Em
1960, o carrasco nazista Adolf Eichmann foi capturado por forças israelenses em
Buenos Aires e levado secretamente para ser julgado por seus crimes de guerra
em Jerusalém. Dois anos depois, num julgamento – espetáculo, seria condenado à
morte e menos de um ano depois a filosofa alemã e judia Hannah Arendt lançaria
um dos mais importantes ensaios sobre o Holocausto, Eichmann em Jerusalém.
No
livro, ela surpreende ao apresentar o monstro nazista como um cidadão comum,
incapaz de refletir sobre seus atos. Alguém que simplesmente cumpria suas
ordens, um burocrata incapaz de discernir sobre o que é certo e o que é errado.
Mais do que isso, ela nos faz pensar como a maioria das pessoas que conhecemos agiria
da mesma forma que Eichmann, como somos treinados a aceitar o argumento “alguém
me mandou fazer” como sendo algo superior a qualquer tipo de moral que
tenhamos. A isso ela chama de Banalidade do Mal, à incapacidade do cidadão
comum de refletir sobre o que está fazendo.
Esta banalidade, a meu ver, anda lado a lado com o aumento do individualismo
em nossa sociedade. As pessoas se tornam progressivamente incapazes de enxergar
a existência do outro, sendo também incapazes de sentir aquilo que não as impacta
diretamente. Certo e errado são termos que são simplesmente adequados às
necessidades de satisfação individual, por mais bocós que estas sejam. “Pagar
as contas”, “ter uma grana” ou simplesmente consumir algo se tornaram os principais e quase que exclusivos motores
de quase todos, que são estimuladas a passar por cima de quaisquer obstáculos para
cumprir estas duas metas.
Numa
sociedade tomada por estes dois conceitos, poder e riqueza são as duas coisas
mais desejadas. Somos todos manipulados com o sonho de um dia chegar no ápice. Para isto, nada é mais importante do que o exemplo de quem conseguiu. Para cada Neymar existem 1.000 que não deram certo, mas apenas o "sucesso" é comentado. Este topo não é medido pela sua importância para a sociedade, mas pela
quantidade de dinheiro e subalternos acumulados. Quem atinge este auge é
invejado e vira formador de opinião. Não à toa as revistas brasileiras trazem
muito mais vezes na capa o Roberto Justus do que, sei lá, os médicos da
alegria. Experiências de vida e solidariedade não interessam...
Vejo
meu facebook e noto o número de palestras de autoajuda que são postadas. Todas
elas se baseiam em estímulo ao ego. Você pode ser melhor, você vai conseguir,
se você lutar você conseguirá. Quase nenhuma se baseia em qualquer tipo de
conquista coletiva. Não conseguimos ter noção de como somos ainda mais
supérfluos nos empolgando com este tipo de coisa.
Muito
se discutirá neste ano eleitoral sobre como nossos políticos são ruins, sobre
como eles não valorizam o que há de melhor no povo brasileiro. Eu acho o
contrário, eles são a cara dos eleitores que os colocaram lá, invidualistas e
malvados. Nada mais justo do que pessoas que têm TV a cabo ilegal, compram
carteiras de motorista, estacionem em local proibido e passam por cima de
colegas de trabalho sejam representadas por políticos corruptos. O maior
problema não são eles... Somos nós. Os Eichamanns.
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