Bolsonaro lidera entre as pessoas
com curso superior. Ele possui 25% das intenções de voto entre estes. Obcecada pela liderança de
Lula, a grande mídia deixa passar em branco aquela que é a informação mais
importante que as atuais pesquisas eleitorais mostram sobre a sociedade
brasileira. Entre as pessoas mais “instruídas”, lidera um candidato fascista e
cujo grande lema é o incentivo à violência. O objetivo deste texto é tentar
entender como a educação superior forma tantos bolsonetes.
Os últimos governos brasileiros,
e isto inclui a gestão Lula, que sem dúvida foi o período de maior investimento
no social em nossa história, sempre enxergaram o sistema superior mais como um
formador de mão-de-obra do que como um formador de cidadãos. A universidade é
vista por muitos mais como um curso técnico do que como um lugar que estimule a
reflexão e o debate sobre a sociedade. Nas duas últimas décadas, vivemos um
verdadeiro boom na criação de vagas de cursos como administração, publicidade e
marketing, por exemplo, que, com todo respeito aos profissionais da área, são
mais voltados para pessoas que querem simplesmente um diploma para ganhar um
salário maior do que para qualquer outra coisa. No mesmo período, passamos por
um processo de destruição dos cursos de ciências humanas, cada vez menos
importantes para uma sociedade interessada quase que exclusivamente com a
formação de “mão-de-obra qualificada”. Isto explica, a meu ver, porque o
Programa Ciências sem Fronteiras, destruído pelo governo golpista, não oferecia
vagas a estudantes de humanas. O interesse governamental era fornecer a
experiência de viver fora para profissionais de engenharia, que são vistos como
aqueles que “construirão um novo Brasil”, mas não para um estudante de
história.
A expansão do ensino superior no
Brasil, portanto, foi feita seguindo uma lógica de mercado e individualista.
Focou-se na ideia de que o diploma universitário serve basicamente para
fornecer mão-de-obra mais qualificada para o mercado e não na formação de
cidadãos pensantes. Estimulou-se o individualismo.
A lógica do ensino superior no
Brasil foi corrompida pela lógica do consumo e os governos compraram esta ideia.
A faculdade passou a ser um produto consumido, com celebridades fazendo
propagandas de cursos como se estivessem vendendo carros. Estas propagandas
sempre tentam expor como é mais fácil conseguir um emprego depois de terminar o
curso de administração de empresas com foco em marketing e novos negócios da
Universidade Tabajara. Melhor emprego é igual a mais consumo. Consuma nosso
curso para consumir mais no futuro, esta é lógica. Educação como investimento
monetário.
O Brasil é um país dividido em
castas. A faculdade, como tudo num país criado tendo como base a ideia de senhor-escravo,
é vista como um trunfo social. Nada é mais simbólico disso do que a prisão
especial para pessoas com diplomas. Isto não é um “incentivo” para o estudo e
sim uma forma que a elite encontrou de, na época em que só ela era capaz de
entrar no ensino superior, manter seus privilégios até quando pisasse na bola.
O período de explosão do número de vagas em universidades seguindo uma lógica
de mercado foi também um período de explosão na criação de cursos de MBA. A
elite, incapaz de manter sua posição usando apenas o diploma como argumento,
criou a necessidade de outro tipo de curso para gestores, extremamente caros, e
em que nada se aprende de fato. Basicamente gente bem-vestida comprando um
diferencial. Os empresários do setor educacional agradecem.
Assim, a expansão do ensino
superior feita seguindo a lógica de mercado estimulou a criação de uma geração
de formados individualista, que só vê propósito na educação como meio de
alcançar um melhor emprego, para assim consumir mais e fazer parte de uma casta
de privilegiados. O sonho de boa parte dos diplomados é fazer parte desta
casta. Não à toa, o termo utilizado para pessoas que fazem faculdade é “nível
superior”. A linguagem utilizada diz tudo. O objetivo deste texto não é dizer
que esta expansão foi toda ruim. É óbvio que há méritos gigantescos neste
processo. O grande problema, a meu ver, é a lógica que ela seguiu.
A recessão econômica a partir de
2015, fez com que um grande número de pessoas destas da qual o texto fala
perdessem o emprego ou desenvolvessem um grande medo de perdê-lo. Como a única
função do diploma universitário nesta lógica é a obtenção de um emprego que
pague mais e permita consumir mais, este diploma perdeu a função. É muito fácil
para este trabalhador diplomado sentir que ele perdeu tudo que conquistou. Ao
obter um diploma, esperava-se exclusivamente consumo e status social, coisas
que desapareceram com a crise.
Entre pessoas diplomadas,
portanto, encontram-se as características típicas de um eleitor de Bolsonaro.
Individualismo, medo, rancor, arrogância e ódio. A universidade da forma como é
vista hoje, em geral, nada faz para combater esta ideia. Se Paulo Freire criou
o termo “educação libertadora”, o Brasil, ao invés de investir no que pregava um
dos educadores mais premiados do mundo, criou a seu jeito uma “educação comercial”,
em que quanto mais a pessoa estuda, mais ela se torna consumista e com
pensamentos elitistas.
O Brasil paga o preço pelo
descaso histórico em relação aos cursos de ciências humanas. As pessoas, em
geral, não sabem o que foi o fascismo, por isso não se importam em serem
chamadas de fascista quando apoiam um candidato como Bolsonaro. Ele liderar
entre pessoas com diploma superior é grave. Ninguém estar disposto a falar
disso é tão grave quanto.
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