segunda-feira, 19 de outubro de 2015

O vício em sexo e o silêncio



Nossa sociedade é viciada em sexo. Nenhum vício é tão usado para dominar e alienar quanto este vício. Nenhum produto vende tanto. A publicidade que nos ronda deixa bem claro que não há felicidade possível sem uma boa vida sexual. Queira fazer sexo, sempre. Isto funciona principalmente para o sexo masculino. Toda propaganda mostra o macho alfa como exemplo. É o cara rico e gostosão comprando o carro fodão e ganhando em troca o sorriso de uma mulher gostosona. É o cara nem tão rico e nem tão gostosão ganhando o sorriso de uma mulher gostosona. Você só será feliz trepando, para isso, compre. Passamos mais tempo pensando em sexo do que em qualquer outro assunto.
O macho alfa nunca fracassa. Portanto, nunca broxa. Muita gente acha que a vida só vale a pena se nele houver sexo. Muita gente é estimulada a isso. Não há vida sem sucesso. Não há vida sem sexo. Como um viciado em cocaína disposto a tudo para atender o seu vício, estamos dispostos a tudo para conseguir uma ereção. Mesmo que isto arrisque nossa saúde.
Em 1998 surgiu o Viagra, remédio com grande eficácia no combate a disfunção erétil. Nos 3 anos seguintes, a Pfizer lucrou mais de US$ 1 bilhão de dólares com a venda deste produto. No Brasil, a venda deste produto e de similares hoje chega a 30 milhões de unidades por ano. Poucos produtos são tão lucrativos, afinal, nenhum é tão bem sucedido em explorar o nosso vício sexual quanto este. O principal efeito colateral deste remédio é o aumento do risco de ataque cardíaco e de AVC. Qual a frequência com que isto acontece? Não sabemos.
O jogador de basquete Lamar Odom foi internado esta semana após o uso excessivo de um produto similar ao Viagra durante uma orgia num prostíbulo nos EUA. Nada é mais sintomático do que um viciado em sexo estar disposto a pagar pessoas para que tenham relações sexuais com ele. Mais do que isso, ele precisava garantir a ereção, para isto tomou doses de Viagra. Está quase morrendo. Alguns sites noticiaram que foi por uso de Viagra, outros não.
Por que há um silêncio e uma falta de pesquisas sobre o número de pessoas vítimas deste tipo de medicamentos? Por que não temos nenhuma pesquisa séria sobre este assunto? Por que órgãos de imprensa não noticiaram que o ataque foi fruto de uso de medicamentos contra impotência? A resposta, a meu ver, é financeira.
Sexo vende e um produto que permite que o sexo aconteça tem um potencial financeiro gigantesco. Empresas farmacêuticas gastam milhões em publicidade e estão entre as maiores financiadoras das empresas de comunicação. Sexo é vida, repete-se sempre. Pode-se até noticiar que você deve procurar um médico, mas não se noticia se alguém morre por este assunto. Isto prejudicaria vendas. Por isso, não há números nem um rosto famoso que seja reconhecidamente vítima deste medicamento. Odom é o primeiro famoso que eu lembre, mas o assunto está sendo abafado. O que causou seu problema já não recebe a atenção que recebe a visita que recebeu no hospital de uma ex-namorada, da família Kardashian (não sei se escrevi certo). Provavelmente quando o assunto for tratado futuramente, Odom será objeto de piadas e não de conscientização.
Sexo é um vício e todo vício é uma forma de opressão. Todo viciado é um dominado, tanto pelo produto quanto pela pessoa que o fornece. Somos uma sociedade com um vício que não é debatido, pelo contrário, é estimulado, pois assim somos mais alienados e facilmente comandados. Passamos boa parte do tempo tratando do assunto sexo e em como necessariamente uma boa vida sexual significa felicidade. Muitos que recorrem a estes medicamentos não sabem os riscos que estão correndo, uma vez que o assunto não é tratado da forma como deveria por interesses do capital. Outros recorrem a estes produtos mesmo sabendo os riscos que estão correndo. No primeiro caso, há simples ignorância estimulada pela má fé de um sistema que coloca a exploração de um vício acima de qualquer outra coisa. No segundo caso, a questão é mais perigosa. Há pessoas dispostas a morrer para saciar seus desejos sexuais. Neste caso, o problema real e não discutido não está na falta de ereção. Está no fato de que muitos acreditam que a vida e tudo que ela oferece só vale a pena se houver sexo. Há uma inversão séria de valores. Invisível, não debatida, explorada e, acima de tudo, lucrativa. 

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