terça-feira, 28 de novembro de 2017

Os não-candidatos, a não-notícia e o futuro da democracia


“O Brasil usou LSD e o efeito não passa”. Li essa frase em algum momento durante o processo de hipnose coletiva que culminou com o golpe parlamentar que derrubou Dilma Rousseff. Procurei, mas não encontrei de quem é a citação com que começo este texto. Desde já peço desculpas por este erro. Nesta verdadeira “era do alucinógeno”, tivemos em dois dias a “notícia” e a repercussão de “notícia” que, a meu ver, conseguiram superar qualquer obra possível de ficção. Nem a mente mais criativa poderia chegar a isso, a um momento em que a "notícia" da semana seria uma não-notícia.
A “notícia” é: “Luciano Huck anuncia que não será candidato à presidência”. O uso de aspas para o termo “notícia” é porque tenho dúvidas reais se isto é uma notícia. Huck nunca anunciou que seria candidato. Podemos chamar então esta “notícia” de não-notícia, sem aspas. A não-notícia de Huck foi capa do principal jornal da principal cidade do país. O texto, escrito pelo próprio não-candidato (ou que ao menos assinou a matéria, sabe-se lá se ele a escreveu mesmo), baseia-se basicamente no egocentrismo. O não-candidato da vez passa o texto todo se elogiando.  Começa o não-anúncio com uma introdução sobre a Odisséia de Homero de três parágrafos que não tem relação nenhuma com o restante do texto, basicamente pra tentar mostrar que já leu esse livro, sabe-se lá o porquê. No restante, começa a mostrar tudo que enxerga como sendo as suas qualidades. O não-candidato é, segundo o texto que ele diz ter escrito, curioso, apaixonado, corajoso, andarilho, gente boa, intuitivo e obcecado. Se ele escreve tudo isto em um texto em que se declara não-candidato, fico imaginando como ele se descreveria num texto em que se declarasse candidato. Ao final, o não-candidato diz que quer “continuar” contribuindo com o Brasil, sem explicar muito bem como contribuiu até agora. Explorando o fetiche adolescente com personagens que transformam mulheres em objetos? Invadindo terrenos públicos para criar uma espécie de quintal para sua mansão na praia? Explorando o assistencialismo televisivo? Servindo de papagaio de pirata para celebridades estrangeiras?
A não-notícia aconteceu na segunda-feira. Na sexta-feira anterior, a terceira revista semanal de maior circulação trazia na capa o mesmo não-candidato. Chamava sua ascensão de “meteórica” e dizia que mesmo não sendo candidato, o não-candidato já havia mudado o eixo do debate. O lado curioso dessa mudança de eixo que a revista apregoa é que as pesquisas antes e depois da cogitação da candidatura do não-candidato apresentavam os mesmíssimos números. Antes, Lula liderava com Bolsonaro e Marina empatados em segundo. Hoje, Lula lidera com Bolsonaro e Marina empatados em segundo. Um dia depois de anunciar a não-candidatura, o não-candidato foi entrevistado com pompa pela revista semanal de maior circulação. A não-notícia segue sendo a “notícia” da semana.
Há quase um ano, o não-candidato daquele momento era o publicitário Roberto Justus. Desesperados com o fato de que a eleição do ano que vem pode destruir o “projeto” que chegou ao poder com ascensão de Temer através de um golpe parlamentar, a elite e o mercado se esforçam para criar um candidato que mantenha as reformas impopulares do atual governo golpista e, mais do que isto, que consiga a legitimidade das urnas que este governo não tem. Após a vitória de um apresentador do Aprendiz na eleição americana e de um apresentador do mesmo reality show na eleição para prefeitura paulistana, o nome de Justus animou o mercado. A leitura é que a população está disposta a comprar um político que se apresente como mudança e nada melhor para o mercado financeiro que esta “mudança” venha com alguém homem, branco, de elite e disposto a manter tudo que o atual governo tem feito. O não-candidato de janeiro anunciou a sua não candidatura no mesmo jornal que o não-candidato de novembro. Sua não-candidatura, porém, não teve a enorme repercussão da não-candidatura atual, talvez porque agora o desespero seja maior. A carta daquele não-candidato é, aliás, bem parecida com a do atual não-candidato, com exceção do começo bizarro com a Odisseia da carta atual. Muito egocentrismo, autoelogios e finalizando com a ideia de que ele vai “continuar ajudando o Brasil”. Após anunciar a sua não candidatura, o não-candidato de janeiro começou a preparação para a apresentação do reality show a Fazenda, da Record, que traz como principal atração o participante que foi afastado do programa da concorrente Globo por assédio sexual. Seria esta a ajuda?

