sexta-feira, 20 de março de 2015

Federer é o melhor de todos os tempos. Mas Nadal é melhor do que ele.



Tinha 17 anos quando assisti a uma partida de Roger Federer pela primeira vez. Ainda estava na onda de Gustavo Kuerten quando o jovem e desconhecido suíço enfrentou o heptacampeão Pete Sampras em Wimbledon 2001. Já havia apenas ouvido falar dele e só comecei a assistir ao jogo com mais atenção quando Federer ganhou o primeiro set. Três horas depois, Sampras era derrotado pela primeira vez em Wimbledon desde 1996 e o tênis tinha sua nova estrela ascendente, com apenas 20 anos de idade.
                No ano seguinte, Federer já estava no top 10 e em 2003 venceu seu primeiro Grand Slam, também em Wimbledon. Ao vencer o Aberto da Austrália em 2004, assumiu a primeira posição do ranking e estava claro para todos que acompanhavam o esporte que ele ficaria por lá muito tempo. Ele era MUITO melhor do que TODOS que estavam no circuito. Assisti-lo jogar era um prazer. Elegante, ele tinha uma facilidade absurda para jogar tênis. Não acredito que ninguém tenha como vocação dar raquetadas em bolinhas amarelas, mas Federer é a prova de que este meu argumento é furado. Ele realmente nasceu com o dom para fazer isso. Todos os seus golpes eram perfeitos, sacava, voleava, de fundo de quadra, tudo. Até eu que tenho certa tendência a torcer sempre pelo pior, me encantei em ver alguém tão bom e que dominaria um esporte por tanto tempo. Era o substituto de Michael Jordan como ícone do esporte mundial.
                No mesmo ano, Federer chegaria invicto ao quinto torneio do ano, o Masters de Miami, onde enfrentaria na primeira rodada um adolescente espanhol que ninguém sabia direito quem era. Seu nome era Rafael Nadal e seu estilo de jogo era totalmente contrário ao de Federer. Desengonçado, ele sacava mal, era incapaz de ir a rede, seu jogo era físico, correria para chegar em todas as bolas, golpes feios (que me desculpem os fãs de Nadal, mas nada é mais chato do que vê-lo jogar a bola para o alto e sair correndo). Sua única vantagem era ser canhoto. Por aquilo que julguei como um acidente de percurso, Nadal venceu o suíço naquele dia com certa facilidade. A surpresa foi grande para todos, mas creio que ninguém levou aquele jogo muito a sério.
                Nadal só reapareceria em um grande jogo um ano depois, chegando na final do mesmo torneio de Miami contra o mesmo Roger Federer. Para minha surpresa, Nadal ganhou os 2 primeiros sets e estava a caminho de vencer novamente o suíço. Como alguém com um jogo tão “feio” pode bater o “artista” de novo, pensei eu? Federer virou, e na minha cabeça tinha descoberto uma forma de bater aquele espanhol atrevido. Após este torneio, começou a temporada de saibro e Nadal explodiu. Ganhou todos os jogos que fez no saibro, incluindo uma semifinal de Roland Garros contra Roger Federer e começaria o domínio assombroso que dura praticamente até hoje. De lá para cá foram 9 títulos em Roland Garros em 10 torneios disputados.
                Já assumindo que Nadal, apesar se seu estilo pouco vistoso, poderia destronar Federer no saibro, piso que não é o favorito do suíço, eu julgava impossível que o espanhol pudesse ameaçar o número 1 do mundo e meu tenista predileto em todos os tempos em qualquer outro piso. Tenistas de saibro normalmente não conseguiam nada muito significativo em outros pisos, que o diga meu ídolo de adolescência Gustavo Kuerten. O saibro era como uma “temporada a parte” no tênis, em minha cabeça seriam 3 meses por ano em que sofreria ao ver Federer tendo dificuldades para bater Nadal na terra, e um completo passeio do suíço no restante da temporada. Foi assim em 2005, mas em 2006 Nadal já conseguiu chegar à sua primeira final de Wimbledon. O meu esforço em desmerecer o adversário do meu ídolo me impediu de enxergar a grande qualidade do espanhol: a persistência. Nadal era (e é) capaz de se esforçar como ninguém e trabalhou muito para aprender a jogar na grama. Para minha alegria, Federer ganhou com certa facilidade aquela final, vencendo novamente em 2007, mas dessa vez numa batalha de 5 sets. Aquilo já me preocupava, pois era notório que o jogo “feio” de Nadal incomodava cada vez mais Federer. Os jogos estavam cada vez mais fáceis para Nadal no saibro e mais difíceis para Federer na grama, por mais que torcedores de Federer, como eu, não enxergassem o óbvio.
                Em 2008, 1 mês após massacrar Federer de forma humilhante em Roland Garros, os dois repetiriam a final em Wimbledon, naquele que muitos consideram o maior jogo de todos os tempos. Após um dia inteiro, interrupções e 5 sets, Nadal venceria Federer no “território do suíço”. Senti uma tristeza muito grande, mas ainda não entendia que Nadal poderia ser melhor do que ele. A certeza viria só no começo de 2009. Os dois se enfrentariam novamente na final do Aberto da Austrália e mais uma vez a vitória foi de Nadal. Na cerimônia de premiação, Federer chorou. Para mim, ele teve a mesma sensação que eu tive aquele dia. Ele era o mais talentoso, mas não era o melhor. O outro o tinha superado, com base na persistência e na força mental.
                Daquele dia para cá, Federer e Nadal ganharam outro rival, o sérvio Novak Djokovic, que, embora multi campeão, nunca chegou no patamar dos dois. Mas sem dúvida compõe com eles o trio responsável pela “era de ouro” do tênis masculino. O nível de jogo dos três é tão superior a tudo que já foi visto que o grande risco do tênis é ficar chato para os fãs quando eles pararem.
                Voltando à rivalidade apenas entre Federer e Nadal, vamos analisar por números:
1)      Federer tem 17 Grand Slams contra 14 de Nadal;
2)      Federer tem 302 semanas como número um do mundo, contra 141 de Nadal;
3)      Federer tem 84 títulos no total contra 65 de Nadal;
4)      Nadal tem 24 vitórias contra 10 de Federer no confronto direto;
5)      Nadal tem 27 títulos em Masters 1000 contra 23 de Federer

Nadal é 6 anos mais novo do que o suíço, mas se machuca muito. Mesmo assim, vejo uma grande probabilidade de que ele passe Federer em todos os números acima, exceto em semanas como número 1.
Hoje Federer é o grande campeão da história. E Nadal é o cara que ganha dele. Essa é a conclusão simples que tiro 11 anos depois daquele primeiro jogo em Miami e que tanto dói para um fã de Federer como eu. É inacreditável que alguém tenha se esforçado tanto que conseguiu ser melhor do que o tenista mais talentoso. Por mais que meu lado torcedor e fã do tênis bem jogado sofra e lute contra, isto é fato. A partir daquele jogo de 2009, finalmente enxerguei que torço para alguém pior numa rivalidade. Como torcer pelo Palmeiras contra o Corinthians. Mas não faz mal.
Se você é federista como eu, renda-se. Ou assuma o paradoxo. Federer é o melhor de todos os tempos. Mas Nadal é melhor do que ele.

2 comentários:

  1. Obrigado pelo texto! Excelente! Gostaria de vê-lo em sites de grande acesso. Digno de palmas.

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