampras em Wimbledon 2001. Já havia apenas ouvido falar dele e só comecei a
assistir ao jogo com mais atenção quando Federer ganhou o primeiro set. Três horas
depois, Sampras era derrotado pela primeira vez em Wimbledon desde 1996 e o
tênis tinha sua nova estrela ascendente, com apenas 20 anos de idade.
No
ano seguinte, Federer já estava no top 10 e em 2003 venceu seu primeiro Grand
Slam, também em Wimbledon. Ao vencer o Aberto da Austrália em 2004, assumiu a
primeira posição do ranking e estava claro para todos que acompanhavam o
esporte que ele ficaria por lá muito tempo. Ele era MUITO melhor do que TODOS que
estavam no circuito. Assisti-lo jogar era um prazer. Elegante, ele tinha uma
facilidade absurda para jogar tênis. Não acredito que ninguém tenha como
vocação dar raquetadas em bolinhas amarelas, mas Federer é a prova de que este
meu argumento é furado. Ele realmente nasceu com o dom para fazer isso. Todos
os seus golpes eram perfeitos, sacava, voleava, de fundo de quadra, tudo. Até
eu que tenho certa tendência a torcer sempre pelo pior, me encantei em ver
alguém tão bom e que dominaria um esporte por tanto tempo. Era o substituto de
Michael Jordan como ícone do esporte mundial.
No
mesmo ano, Federer chegaria invicto ao quinto torneio do ano, o Masters de
Miami, onde enfrentaria na primeira rodada um adolescente espanhol que ninguém
sabia direito quem era. Seu nome era Rafael Nadal e seu estilo de jogo era
totalmente contrário ao de Federer. Desengonçado, ele sacava mal, era incapaz
de ir a rede, seu jogo era físico, correria para chegar em todas as bolas,
golpes feios (que me desculpem os fãs de Nadal, mas nada é mais chato do que
vê-lo jogar a bola para o alto e sair correndo). Sua única vantagem era ser
canhoto. Por aquilo que julguei como um acidente de percurso, Nadal venceu o suíço
naquele dia com certa facilidade. A surpresa foi grande para todos, mas creio
que ninguém levou aquele jogo muito a sério.
Nadal
só reapareceria em um grande jogo um ano depois, chegando na final do mesmo
torneio de Miami contra o mesmo Roger Federer. Para minha surpresa, Nadal
ganhou os 2 primeiros sets e estava a caminho de vencer novamente o suíço. Como
alguém com um jogo tão “feio” pode bater o “artista” de novo, pensei eu?
Federer virou, e na minha cabeça tinha descoberto uma forma de bater aquele
espanhol atrevido. Após este torneio, começou a temporada de saibro e Nadal
explodiu. Ganhou todos os jogos que fez no saibro, incluindo uma semifinal de
Roland Garros contra Roger Federer e começaria o domínio assombroso que dura
praticamente até hoje. De lá para cá foram 9 títulos em Roland Garros em 10
torneios disputados.
Já
assumindo que Nadal, apesar se seu estilo pouco vistoso, poderia destronar
Federer no saibro, piso que não é o favorito do suíço, eu julgava impossível
que o espanhol pudesse ameaçar o número 1 do mundo e meu tenista predileto em
todos os tempos em qualquer outro piso. Tenistas de saibro normalmente não
conseguiam nada muito significativo em outros pisos, que o diga meu ídolo de
adolescência Gustavo Kuerten. O saibro era como uma “temporada a parte” no
tênis, em minha cabeça seriam 3 meses por ano em que sofreria ao ver Federer
tendo dificuldades para bater Nadal na terra, e um completo passeio do suíço no
restante da temporada. Foi assim em 2005, mas em 2006 Nadal já conseguiu chegar
à sua primeira final de Wimbledon. O meu esforço em desmerecer o adversário do
meu ídolo me impediu de enxergar a grande qualidade do espanhol: a
persistência. Nadal era (e é) capaz de se esforçar como ninguém e trabalhou
muito para aprender a jogar na grama. Para minha alegria, Federer ganhou com
certa facilidade aquela final, vencendo novamente em 2007, mas dessa vez numa
batalha de 5 sets. Aquilo já me preocupava, pois era notório que o jogo “feio”
de Nadal incomodava cada vez mais Federer. Os jogos estavam cada vez mais
fáceis para Nadal no saibro e mais difíceis para Federer na grama, por mais que
torcedores de Federer, como eu, não enxergassem o óbvio.
Em
2008, 1 mês após massacrar Federer de forma humilhante em Roland Garros, os
dois repetiriam a final em Wimbledon, naquele que muitos consideram o maior
jogo de todos os tempos. Após um dia inteiro, interrupções e 5 sets, Nadal
venceria Federer no “território do suíço”. Senti uma tristeza muito grande, mas
ainda não entendia que Nadal poderia ser melhor do que ele. A certeza viria só
no começo de 2009. Os dois se enfrentariam novamente na final do Aberto da
Austrália e mais uma vez a vitória foi de Nadal. Na cerimônia de premiação,
Federer chorou. Para mim, ele teve a mesma sensação que eu tive aquele dia. Ele
era o mais talentoso, mas não era o melhor. O outro o tinha superado, com base
na persistência e na força mental.
Daquele
dia para cá, Federer e Nadal ganharam outro rival, o sérvio Novak Djokovic,
que, embora multi campeão, nunca chegou no patamar dos dois. Mas sem dúvida compõe
com eles o trio responsável pela “era de ouro” do tênis masculino. O nível de
jogo dos três é tão superior a tudo que já foi visto que o grande risco do
tênis é ficar chato para os fãs quando eles pararem.
Voltando
à rivalidade apenas entre Federer e Nadal, vamos analisar por números:
1) Federer
tem 17 Grand Slams contra 14 de Nadal;
2) Federer
tem 302 semanas como número um do mundo, contra 141 de Nadal;
3) Federer
tem 84 títulos no total contra 65 de Nadal;
4) Nadal
tem 24 vitórias contra 10 de Federer no confronto direto;
5) Nadal
tem 27 títulos em Masters 1000 contra 23 de Federer
Nadal é 6 anos mais novo do que o suíço,
mas se machuca muito. Mesmo assim, vejo uma grande probabilidade de que ele
passe Federer em todos os números acima, exceto em semanas como número 1.
Hoje Federer é o grande campeão da história.
E Nadal é o cara que ganha dele. Essa é a conclusão simples que tiro 11 anos
depois daquele primeiro jogo em Miami e que tanto dói para um fã de Federer
como eu. É inacreditável que alguém tenha se esforçado tanto que conseguiu ser
melhor do que o tenista mais talentoso. Por mais que meu lado torcedor e fã do
tênis bem jogado sofra e lute contra, isto é fato. A partir daquele jogo de
2009, finalmente enxerguei que torço para alguém pior numa rivalidade. Como
torcer pelo Palmeiras contra o Corinthians. Mas não faz mal.
Se você é federista como eu, renda-se.
Ou assuma o paradoxo. Federer é o melhor de todos os tempos. Mas Nadal é melhor
do que ele.