Entre as duas não candidaturas televisivas, houve ainda a não-candidatura do prefeito de São Paulo, João Doria Jr., que ainda sonha em ser candidato. O mercado se animou inicialmente com esta não-candidatura, mas a péssima gestão do prefeito e sua queda de popularidade esfriaram os ânimos. Enquanto caça novos não-candidatos midiáticos que talvez queiram ser candidatos, preocupa-me a possibilidade do mercado cansar de fingir que liga para a democracia. Começou, por exemplo, a pipocar notícias sobre um possível impacto que a eleição de Lula teria sobre o câmbio, tática que não foi bem-sucedida em 2002. O candidato fascista Jair Bolsonaro já começa a buscar uma aproximação com nomes do mercado, tentando preencher o espaço dos não-candidatos. Historicamente, o mercado já deu demonstrações de que não se opõe a figuras deste tipo. A mesma revista que na sexta disse que o não-candidato Huck havia “mudado tudo” com sua não-candidatura tem uma versão de “Negócios”. A capa dessa semana fala sobre uma economia em “franca recuperação” e sobre como o “populismo eleitoral de 2018 pode acabar com essa recuperação”. Até onde o mercado está disposto a ir para segurar as reformas de Temer ainda é incerto, mas já é claro que é uma turma que não tem nenhum apego à democracia. Qual o plano B?

