Aproximadamente doze horas se
passaram e as imagens de Di Ferrero imitando Kurt Cobain no último programa do
Faustão ainda não me saíram da mente. Nos últimos trinta anos, o apresentador
Fausto Silva proporcionou ao povo brasileiro momentos inesquecíveis de
entretenimento televisivo, mas poucos se comparam ao que aconteceu ontem. Numa
representação do clássico clipe de Smells
Like Teen Spirit, o cantor que embalou a classe média dos anos 2000
aproveitou com maestria a chance que o veterano apresentador dá a
subcelebridades decadentes dispostas a qualquer coisa para ter mais quinze minutos
de fama.
Poucas pessoas têm tanta
influência na sociedade brasileira desde o ano de 1989 quanto Fausto Silva. Se
houvesse alguma justiça na vida terrena, ele provavelmente seria eleito o
brasileiro do ano em todos os anos desde esta data. A empresa Lide, de João Doria
Jr., que organiza o prêmio de brasileiro do ano na cidade de Nova Iorque,
deveria aproveitar que a cidade americana se recusou a receber e premiar o
presidente brasileiro fascista e fazer justiça a Faustão. Resolver a injustiça
de 2017, por exemplo, ano em que a empresa de João Doria premiou João Doria
como brasileiro do ano, numa versão tupiniquim da autoproclamação que veríamos
dois anos mais tarde na Venezuela.
Faustão tem muitas qualidades,
mas a mais importante no momento é a capacidade de explorar o gigantesco
potencial de subcelebridades decadentes desesperadas em recuperar seu lugar ao
Sol. A fama e a riqueza são como a água do mar, quanto mais se bebe, mais sede
se tem, disse Schopenhauer. Nas últimas décadas, o apresentador global nada
mais fez do que provar na prática a sabedoria da frase do filósofo alemão.
Subcelebridades se revezam em quadros como “Dança dos Famosos”, “Circo dos
Famosos”, “Show dos Famosos” e o meu favorito “Patinação dos Famosos”. Não me
lembro se este último tinha este nome realmente ou se o nome era “Dança do gelo
dos famosos”. Bom, o importante é saber que neste quadro os famosos iam fazer todo
tipo de peripécia enquanto patinavam no gelo. Uma das participantes do quadro
era a atriz Suzana Vieira, apresentada por Faustão como a guerreira que ia
provar que não tinha limites ao topar o desafio de patinar dançando no gelo aos
setenta anos. Duas semanas depois, Suzana deixava a atração com uma costela
quebrada, fruto de um previsível acidente ocorrido durante os treinamentos.
A influência de Faustão na
realidade política brasileira é gigantesca. Poucas pessoas tiveram a
importância na generalização do uso de bordões vazios e frases sem real sentido
na política quanto o apresentador. Afinal, “urna não é penico, bicho”. São anos
falando obviedades como “temos que investir em saúde e educação” ou “temos que
votar direito” e depoimentos forjados de subcelebridades fajutas repetindo que “sim,
é isso mesmo Fausto, temos que investir em saúde e educação e aprender a votar
direito”. Junho de 2013 nada mais foi do que os bordões de Faustão indo às
ruas. Uma multidão de jovens com pouca ou nenhuma formação política indo às
ruas dizer que “urna não é penico”. O discurso de Faustão nada mais é do que o
cerne da política brasileira atual, seja no tipo de milícia fascista montada
pelo MBL ou na paixonete aguda que a parte mais light da esquerda começa a
sentir por Tábata Amaral. Seja você um jovem da direita histérica ou da esquerda
suave, toda pessoa com menos de 45 anos viva nesta país carrega dentro de si os
ensinamentos políticos de Faustão.
Há alguns anos, Faustão
surpreendeu o país com o lançamento do quadro Ding Dong. Trata-se de uma ideia
genial, um quadro musical em que o telespectador não sabe qual será a atração
musical. Um sucesso de audiência, com o qual Faustão conseguiu provar que a
atração musical não tem importância alguma no programa. As pessoas vão assistir
qualquer coisa que esteja passando naquele momento, seja Anita ou Moacyr
Franco. A TV de domingo nada mais é do que algo que fica ligado como um som ao
fundo, algo para escaparmos da solidão. Ninguém está interessado em saber com
antecedência o que vai passar. TV é quase um penico, bicho.
São inúmeras as contribuições de
Faustão para a sociedade brasileira. A churrasqueira pegando fogo, o lançamento
das Scheilas, os Los Hermanos se despedindo de Ana Júlia. Di Ferrero de Kurt
Cobain foi uma das cerejas no bolo neste ano em que celebramos trinta anos do
programa que mudou o país. Que João Doria faça justiça e premie Faustão.
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