Adelio Bispo de Oliveira acredita
em Deus. Na primeira declaração após sua prisão ocorrida após o ataque que
marcará sua pobre existência, Adelio disse que foi Deus quem o ordenou a
esfaquear o candidato à presidência Jair Bolsonaro na cidade de Juiz de Fora. O
agressor saiu de Montes Claros, cidade em que mora, para realizar o ataque em
outro município, o que mostra que ele e “Deus” premeditaram por algum tempo o
ato que o tornaria de certa forma ilustre.
Jair Bolsonaro acredita em Deus.
Cita-O sempre que possível, sem nem precisar marcar na mão junto com Lula,
pesquisas e armas. Citou Deus, por exemplo, em seu célebre voto na sessão de
impeachment de Dilma Rousseff, poucos segundos depois de homenagear um
torturador que dizia ser “o terror” da vítima. Também O cita em todas as entrevistas,
logo depois de defender a prática de tortura, a generalização do porte de
armas, a agressões a homossexuais, a desvalorização da mulher etc. Alguns dias antes de ser esfaqueado, disse que estava na hora de "metralhar a petralhada", enquanto simulava uma metralhadora com um microfone. Brasil acima
de tudo (Brasilien über alles, a versão tupiniquim do Deutschland über alles de
Hitler) e Deus acima de todos são seus lemas.
A crença na existência de uma
entidade divina é quase uma necessidade humana. Eu pelo menos desconheço que
exista alguma civilização que em dado momento não tenha procurado explicações
no sobrenatural. Uma grande sacada foi o momento em que a figura divina foi
humanizada. “Deus nos fez a sua imagem e semelhança”. Ao equiparar o homem a
Deus, considerou-se o ser humano como o ser superior, aquele que possui os
mesmos dons do criador do universo. “Deus está sempre ao meu lado”, costumam
dizer aqueles que têm grande fé em sua existência. Se Deus está sempre ao meu
lado, estou sempre certo, é o que está por trás desta frase. Deus funciona como
um argumento de autoridade para tudo aquilo que é feito por quem acredita Nele,
independente disto ser algo moralmente bom ou ruim.
A humanidade tem diversos
exemplos históricos de atos bárbaros cometidos em nome de Deus. As Cruzadas,
feitas para devolver a Terra Santa ao Deus cristão. A Inquisição, não à toa
chamada de Santa, que queimava o corpo e purificava a alma dos pecadores. O
Holocausto, realizado por cristãos que queriam punir os herdeiros do povo que
responsabilizavam pela crucificação de Cristo. Os ataques terroristas de 11 de
setembro. Todas as guerras patrocinadas pelo governo americano. A grande sacada
da crença em Deus é esta justificação. Em nome de um Ser invisível, que mora
num universo paralelo e vê tudo que fazemos, vale tudo. Matar, torturar e dizer
que uma concorrente “merece ser estuprada”.
Janaina Paschoal acredita em
Deus. Sua imagem no Twitter é dela segurando uma imagem de santo. Citou Deus
várias vezes durante o processo de impeachment, do qual foi a advogada de
acusação. Silas Malafaia também acredita em Deus. Enriqueceu graças a ele. O
Senador Magno Malta também acredita em Deus. Fez sua carreira política graças a
ele. Os três têm em comum que, logo após o ataque, sem nenhum tipo de prova
material, acusaram o PT pelo ocorrido. Nenhum dos três pediu desculpas e
provavelmente nem pedirá uma vez que já está provado que Adelio é um
desequilibrado que agiu sozinho. Pelo contrário, o que farão será espalhar
notícias falsas. A verdade não é nada perto da “vontade de Deus”. A verdade não passa de um detalhe insignificante na "Guerra Santa" em que os três vivem. Isto não só
para pessoas do lado representado por estas três figuras, aliás. Até agora vejo
em minha timeline pessoas de "esquerda" espalhando notícias de que o atentado
teria sido uma farsa e que “não saiu sangue” depois da facada. A era das
teorias da conspiração.
Jair Bolsonaro creditou a Deus
sua recuperação. No lugar dele, eu seria mais grato aos médicos do SUS,
profissionais que trabalham em condições precárias e que salvam vidas
diariamente. Verdadeiros heróis. Não vi em nenhum lugar o nome deles sendo
citados por nenhum membro da sua crente família. O procedimento que salvou
Bolsonaro custo ao SUS R$ 347,00. As Santas Casas das cidades de interior estão quebradas, seria interessante aproveitar o momento para falar sobre o papel do poder público no socorro a elas. Mas isto não acontecerá. Também poderia agradecer ao fato de que temos
uma legislação que dificulta o acesso a armas de fogo para uma pessoa como
Adélio. Numa sociedade como a defendida por Bolsonaro, provavelmente Adélio
realizaria seu ataque com uma arma de fogo e provavelmente o “trabalho de Deus”
ficaria mais complicado para Bolsonaro e mais fácil para Adélio. Aparentemente o
candidato não concorda com esta visão. Sua primeira imagem no hospital após o
ataque foi fazendo o gesto de uma arma.
Andar por São Paulo tem sido uma
experiência extremamente assustadora neste período pré-eleitoral. Está muito
claro que Bolsonaro representa a simbolização de uma fascistização da
sociedade, de pessoas que acreditam basicamente na violência como instrumento
de solução para todos os problemas. Pessoas paranoicas que enxergam a expansão
da ignorância como fator “educacional” e que se sentem livres para espalhar
todo tipo de mentiras e preconceitos. Fazem-no sem a menor vergonha. Estão com
ódio nos olhos, “em nome de Deus”.
Os momentos que seguiram o ataque
contra Jair Bolsonaro foram de euforia no mercado financeiro. Acreditam os
investidores que a vitória do candidato fascista se tornou mais próxima agora
que ele poderá usar o discurso de vítima. Os urubus pressentem a morte e se aproximam
do moribundo enquanto ele convalesce. A democracia brasileira convalesce. “Em
nome de Deus”.
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