quinta-feira, 23 de novembro de 2017

A assustadora liderança do fascismo entre os que têm curso superior


Bolsonaro lidera entre as pessoas com curso superior. Ele possui 25% das intenções de  voto entre estes. Obcecada pela liderança de Lula, a grande mídia deixa passar em branco aquela que é a informação mais importante que as atuais pesquisas eleitorais mostram sobre a sociedade brasileira. Entre as pessoas mais “instruídas”, lidera um candidato fascista e cujo grande lema é o incentivo à violência. O objetivo deste texto é tentar entender como a educação superior forma tantos bolsonetes.
Os últimos governos brasileiros, e isto inclui a gestão Lula, que sem dúvida foi o período de maior investimento no social em nossa história, sempre enxergaram o sistema superior mais como um formador de mão-de-obra do que como um formador de cidadãos. A universidade é vista por muitos mais como um curso técnico do que como um lugar que estimule a reflexão e o debate sobre a sociedade. Nas duas últimas décadas, vivemos um verdadeiro boom na criação de vagas de cursos como administração, publicidade e marketing, por exemplo, que, com todo respeito aos profissionais da área, são mais voltados para pessoas que querem simplesmente um diploma para ganhar um salário maior do que para qualquer outra coisa. No mesmo período, passamos por um processo de destruição dos cursos de ciências humanas, cada vez menos importantes para uma sociedade interessada quase que exclusivamente com a formação de “mão-de-obra qualificada”. Isto explica, a meu ver, porque o Programa Ciências sem Fronteiras, destruído pelo governo golpista, não oferecia vagas a estudantes de humanas. O interesse governamental era fornecer a experiência de viver fora para profissionais de engenharia, que são vistos como aqueles que “construirão um novo Brasil”, mas não para um estudante de história.
A expansão do ensino superior no Brasil, portanto, foi feita seguindo uma lógica de mercado e individualista. Focou-se na ideia de que o diploma universitário serve basicamente para fornecer mão-de-obra mais qualificada para o mercado e não na formação de cidadãos pensantes. Estimulou-se o individualismo.
A lógica do ensino superior no Brasil foi corrompida pela lógica do consumo e os governos compraram esta ideia. A faculdade passou a ser um produto consumido, com celebridades fazendo propagandas de cursos como se estivessem vendendo carros. Estas propagandas sempre tentam expor como é mais fácil conseguir um emprego depois de terminar o curso de administração de empresas com foco em marketing e novos negócios da Universidade Tabajara. Melhor emprego é igual a mais consumo. Consuma nosso curso para consumir mais no futuro, esta é lógica. Educação como investimento monetário.
O Brasil é um país dividido em castas. A faculdade, como tudo num país criado tendo como base a ideia de senhor-escravo, é vista como um trunfo social. Nada é mais simbólico disso do que a prisão especial para pessoas com diplomas. Isto não é um “incentivo” para o estudo e sim uma forma que a elite encontrou de, na época em que só ela era capaz de entrar no ensino superior, manter seus privilégios até quando pisasse na bola. O período de explosão do número de vagas em universidades seguindo uma lógica de mercado foi também um período de explosão na criação de cursos de MBA. A elite, incapaz de manter sua posição usando apenas o diploma como argumento, criou a necessidade de outro tipo de curso para gestores, extremamente caros, e em que nada se aprende de fato. Basicamente gente bem-vestida comprando um diferencial. Os empresários do setor educacional agradecem.
Assim, a expansão do ensino superior feita seguindo a lógica de mercado estimulou a criação de uma geração de formados individualista, que só vê propósito na educação como meio de alcançar um melhor emprego, para assim consumir mais e fazer parte de uma casta de privilegiados. O sonho de boa parte dos diplomados é fazer parte desta casta. Não à toa, o termo utilizado para pessoas que fazem faculdade é “nível superior”. A linguagem utilizada diz tudo. O objetivo deste texto não é dizer que esta expansão foi toda ruim. É óbvio que há méritos gigantescos neste processo. O grande problema, a meu ver, é a lógica que ela seguiu.
A recessão econômica a partir de 2015, fez com que um grande número de pessoas destas da qual o texto fala perdessem o emprego ou desenvolvessem um grande medo de perdê-lo. Como a única função do diploma universitário nesta lógica é a obtenção de um emprego que pague mais e permita consumir mais, este diploma perdeu a função. É muito fácil para este trabalhador diplomado sentir que ele perdeu tudo que conquistou. Ao obter um diploma, esperava-se exclusivamente consumo e status social, coisas que desapareceram com a crise.
Entre pessoas diplomadas, portanto, encontram-se as características típicas de um eleitor de Bolsonaro. Individualismo, medo, rancor, arrogância e ódio. A universidade da forma como é vista hoje, em geral, nada faz para combater esta ideia. Se Paulo Freire criou o termo “educação libertadora”, o Brasil, ao invés de investir no que pregava um dos educadores mais premiados do mundo, criou a seu jeito uma “educação comercial”, em que quanto mais a pessoa estuda, mais ela se torna consumista e com pensamentos elitistas.

O Brasil paga o preço pelo descaso histórico em relação aos cursos de ciências humanas. As pessoas, em geral, não sabem o que foi o fascismo, por isso não se importam em serem chamadas de fascista quando apoiam um candidato como Bolsonaro. Ele liderar entre pessoas com diploma superior é grave. Ninguém estar disposto a falar disso é tão grave quanto.

