quarta-feira, 11 de novembro de 2015

Nizan Guanaes e o fracasso do empresariado nacional



Nizan Guanaes possui uma coluna na Folha de São Paulo. Quem acompanha o blog sabe que ela já foi assunto num texto anterior. Esta coluna é baseada em textos otimistas e autobajuladores, típicos de um publicitário. Guanaes usa técnicas de venda e não há nenhum espaço para reflexão. Sua última coluna é essa http://www1.folha.uol.com.br/colunas/nizanguanaes/2015/11/1704220-atacar-os-problemas.shtml#_=_ e o autor tenta apresentar o capitalismo como salvação para os problemas nacionais, assumindo o empresariado o papel de salvador e o governo o papel de vilão neste teatro inventado.
O empresariado brasileiro é, em geral, incompetente. Digo em geral porque é óbvio que neste mar de mediocridade que impera em nosso empresariado há pessoas capazes. Mas, em geral, é composto por pessoas incompetentes. Neste texto farei esta generalização tendo isto em mente.
 O principal motivo, a meu ver, do mau estado de boa parte das empresas nacionais não está no governo e sim na má gestão delas. Nosso empresariado é individualista, mimado, arrogante e completamente incapaz de realizar qualquer tipo de autocrítica. Mais do que isto, tenta inventar falácias intelectuais em que seus interesses de classe se tornam interesses nacionais, devendo ser defendidos mesmo por aqueles que não fazem parte da mesma camada social. Guanaes, por exemplo, ataca as nossas leis trabalhistas, “enraizadas nos anos 30, que dificultam a criação de empregos”. Na linguagem do autor, a principal função do empresário é criar empregos e esta é a hipocrisia empresarial que mais me incomoda. A principal meta do empresário é ganhar dinheiro e não há nada de errado nisso. O erro está em vender a ideia de que a finalidade é criar empregos, quando na verdade é o lucro. Se uma pessoa como Guanaes puder trocar 10 empregados por uma máquina para manter seu bônus anual o fará, sem pensar nas consequências.
Um exemplo claro da má gestão das empresas brasileiras é o estados das companhias aéreas. Nossas passagens são caras e o serviço costuma ser muito ruim, mas mesmo assim os aviões estão quase sempre lotados. Elas recebem milhões em incentivos governamentais e, mesmo assim, estão quase quebradas. Outro exemplo é nossa indústria automobilística. Nossas cidades têm um trânsito infernal e mesmo assim esta indústria recebia milhões em subsídios para entupir ainda mais nossas capitais de veículos. Este lucro irreal ia em boa parte para os bônus dos gestores destas companhias que, a partir do momento em que deixaram de receber estes subsídios, passaram a demitir. Não há pensamento no longo prazo, o que se quer é garantir o bônus do final de ano.
Guanaes e o empresariado adotam uma retórica que eu já critiquei em um texto anterior, que é a de que o trabalhador deve ser grato ao patrão que lhe dá a chance de trabalhar, conceito que existe, a meu ver, como resquício do período de escravidão. A frase mais forte do texto de Guanaes, a meu ver, é “Quem constrói uma empresa constrói empregos e riqueza. Quem constrói uma empresa constrói um país.” Guanaes está errado. A única coisa capaz de gerar riqueza é o trabalho, sendo o trabalhador responsável pela geração da própria riqueza e de um adicional que será repassado ao seu patrão. Sendo assim, a riqueza do trabalhador é fruto do seu próprio esforço, enquanto a riqueza do patrão é resultado do esforço de outras pessoas. A lógica seria que o patrão tivesse gratidão pelo trabalhador, e não o inverso. Mas a lógica está corrompida, em parte pelo trabalho de fraude intelectual cometido pelo empresariado e comprado por um grande número de trabalhadores oprimidos que sonham em assumir o papel de opressores.
Nosso empresariado, especialmente os que compõem este grupo e são da minha geração, possui pouca cultura. São pessoas com poucas experiências de vida, formadas principalmente em viagens inúteis sustentadas pelos pais na juventude e em cursos de MBA pouco produtivos. São acostumados apenas à bajulação e não entendem que é no confronto de ideias que está a raiz para o conhecimento. Não querem aprender nada, querem apenas ensinar, mesmo não tendo muito o que dizer. Tente um dia ter uma conversa com um pouco mais de conteúdo com um deles e você verá o que acontece.
Este grupo é incapaz de realizar qualquer tipo de autocrítica e encontrou no governo o bode expiatório perfeito para todas as suas desgraças. A culpa nunca é sua, é sempre de alguém, este é o lema. Vejo CEOs de empresas bancadas pelo BNDES e que têm estatais como grandes clientes pregando um liberalismo em que o governo deve apenas dar subsídios, sem cobrar impostos. Nunca veremos, por exemplo, uma pessoa como Guanaes criticando os gastos milionários da Petrobrás em publicidade e questionando qual o sentido de uma estatal monopolista gastar tanta verba nisso.
O plano para transformar o governo em inimigo e o empresariado em salvação está dando certo. Vejo cada vez mais pessoas de classe média usando o adesivo de um pato amarelo e dizendo que não aguentam mais pagar impostos. Vejo estas mesmas pessoas financiando apartamentos minúsculos usando um banco estatal e sendo maltratadas diariamente por um chefe arrogante, mas mesmo assim acham que a salvação do país está neste e não naquele. 
A valorização do individualismo e da meritocracia faz parte deste processo de idolatria ao empresariado. Você deve supervalorizar qualquer conquista medíocre obtida e se sentir uma pessoa especial por qualquer motivo. A meritocracia nos ensina que temos o que merecemos, que quem tem mais merece mais e quem tem menos merece menos. Assim sendo, o empresário é rico porquê "merece" e tudo é fruto apenas de um esforço pessoal, não tendo importância alguma tudo o que veio antes de nós. Mas duvido que muitos empresários tenham estudado sociologia. Mais uma inversão da lógica, uma vez que numa sociedade capitalista a sua importância está na quantidade de dinheiro que você faz girar, e não na sua importância. Ou alguém discute que qualquer professor tem uma importância social muito maior do que um publicitário como Guanaes? A meritocracia faria sentido se estivesse relacionada à importância social da pessoa, mas não está.
A crise brasileira é uma crise de modelo. A ideia de que o bem-estar está unicamente ligado ao consumo deveria ser questionada. Discutimos muito o PIB e quase nada o IDH. Mas não é o que acha Guanaes. Ele acha que precisamos de mais capitalismo. O exemplo grego em seu texto mostra que para ele só há uma solução para esta crise. Aprofundá-la. Assusta-me o número de pessoas que concordam com isso. 
No mês passado a agência África de Guanaes se envolveu numa polêmica. Uma foto de toda sua equipe mostrava apenas pessoas brancas e muitos questionaram o fato de uma empresa com este nome só ter funcionários brancos. Guanaes e o empresariado brasileiro querem ensinar o país a melhorar. Deveriam começar olhando um pouco para as próprias empresas.

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