Córdoba
– Herrera – Perea – Mendoza – Pérez – Rincón – Gomez – Alvarez – Valderrama –
Asprilla – Valencia. Quando o técnico Francisco Maturana escalou este time para
enfrentar a Argentina em Buenos Aires pela última rodada das eliminatórias de
1993, dificilmente ele poderia esperar o que ocorreria nesta partida, e o que
viria depois. A Argentina chegava àquele jogo como finalista das duas últimas
copas, campeã em 1986 e vice em 1990 e havia passado 3 anos invicta, até a
derrota por 2 x 1 para a mesma Colômbia no primeiro turno daquela mesma
Eliminatória. Creio que todos sabem que aquele jogo terminou 5 x 0 para a
Colômbia, com a torcida argentina aplaudindo os jogadores colombianos. Quando
lembro deste time, adicionando 2 jogadores que não estavam nesta partida, o
folclórico René Higuita e o mártir Andrés Escobar, tenho mais ou menos a
sensação que pessoas 10 anos mais velhas do que eu têm quando lembram do Brasil
de 1982.
Esta
equipe começou a ser formada nos anos 80 e seus resultados têm forte ligação
com o boom da cocaína nos EUA no final dos anos 70 e 80. Foi daí que surgiu o
dinheiro para que o narcotráfico investisse no futebol e formasse dois grandes
times no país, o América de Cali e o Nacional de Medellin, cada um representando
o cartel de drogas da cidade. Quase todos os jogadores da seleção de 1994
começaram nestes dois times e tinham forte relação de amizade com os
traficantes dessas cidades. Fanáticos por futebol, eles investiam fortunas nas
equipes, buscando reconhecimento e apoio da população local. E quando digo
fortuna, falo de muito, mas muito dinheiro. Pablo Escobar, “dono” do Nacional
de Medellin, era uma das 10 pessoas mais ricas do mundo nos anos 80.
Do ponto de
vista clubístico, a ascensão colombiana começou já em meados dos anos 80, com o
América de Cali sendo vice-campeão da Libertadores em 1985, 1986 e 1987 e com o
Nacional sendo campeão deste mesmo torneio em 1989. Neste mesmo ano, a seleção
conseguiu se classificar para a Copa do Mundo pela primeira vez desde 1962,
arrancando em 1990 um empate heroico da futura campeã Alemanha, num golaço de
Freddy Rincón. No jogo seguinte, contra Camarões, aparecia aquela que era, para
mim, a mais importante e charmosa característica dessa geração colombiana: a
irresponsabilidade. O goleiro René Higuita estava no meio de campo com a bola e
tentou driblar o atacante camaronês Roger Milla, na prorrogação ! Isso mesmo,
um goleiro tentando driblar um atacante numa prorrogação de jogo eliminatório
em Copa do Mundo ! O gol dos africanos que se seguiu a essa jogada selou o fim
da aventura colombiana naquela Copa, mas apenas o início do destaque no cenário
internacional.
Após a vitória
contra a Argentina em 1993, a imprensa mundial começou a colocar a Colômbia
como grande favorita para a Copa de 1994. O país, porém, passava por grandes
turbulências. No começo dos anos 1990, o governo americano instituiu uma
política de combate à produção da cocaína, forçando o governo colombiano a
iniciar uma verdadeira caçada aos traficantes do país, que culminou com uma
quase guerra civil e com a morte de Pablo Escobar em 1993. O futebol do país
perdeu boa parte do seu investimento, uma vez que agora os traficantes tinham
que investir seus recursos em outras alçadas. Mais do que isso, os jogadores
perderam a sua paz. Com o dinheiro da droga se tornando mais escasso, os
traficantes viam na venda de atletas para times europeus uma chance de
recuperar as perdas no tráfico de drogas. Ameaças para que estes jogassem bem
se tornaram frequentes e a equipe chegou à Copa nos EUA com todo o peso de um
país nas costas. A prisão de Higuita, um pouco antes da Copa, é um reflexo
disso. Ele brigou com um traficante que armou um sequestro que caiu na culpa do
goleiro, que passou mais de 1 ano preso injustamente. É importante lembrar que,
apesar do sucesso nos anos 80, os clubes colombianos não aceitavam negociar
seus jogadores com a Europa. Isso começou a acontecer apenas com a crise do
narcotráfico nos anos 90.
No primeiro
jogo da Copa, um choque. Derrota para a sleção da Romênia por 3 x 1. Quase
todos os jogadores colombianos sofreram ameaças de morte de seus “donos” antes
da partida contra os EUA. Neste jogo, o famoso gol contra de Andrés Escobar,
uma nova derrota por 2 x 1 e a eliminação precoce da competição. Creio que
todos lembram também o que veio depois: Uma semana após voltar pra Colômbia, o
zagueiro Escobar foi assassinado em condições até hoje esquisitas, todos os
jogadores ameaçaram deixar a seleção e o país virou uma vergonha mundial.
Aquela geração
ainda disputaria mais uma Copa, em 1998, mas sem dúvida o gol contra e o
assassinato de Escobar marcaram o fim trágico de uma geração brilhante. Sem o
dinheiro abundante do narcotráfico, o futebol colombiano deixou de revelar
jogadores e só voltou a se classificar para a copa agora em 2014. Aquele time
tinha tudo: a genialidade de Valderrama e Rincón, a rebeldia de Asprilla, a
loucura de Higuita, e ganhou um mártir, símbolo do sofrimento, que foi Andrés
Escobar. É um enredo perfeito para um filme, daqueles com final triste.
Para quem se
interessa pelo assunto, a ESPN fez um documentário sensacional sobre o tema,
chamado “Two Escobars”, comparando a trajetória do traficante Pablo Escobar e
do zagueiro Andrés Escobar. Emocionante.
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