quinta-feira, 16 de novembro de 2017

Ives Gandra Martins e a luta da elite pela manutenção de privilégios


“Não sou nem negro, nem homossexual, nem índio, nem assaltante, nem guerrilheiro, nem invasor de terras. Como faço para viver no Brasil nos dias atuais?”. É assim que Ives Gandra Martins, importante jurista, começa sua deprimente coluna divulgada nesta semana pelo jornal cearense O Povo. O texto foi escrito em 2013, quando a onda de ódio que tomaria conta do Brasil, levando a um golpe de Estado e ao surgimento de movimentos de extrema-direita como o MBL estava apenas no começo, mas a coluna de Gandra ajuda a entender bem o ódio que boa parte da elite em relação aos avanços sociais vividos no Brasil nos últimos anos e como esta elite usou o artifício da corrupção, da qual sempre se beneficiou, para seduzir uma parcela alienada da classe média e destruir os projetos e garantias sociais obtidos historicamente com muita luta.
Ives Gandra Martins é da Opus Dei. Advogado, pôde pagar as melhores escolas para seu filhinho, Ives Gandra Martins Filho, que hoje é presidente do Tribunal Superior do Trabalho. É muito comum no Poder Judiciário, aliás, ver pai “doutor” gerando filho “doutor”. Isto não incomoda os Gandra. A versão Filho deu declarações defendendo a Reforma Trabalhista, utilizando o argumento favorito dos empresários sedentos por maior margem de lucro: “A flexibilização criará empregos”. Converse a sós com algum empresário e veja se ele tem realmente algum interesse em criar emprego. Funcionário é visto como custo. Deu também declarações contra a legalização do casamento entre homossexuais e, para se ter uma ideia do grau de reacionarismo do magistrado, já se disse contra o fato do divórcio ser legalizado. Também já disse que a mulher deve ser submissa ao marido e, como o pai, é  membro da Opus Dei. Quem o nomeou para o cargo de ministro do TST foi FHC, o que mostra que o PSDB já flerta com o reacionarismo desde então. Gandra Filho, aliás, esteve muito perto de chegar ao Supremo durante a gestão Temer, seu nome era um dos favoritos na indicação que foi para Alexandre de Moraes. É o próximo da lista. Pense num cara destes no Supremo por quase trinta anos. Falta pouco.
O irmão de Gandra Martins Pai é João Carlos Martins, hoje maestro e famoso por suas interpretações de Bach ao piano. O maestro era dono de uma empresa chamada Pau Brasil, fechada nos anos 2000 sob acusação de realizar operações financeiras irregulares para as candidaturas de Paulo Maluf nos anos 1990. Martins chegou a ser condenado à prisão pelas falcatruas nas campanhas malufistas, mas teve a pena trocada por prestações de serviço. Nada como ser irmão e tio de gente importante.
A elite brasileira adora ter privilégios e é capaz de tudo para mantê-los. Mais do que os erros, foram os acertos da gestão petista que fizeram com que essa elite a odiasse. A corrupção nunca os incomodou. Eles odeiam mesmo são as cotas e qualquer medida que vise diminuir as desigualdades das quais famílias como a dos Gandra Martins são as grandes beneficiadas. Em sua coluna, Gandra pai tenta se colocar como “vítima” de um sistema do qual é o grande beneficiado, que permite que a riqueza e o status sejam hereditários e em que a corrupção de seu grupo não seja punida. Se existir um Gandras Neto, deve estar em alguma escola particular para milionários se preparando para entrar em direito no Largo São Francisco. Não à toa, esta elite nem finge mais se incomodar com a corrupção praticada pelo governo Temer. O que eles queriam mesmo era redução dos programas sociais e combate ao aparato de proteção ao trabalhador. Conseguiram. Ainda precisam da Reforma da Previdência, que este governo não parece capaz de entregar. Num futuro próximo, provavelmente o alvo será o programa de cotas raciais nas universidades federais. O argumento da vez possivelmente será “meritocracia”. Famílias ricas adoram este termo. Depois será o Bolsa-Família. "Dê a vara ao invés do peixe", adoram dizer aqueles cujos filhos estão destinados a serem "doutores" desde o nascimento.
Não há no Brasil nada mais elitista do que o Poder Judiciário. Não à toa, este Poder teve participação tão fundamental no processo político que resultou na ascensão de Temer à Presidência. Não à toa lutam tanto para manter seus privilégios. No último depoimento de Lula ao grande ídolo desta elite que comandou o golpe de Estado e lucra com suas consequências, o juiz Sérgio Moro, este deu uma bronca no ex-presidente quando aquele se referiu a uma promotora como “querida”, e não “doutora”. A tal “doutora”, porém, não tinha doutorado. A elite se regozijou de alegria ao ver o juiz moralista colocar o ex-torneiro mecânico em seu “devido lugar”. Eles querem continuar sendo tratados como “doutores”. O golpe não foi contra a corrupção. Ela está aí, ocorrendo quase normalmente. Foi para manter privilégios. Os golpistas estão sendo bem sucedidos, enquanto os patos que berravam hoje silenciam. A classe média que sustentou o golpe sonha em ser como os Martins e aceita passivelmente ser submissa a eles. O oprimido que sonha em ser opressor. Os Martins agradecem.

