O desenvolvimento do esporte está
historicamente relacionado ao desenvolvimento da publicidade. O primeiro grande
boom do esporte como algo maior do que uma simples competição entre times ou
pessoas se deu nos anos 1930, quando estados totalitários europeus começaram a
utilizá-lo como instrumento de propaganda. Após a guerra, os vencedores
americanos e soviéticos continuariam fazendo dele instrumento da mesma forma
durante todo o século 20. O segundo boom do esporte viria nos anos 1950 e 1960,
com o surgimento e popularização da televisão. Este novo aparelho revolucionou
nosso estilo de vida e, principalmente, a publicidade. Esta encontrou na
televisão um instrumento gigantesco para chegar a um número inimaginável de
pessoas, criando novas necessidades de consumo. Para vender mais, seria
necessário criar figuras populares capazes de convencer consumidores de que
eram incríveis o suficiente para que desejássemos utilizar os mesmos produtos
que eles. Encontrou estas figuras principalmente no esporte e na arte pop. Não
à toa a música, por exemplo, passou por grandes transformações a partir deste
momento também.
A partir disso, não havia mais
espaço para amadorismo no esporte. O tênis, esporte tradicional por excelência,
foi o último a se adequar ao profissionalismo, em 1968. Nos anos 1970 e 1980,
com o desenvolvimento da publicidade infantil, a ligação entre esporte e
publicidade ganhou outros patamares. Foi mais ou menos a partir daí que entrou
em ação a grande parceira da publicidade, a mídia. Era fundamental que o atleta
fosse visto não apenas como alguém que era muito bom numa atividade banal e
inútil, mas num “gênio”. Michael Jordan não era apenas um cara muito bom em
acertar uma bola redonda dentro de um círculo, era um “gênio”. Ayrton Senna não
era apenas alguém muito bom em correr rápido de carro, era um “gênio”. Desta
forma, quando consumíamos algo que figuras como estas anunciavam não estávamos
comprando algo normal, mas sim o produto usado por um “gênio”. O desodorante do
“gênio”, a pasta de dente do “gênio”, a roupa do “gênio” etc. Mais do que isto,
ligue sua TV em sei lá qual horário e veja o “gênio” em ação.
Foi neste período também que
começou a surgir a mídia especializada. Gente que fazia faculdade e dedicava a
vida a basicamente falar sobre pessoas praticando esporte. Gente que passou a
se dedicar exclusivamente a analisar pessoas correndo atrás de uma bola, por
exemplo. Pessoas na mídia que ganham a vida falando banalidades sobre falsos
gênios, que no intervalo aparecem vendendo produtos que ajudam a pagar os salários
dos especialistas das banalidades.
A banalidade hoje rende bilhões.
Canais de TV, debates, gênios e principalmente publicidade. Temos gênios atrás
de gênios. Mais do que isto, popularizou-se a expressão “melhor da história”.
Messi, Cristiano Ronaldo, Roger Federer, Usain Bolt, Michael Phelps. Todos os “melhores
da história” enquanto continuam vendendo. Em 20 anos teremos outros no lugar. No intervalo de um acalorado debate
entre quem é o melhor da história, Messi ou Cristiano, apareceu uma propaganda
de Cristiano se barbeando e de Messi comendo salgadinho.
A situação é tão inusitada que
não há dúvidas de que os personagens tratados como gênios são incapazes hoje de
se enxergarem de forma diferente. Li uma vez uma entrevista de Roger Federer em
que ele dizia que se considerava um gênio. O suíço não se vê como alguém que é
simplesmente muito bom em uma atividade bocó de dar raquetadas em bolinhas
amarelas, ele realmente se acha um gênio. É o caso de Neymar.
Neymar é tratado como gênio desde
que tem doze anos de idade. Não tenho dúvidas de que ele acredita que é um.
Dificilmente ouve um não ou é convencido a fazer algo que não quer. A publicidade
aprendeu a rentabilizar tudo. Até os fracassos. A Nextell teve uma boa repercussão
ao trazer pessoas que tinham superado problemas pessoais. Por algum motivo
achou que dava para aliar isto a um celular. A Gilette tentou fazer isto com
Neymar também. Aparentemente não deu certo. O publicitário que teve a "brilhante" ideia de ligar a queda momentânea de Neymar ao ato de se barbear deve estar sofrendo.
As redes sociais estão
representando um novo boom no esporte. E mudando a forma como atletas “geniais”
e grande mídia se relacionam. A mídia tradicional está perdendo espaço para as
redes sociais. A publicidade precisa cada vez menos dela para usar o seu atleta
para vender. O “gênio” consegue ter um contato direto com os seus fãs sem
precisar passar pelo jornalista especialista ou pelos apresentadores de TV dos
programas de domingo. E a mídia tradicional está surtando por isso. O principal
motivo para a má vontade com Neymar por parte desta mídia, a meu ver, é esta.
Neymar não deu nenhuma entrevista
desde o fracasso na Copa. Falou apenas em suas redes sociais e na propaganda remunerada
da Gilette. Certa vez vi um jornalista na TV dizendo que Neymar “tinha” que se
declarar sobre a derrota para a Bélgica. Neymar não tem que nada. A declaração
de Neymar para a propaganda é falsa? Tudo é. Se ela fosse dada no programa do
Faustão ou no Luciano Huck, seria tão falsa quanto. E seria porque, não só ele,
mas o mundo gira hoje em dia basicamente em torno da publicidade, que não faz
nada diferente do que vender mentiras. Ações de filantropia, por exemplo, hoje
se dedicam mais a promover a figura do doador do que a ideia de caridade. Neymar
disse que ninguém sabe como é difícil esta no papel dele. Não duvido. Todos têm
problemas e dificuldades. O ser humano é um ser egoísta, sempre acreditamos que
nossos problemas são os piores, uma vez que são os únicos que sentimos na pele.
Acho Neymar uma pessoa completamente vazia. Opinião pessoal. Isto é fruto do
fato de que ele é tratado como gênio desde os doze anos por ser bom numa
atividade que por si só é inútil. Uma pessoa que se acostumou a não ter
opinião, porque isto pode atrapalhar as vendas. Mas a mídia precisa dele.
Bajulava-o antes da Copa e voltará a bajular quando precisar dele para vender
algo. Por enquanto está bravinha. Mas já já passa.