segunda-feira, 13 de novembro de 2017

Os 50 melhores dos 50 anos da Era Aberta no tênis


Em 2018, o tênis celebra os 50 anos da “Era Aberta”. Até 1968, apenas jogadores amadores podiam disputar os torneios de Grand Slams que, por esta razão, estavam quase sempre desfalcados das principais estrelas. Imaginar atualmente que os principais torneios não tinham os melhores tenistas parece loucura, mas esta era a realidade há meio século. A pressão da televisão, interessada em ter os melhores jogando nos eventos que começavam a receber transmissões ao vivo, e o medo de ver seus principais torneios ruírem com a concorrência de outras competições que premiavam financeiramente os jogadores fizeram a ITF tomar a decisão de permitir a entrada dos profissionais em seus torneios. Em homenagem ao aniversário de 50 anos desta mudança, fiz uma lista daqueles que eu considero os 50 melhores tenistas deste período, sem distinção de gênero. Lembro que a lista trata apenas da Era Aberta, por isso Maria Bueno, a melhor tenista brasileira de todos os tempos, não está presente.

1)      Steffi Graf (ALE)
2)      Serena Williams (EUA)
3)      Rod Laver (AUS)
4)      Martina Navratilova (TCH / EUA)
5)      Roger Federer (SUI)
6)      Billie Jean King (EUA)
7)      Rafael Nadal (ESP)
8)      Bjorn Borg (SUE)
9)      Novak Djokovic (SER)
10)   Monica Seles (IUG / EUA)
11)   Pete Sampras (EUA)
12)   Chris Evert (EUA)
13)   Jimmy Connors (EUA)
14)   Ken Rosewall (AUS)
15)   Margareth Court (AUS)
16)   Andre Agassi (EUA)
17)   Ivan Lendl (TCH / EUA)
18)   John McEnroe (EUA)
19)   Evone Goolagong (AUS)
20)   Martina Hingis (SUI)
21)   John Newcombe (AUS)
22)   Stefan Edberg (SUE)
23)   Justine Henin (BEL)
24)   Andy Murray (GBR)
25)   Boris Becker (ALE)
26)   Mats Wilander (SUE)
27)   Venus Williams (EUA)
28)   Maria Sharapova (RUS)
29)   Guillermo Villas (ARG)
30)   Arthur Ashe (EUA)
31)   Manuel Orantes (ESP)
32)   Hana Mandlikova (TCH)
33)   Lleyton Hewitt (AUS)
34)   Ilie Nastase (ROM)
35)   Jennifer Capriati (EUA)
36)   Jim Courier (EUA)
37)   Michael Chang (EUA)
38)   Lindsay Davenport (EUA)
39)   Gustavo Kuerten (BRA)
40)   Kim Clijsters (BEL)
41)   Marat Safin (RUS)
42)   Virginia Wade (GBR)
43)  Stanislaw Wawinka (SUI)
44)   Mary Pierce (FRA)
45)   Patrick Rafter (AUS)
46)   Amelie Mauresmo (FRA)
47)   Jana Novotna (TCH)
48)   Yevgeny Kafelnikov (RUS)
49)   Arantxa Sanchez (ESP)
50)   Andy Roddick (EUA)




quarta-feira, 8 de novembro de 2017

A mídia e o racismo


William Waack foi afastado do Jornal da Globo após o vazamento de um vídeo em que ele aparece cometendo um ato racista. Waack foi nos últimos anos, junto com Alexandre Garcia, o mais influente jornalista de pautas direitistas da maior emissora do país. Possuía em seu telejornal liberdade editorial quase completa para opinar e foi uma das vozes mais fortes do movimento que chamo de paranoia antipetista, formado por jornalistas que basearam suas opiniões na defesa do que chamam de livre mercado e na crítica a programas sociais dos governos petistas, especialmente o Bolsa Família e as cotas raciais. Segundo Alexandre Garcia, aliás, em um editorial do Bom Dia Brasil, o governo petista era responsável pelo surgimento do racismo no Brasil ao adotar a política de cotas nas universidades. Talvez o comportamento do seu agora quase ex-coleguinha Waack o prove do contrário.
Não é a primeira vez que algo deste tipo acontece na grande mídia brasileira, mas nunca havia envolvido alguém com o poder de influência de Waack. Boris Casoy foi filmado num intervalo fazendo chacota de um grupo de garis que sonhava em comprar um celular. Como uma representação da elite que não se conformava com o acesso a novos produtos que pessoas de origem humilde estavam obtendo na era Lula, Casoy gargalhava e humilhava profissionais que realizam um trabalho fundamental para o nosso dia-a-dia. Pediu desculpas no ar e não recebeu nenhuma punição da Bandeirantes. Hoje está na Rede TV. Rachel Sheerazade, ícone da extrema-direita lunática, causou polêmica ao defender o linchamento de um jovem contraventor que havia sido amarrado numa árvore. Como “punição” do SBT, foi proibida de opinar no telejornal e recebeu um contrato da maior emissora de rádio de São Paulo para dar exatamente o tipo de opinião que gerou a polêmica. O mesmo SBT, aliás, contratou Marcão do Povo, demitido da Record após usar xingamentos racistas contra uma cantora de funk. Talvez o SBT seja o mesmo destino de William Waack, pois aparentemente Silvio Santos aprova este tipo de comportamento entre seus jornalistas.
A punição a Waack mostra que nossa sociedade ao menos está evoluindo um pouco quanto a este assunto. Não há mais espaço para racismo explícito na maior emissora do país e a postura da Globo mostra ao menos que ela sentiu necessidade de agir dessa forma. Isto é importante, mas muito ainda deve ser feito, especialmente para criar alguma diversidade nas redações. Praticamente todos os apresentadores de telejornais, seja nas TVs abertas ou fechadas, são brancos. São eles que decidem a forma como as informações chegam aos telespectadores. Não há nenhum espaço para debates, há basicamente pessoas brancas expondo paranoias e moralismos de classe média, sem nenhum questionamento real sobre nossas desigualdades e desafios, incentivando uma alienação cada vez maior entre seus telespectadores. Uma reportagem sobre aumento de gasolina ou atraso em aeroportos tem mais destaque e tempo do que uma matéria sobre miséria ou combate à desigualdade. O Brasil real segue invisível na grande mídia. A maior parcela da população segue com pouquíssima representação em emissoras que, afinal, são concessões públicas e, portanto, devem satisfação por sua programação à sociedade.

A mídia tem uma responsabilidade gigantesca neste grande movimento de falso moralismo, ódio e paranoia que gerou o impeachment de Dilma e que agora evoluiu para uma assustadora onda de extrema-direita que persegue artistas e professores. A grande mídia claramente não se mostra preocupada ou interessada em fazer alguma autocrítica sobre seu papel em todo momento caótico que o Brasil vive. Não vimos e creio que não veremos nenhuma investigação sobre gastos de estatais, algumas com monopólio, em publicidade nestes grandes meios, ou no silêncio de todos para as grandes obras olímpicas no Rio enquanto elas eram construídas. O afastamento de Waack, porém, mostra que em todo este caos trágico que vivemos, houve alguma evolução social. Ao menos vivemos num período em que a emissora sente necessidade de dar alguma satisfação a seu público quando algo deste tipo acontece. Diferentemente do que houve com Casoy, há pouco tempo. Que figuras racistas como Waack desapareçam. E que levem seus falsos moralismos, preconceitos e paranoias juntos. Mas que fique claro que seu afastamento é apenas um pequeno passo. Uma pequena e simbólica vitória num período trágico de derrotas para todos que defendem uma sociedade mais igual e sem preconceitos.

segunda-feira, 6 de novembro de 2017

A nova aposta do mercado


O “deus-mercado” está cansando de brincar de democracia no Brasil. Irritado com a insistência de boa parcela da população em votar no presidente que lhes deu alguma dignidade e incapaz de reverter a psicopatia social que explica a ascensão de Jair Bolsonaro, prepara-se para sua mais arriscada e sagaz ação. A criação de um fantoche.
Articula-se com cada vez mais força no meio empresarial a candidatura do apresentador Luciano Huck à presidência, possivelmente com o banqueiro Henrique Meirelles no cargo de vice. Alçado à fama nos anos 90, graças ao lançamento de personagens femininos interpretados por mulheres seminuas, o mercado espera que Huck consiga fazer com Meirelles algo semelhante ao que conseguiu fazer com Tiazinha e Feiticeira. O deleite que a possibilidade de Meirelles chegar ao poder causa entre os “empreendedores e gestores” do mercado financeiro é semelhante ao deleite que Tiazinha provocava em adolescentes espinhudos de vinte anos atrás. O problema é que Meirelles não tem voto. Quase nenhum. Para chegar lá, precisaria de um fantoche qualquer, e nada melhor do que um apresentador egocêntrico, capaz de obter os votos que este mercado tanto precisa na classe mais baixa graças a seu programa de TV com quadros assistencialistas, voltados para enaltecer a grandeza do apresentador rico que distribui uma migalha qualquer para um pobre telespectador, que responde com aquele olhar grato que membros da elite adoram receber quando doam, por exemplo, roupas velhas para a família da empregada doméstica.
Huck até o momento deu algumas entrevistas sobre o assunto, em que se mostra totalmente preparado para o cargo de fantoche de Meirelles e do mercado. Destacam-se aquelas em que diz que “não importa se foi golpe ou não”, mostrando o enorme desrespeito que possui por análises históricas (afinal, no mundinho da meritocracia pouco importam as desigualdades atuais decorrentes de processos históricos) e, a mais marcante a meu ver, em que diz que está na hora da sua geração chegar ao poder. Huck é homem, branco, rico, nascido em família rica, mais acima de 45 anos, quase um cinquentão. Homens, brancos, ricos, nascido em famílias ricas, acima de 45 anos são basicamente a definição de poder. Olhe para a gestão de qualquer empresa e é basicamente isto que você encontrará. Chamam de novo o que há de mais velho.
O mercado ainda precisa fingir que liga para a democracia e para regras. A aparência importa mais que a essência. Por isso aplaudem as reformas feitas por um presidente sem voto, argumentando que elas são legítimas porque Temer estava na chapa da eleita Dilma, mesmo que esteja fazendo o contrário de tudo o que a chapa eleita havia prometido. Conta no seu joguinho com o Poder Judiciário, composto basicamente por homens, brancos, nascido em famílias ricas, acima de 45 anos. Cria-se um suposto cenário de combate à corrupção, extremamente seletivo, que condena Lula sem provas, absolve Aécio e Temer com provas e esquece voluntariamente de Meirelles, ex-presidente do Conselho de Administração da J&F, dona da JBS, durante todo o período de roubalheira. No Brasil atual, é a “democracia” quem deve se adequar às vontades do mercado, e não o inverso.
Parece cada vez mais necessário que o Poder Judiciário cumpra seu papel e tire Lula da disputa. A condenação sem provas do ex-presidente gerou euforia no mercado, queda do dólar e recorde na Bovespa. Nunca se viu relação entre Mercado e Poder Judiciário tão gritante como neste dia. Para legitimar uma eleição sem o líder das pesquisas, entra a grande mídia, comandada basicamente por homens, brancos, ricos, nascidos em famílias ricas, acima de 45 anos. Repetem-se informações não verificadas como se fossem verdades. Lembremos da “chocante” delação de Delcídio Amaral, tratada como verdade absoluta há um ano e anulada por falta de provas. Revistas semanais de “informação” trouxeram nas últimas semanas imagens de Lula o chamando de “extrema-esquerda”, estimulando paranoias anticomunistas típicas de Guerra Fria, mesmo que seu governo tenha passado muito longe disso e que seu presidente do Banco Central tenha sido Meirelles, homem que sonham em ver conduzindo a nação. Criam uma falsa comparação com o psicopata da extrema-direita e propõem o surgimento mágico de um candidato do que chamam de “centro”, aquela região mágica em que há discernimento e não há conflito. Veja propõe, olhe só, a chapa Huck-Meirelles, para alegria do mercado.

Cem anos após a Revolução Russa e seu lema “proletários do mundo, uni-vos”, a elite brasileira, que comanda o tripé mercado, mídia e Justiça, cria quase um lema “homens, brancos, ricos, nascidos em família rica e acima de 45 anos, uni-vos”. A turma que sempre esteve no Poder quer continuar lá, sem dividi-lo com ninguém. Para isto, é fundamental que encontrem alguém cuja aparência seja capaz de enganar quem não faz parte deste seleto grupo com a ideia de ausência de conflitos sociais. Doria fracassou e Huck aparece como fantoche da vez. Uh, Tiazinha !